O Itamaraty entregou neste domingo (26) ao governo indonésio nota em que classifica de "inaceitável" a possibilidade de que Rodrigo Muxfeldt Gularte, 42, seja executado na Indonésia e, ao mesmo tempo, apela para que o fuzilamento iminente do brasileiro seja cancelado e que ele seja internado em hospital psiquiátrico.
A nota afirma ainda que o governo da Indonésia se recusa a reconhecer, a despeito do "bom senso e de normas básicas de proteção aos direitos humanos", que Gularte é doente -dois laudos constataram que ele sofre de esquizofrenia paranoide. A Procuradoria-Geral, órgão responsável pelas execuções, fez uma terceira avaliação no brasileiro, mas o resultado jamais foi divulgado.
O documento foi entregue ao encarregado de negócios da Embaixada da Indonésia em Brasília e, nesta segunda-feira (27), uma cópia será levada ao Ministério das Relações Exteriores indonésio, em Jacarta (capital do país). Nele, o Brasil diz respeitar a soberania da Indonésia, mas sustenta que a pena de morte não é "eficaz para enfrentar o narcotráfico".
O Itamaraty informou à Indonésia ainda lamentar que a execução tenha sido anunciada antes de um pedido feito à Justiça local ter sido apreciado. A defesa de Gularte solicitou que ele ficasse sob guarda da prima, Angelita Muxfeldt, que está na Indonésia. Era o primeiro passo para solicitar à Justiça a internação do brasileiro.
Gularte foi preso no aeroporto de Jacarta em 2004 ao tentar entrar no país com seis quilos de cocaína escondidos em pranchas de surfe. Foi condenado no ano seguinte. Em janeiro de 2015, o presidente Joko Widodo rejeitou pedido de clemência para o brasileiro, o que o colocou na lista de próximos a serem executados. Cartas foram enviadas pelos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff em favor de Gularte, sem êxito.
OUTRO CASO
No dia 18 de janeiro, seis condenados, entre eles outro brasileiro, Marco Archer Cardoso Moreira, uma indonésia, um holandês, dois nigerianos e um vietnamita, foram executados por pelotões de fuzilamento integrados por 12 pessoas em duas penitenciárias do centro da ilha de Java.
LEIA ABAIXO A ÍNTEGRA DA NOTA:
NOTA-VERBAL S/N 26 de abril de 2015
O Ministério das Relações Exteriores cumprimenta a Embaixada da Indonésia e faz referência ao caso consular que envolve o nacional brasileiro Rodrigo MuxfeldtGularte, condenado à pena de morte pela Justiça Indonésia pelo crime de tráfico de drogas.
2. O Governo brasileiro recebeu, com profunda consternação, na data de ontem, 25 de abril de 2015, por meio de funcionário da Procuradoria-Geral da Indonésia em Cilacap, notificação formal do Governo indonésio de que o Senhor Gularte deverá ser executado nos próximos dias.
3. Como é do amplo conhecimento do Governo indonésio, o Senhor Gularte é portador de grave doença mental (esquizofrenia paranóide), comprovada por laudos realizados por médicos vinculados a instituições estatais nesse país, mas que infelizmente o Governo indonésio se nega a prover ou divulgar. Foge, assim, ao mais elementar bom senso e a normas básicas de proteção dos direitos humanos que o Governo indonésio queira seguir adiante com a execução. Nada será ganho na luta contra as drogas por ato claramente inumano à luz das próprias leis indonésias e do direito internacional.
4. O anúncio da iminente execução de Rodrigo Gularte ocorre no momento em que advogados da família haviam interposto ação com vistas a solicitar a tutela legal do Senhor Gularte em nome de sua prima. Esperava o Governo brasileiro uma resposta positiva ao referido pleito, que serviria de base legal para internação imediata do nacional brasileiro, com vistas ao seu tratamento e acompanhamento médico necessários.
5. Dessa forma e nas atuais circunstâncias, o Governo brasileiro considera, nos termos mais veementes, absolutamente inaceitável a possibilidade de execução do nacional brasileiro.
6. O Governo brasileiro não questiona a soberana decisão da Justiça da Indonésia de punir o nacional brasileiro pelo crime cometido, igualmente combatido com rigor no território brasileiro. É com base em preocupação de caráter humanitário que este Governo tem realizado gestões do mais alto nível com pedido de clemência em favor do Senhor Gularte. Além de não considerar a aplicação da pena de morte como medida eficaz para enfrentar o narcotráfico, posição compartilhada por diversos outros Estados, atua no pleno respeito ao direito básico à vida de todo e qualquer cidadão.
7. O Governo brasileiro, nesse contexto, reitera uma vez mais ao Governo indonésio sua oferta de cooperação no combate ao consumo e ao tráfico de drogas, para a adoção de medidas que efetivamente contribuam para a redução da ocorrência desse sério crime, que lamentavelmente produz vítimas diariamente no mundo inteiro.
8. À luz do exposto, e igualmente em nome de toda a família do Senhor Rodrigo Gularte, o Governo brasileiro formula novo apelo para que seja sustada a execução. Na mesma linha solicita seja revista a denegação do pedido de clemência em favor do nacional brasileiro, seja providenciada a sua pronta internação em hospital prisional e seja deferido o pedido de tutela encaminhado pela família do condenado.