Desde o início de abril, a Venezuela passa por uma onda de manifestações contra o presidente socialista Nicolás Maduro, nas quais foram registrados atos violentos que resultaram na morte de quase 30 pessoas em um intervalo de três semanas.
Em 29 de março, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), próximo ao poder, retirou a foro privilegiado dos deputados do Parlamento, o que os deixou expostos a possíveis penalizações. Essa decisão representou uma sanção contra o poder legislativo, o único controlado desde o final de 2015 pela oposição antichavista, assim nomeada por causa do presidente falecido Hugo Chávez, que governou o país de 1999 a 2013.
O Supremo Tribunal reforçou os poderes do chefe de Estado, que poderia intervir utilizando todas as medidas necessárias, sob a justificativa de assegurar a "estabilidade democrática". No dia seguinte, o STJ decidiu assumir as prerrogativas do Parlamento, permitindo assim ao regime presidencial venezuelano a concentração de todos os poderes: executivo, militar, judiciário e legislativo.
A decisão foi qualificada pela oposição como sendo "golpe de Estado", e culminou em tamanha indignação diplomática que o tribunal recuou em sua resolução após 48 horas da deliberação.
A oposição se fixou em um objetivo principal: conseguir a saída de Nicolás Maduro do poder antes do final do seu mandato, em dezembro de 2018.
A oposição solicitou eleições gerais antecipadas por não ter conseguido realizar um referendo revogatório como era esperado inicialmente.
A oposição aguarda um novo êxito eleitoral, como ocorrido nas últimas eleições legislativas, sob pretexto do descontentamento atual da população em relação à política na Venezuela, um país de economia petrolífera que entrou em profunda crise econômica após a queda na cotação do produto.
De acordo com pesquisas do Venebarometro, sete em cada dez venezuelanos querem a saída do presidente em exercício.
Quase todas as manifestações resultaram em confrontos, roubos, chuva de gás lacrimogêneo e coquetéis Molotov, envolvendo os manifestantes e as forças de ordem. Durante os confrontos, a violência exercida por mílícias armadas pelo governo chamou atenção, como indica a oposição.
O prefeito do município de Chacao, Ramón Muchacho, denunciou no Twitter que um manifestante de 20 anos deu entrada "sem sinais vitais" em um centro médico da localidade e pediu "uma investigação que esclareça os fatos". O óbito, o 28º provocado pela violência vinculada aos protestos celebrados desde o início do mês, foi confirmado à AFP por uma fonte do Ministério Público.
"Essas ações de resistência em relação ao ditador (Maduro) têm um custo muito elevado: mortos e prisioneiros", declarou o vice-presidente parlamentar Freddy Guevara, cujo partido Voluntad Popular tem seu líder encarcerado desde 2014, Leopoldo López.
Maduro convidou a oposição a retomar o diálogo que estava congelado desde de dezembro, chamando o papa Francisco para "acompanhar" essa discussão, mesmo após o fracasso da mediação do ano passado, sob auspício da Santa Sé. Para os analistas da consultoria Eurasia, "a oposição está mais unida em torno da estratégia de ir às ruas e mostra-se revigorada".
"As divisões existentes no chavismo provavelmente se aprofundaram, sobretudo perante as eleições regionais e presidenciais. As pressões vindas das ruas e da comunidade internacional têm o potencial de aumentar suas fissuras", ressalta a consultoria. "Há uma pressão muito grande da comunidade internacional para que haja uma negociação política entre a oposição e o governo, porém não acho possível que ocorram eleições gerais", argumenta o analista Carlos Raúl Hernández.
A curto prazo, os especialistas apostam em um pronunciamento do executivo, em sinal de reconciliação, além da divulgação de uma data para as eleições regionais - que deveriam ter acontecido em dezembro e foram adiadas sem prazo final - e as eleições municipais previstas para esse ano.