O Vaticano iniciou neste sábado pela primeira vez um julgamento contra um religioso acusado de abusos sexuais contra menores de idade, o ex-núncio na República Dominicana, que não compareceu à audiência por ter sido hospitalizado, o que provocou o adiamento do processo.
O polonês Józef Wesolowski, de 66 anos, já foi condenado a perder o cargo e voltar ao estado laico, em um processo eclesiástico.
Wesolowski sofre há alguns meses de um problema de saúde, que não foi divulgado. A Santa Sé informou neste sábado que ele foi internado em um centro de terapia intensiva.
"O acusado sentiu-se indisposto de forma repentina e foi levado a um hospital de Roma", afirmou o promotor Gian Piero Milano no tribunal.
Wesolowski passou mal na sexta-feira e foi internado em caráter de emergência no Vaticano, antes de ser levado para um hospital romano, onde permanece sob vigilância policial.
A polícia prendeu o polonês em setembro de 2014 e depois foi condenado à prisão domiciliar. Em dezembro ele obteve o direito de maior liberdade de movimento dentro do Estado do Vaticano por motivos de saúde.
A audiência deste sábado durou apenas sete minutos, o tempo necessário para a leitura do promotor das acusações contra Wesolowski e a confirmação de sua internação.
O presidente do tribunal, Giuseppe Dalla Torre, informou que o julgamento será adiado para uma data ainda a ser determinada.
Wesolowski é acusado de ter mantido relações sexuais com menores de idade quando exercia o cargo de núncio na República Dominicana, entre janeiro de 2008 e agosto de 2013, e de posse de milhares de fotografias de conteúdo pedófilo.
Este último crime passou a integrar a legislação vaticana por iniciativa do papa Francisco em 2013.
As acusações de abusos sexuais são baseadas nos depoimentos ouvidos pelas autoridades competentes de Santo Domingo, segundo o Vaticano.
O juiz, o advogado de defesa e os promotores que participam no julgamento sem precedentes são todos laicos italianos.
Linha de combate à pedofilia
Se for considerado culpado, Wesolowski pode ser condenado a seis ou sete anos de prisão, sem considerar as possíveis circunstâncias agravantes.
O julgamento é inédito na história recente do Vaticano e ilustra a nova linha de combate ao flagelo da pedofilia, apesar das críticas de associações de vítimas, que consideram que a Igreja não faz o suficiente.
A Santa Sé anunciou em junho a criação de uma nova instância eclesiástica para punir os bispos culpados de negligência - ou inclusive de cumplicidade - com os padres sob sua autoridade. Vários bispos acusados de proteger padres pedófilos foram obrigados a abandonar a batina.
Uma comissão internacional auxilia o pontífice na tentativa de encontrar uma forma de prevenir os abusos contra menores de idade.
Józef Wesolowski foi ordenado padre em 1972 pelo então arcebispo de Cracóvia, o futuro papa João Paulo II, que o promoveu a bispo em 2000.
Depois de trabalhar como núncio na Bolívia e em vários países asiáticos, ele chegou à República Dominicana em 2008. Cinco anos depois foi acusado pela imprensa local de manter relações sexuais com menores.
O Vaticano o convocou em agosto de 2013, o afastou de suas funções e se negou a extraditá-lo para a Polônia.
Em março, outro padre polonês, Wojciech G., foi condenado a sete anos de prisão em Varsóvia por atos de pedofilia cometidos na República Dominicana e na Polônia.
O Vaticano já abrigou um julgamento famoso em 2012, o do ex-mordomo do Papa Bento XVI, Paolo Gabriele, condenado por vazar à imprensa italiana documentos confidenciais, mas posteriormente perdoado.