Nicarágua faz greve geral para pressionar governo Ortega

Manifestações populares já deixaram 161 mortos em quase dois meses de protesto na Nicarágua
AFP
Publicado em 14/06/2018 às 19:33
Manifestações populares já deixaram 161 mortos em quase dois meses de protesto na Nicarágua Foto: Foto: Inti OCON / AFP


A Nicarágua observou nesta quinta-feira (14) uma greve geral convocada pela oposição para pressionar Daniel Ortega a cessar a repressão contra as manifestações populares que se intensificou nas últimas semanas e já deixou 161 mortos em quase dois meses de protestos.

Durante o dia, três pessoas morreram em ataques armados de paramilitares e aliados do governo contra barricadas de manifestantes em Nagarote (noroeste), Tipitapa (Manágua) e Masatepe (sul), informou o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh).

A paralisação foi quase total em Manágua e nos departamentos de Masaya, Granada (sul), Matagalpa, Estelí, Nueva Segovia (norte) e León (noroeste).

A greve de 24 horas foi convocada pela opositora Aliança Nacional pela Justiça e Democracia, que agrupa empresários, estudantes e setores da sociedade civil, como forma de pressionar o governo para interromper os ataques violentos contra manifestantes e a população, realizados por forças antichoque e "turbas" pró-governo. 

A Nicarágua vive um clima permanente de protestos, que deixou suas principais vias e cidades semiparalisadas, desde os protestos de rua iniciados em 18 de abril contra uma fracassada reforma previdenciária.

Contudo, os protestos se estenderam como mostra de insatisfação com o governo de Ortega, que desde 2007 governa com sua esposa Rosario Murillo como vice-presidente e braço direito, acusado de autoritarismo e de controlar os poderes do Estado. 

Supermercados, lojas, postos de gasolina e pequenas vendas em Manágua também não abriram suas portas, enquanto nos colégios públicos os professores ficaram esperando os alunos. 

"Está tudo deserto, a população está apoiando a greve", disse o taxista Pablo Ramírez, que desistiu de trabalhar por falta de passageiros. 

O mercado popular oriental de Manágua, com mais de 20 mil negócios e 2 mil vendedores ambulantes, que começam a trabalhar ainda de madrugada, estava abandonado, cercado por barricadas para tentar proteger eventuais roubos e saques. 

"O mercado está apoiando a paralisação, a esta hora muitas lojas estariam abertas, mas como se vê está totalmente fechado", disse à AFP Liliam Gámez, funcionária de loja turca que foi trabalhar a pedido de seu patrão. 

"A paralisação é para pressionar o governo a se sentar e dialogar para dar uma solução a essa crise", disse à AFP Heriberto Ruiz, vendedor de doces do mercado. 

"Que Ortega saia pela porta da frente, e não pela dos fundos", afirmou Ruiz, que acredita que a Nicarágua se tornou uma "terra de ninguém" com a violência e os roubos. 

 Tiroteios e mortes

A paralisação foi precedida por novos ataques na capital e na Universidade Autônoma da Nicarágua (Unan), uma trincheira dos estudantes que protestam contra o governo, de acordo com a oposição. 

Também houve confrontos nas cidades de Jinotepe, Diriamba, León, Nagarote e Masatepe.

Nesta última, no estado de Masaya, ataques de grupos paramilitares "deixaram quatro mortos e diversos feridos", disse à AFP o secretário-geral da Associação Nicaraguense Pró-Direitos Humanos (ANPDH), Alvaro Leiva.

Já em Masaya, três motos com paramilitares armados entraram na cidade e "dispararam sobre as trincheiras", deixando um baleado, indicou. 

A polícia deste antigo bastião oficialista continua sitiada com barricadas defendidas por jovens com pedras e morteiros caseiros. 

Golpe econômico

A paralisação ameaça agravar a crise gerada por protestos e bloqueios.

"A economia produz 35 milhões de dólares diários, pode ser que nem tudo se paralise porque há atividades que não podem ser interrompidas", explicou Mario Arana, diretor da Associação de Produtores e Exportadores da Nicarágua (Apen). Assim, ele estima que o país deixe de produzir entre 25 e 35 milhões de dólares em um dia de paralisação. 

O setor privado, outrora aliado de Ortega, rompeu a aliança em meio aos violentos protestos. 

Desde o início da onda de protestos, em 18 de abril, o balanço de vítimas é de 157 mortos e mais de 1.300 feridos, segundo o Centro Nicaraguense de Direitos Humanos (Cenidh).

Até a Igreja católica, mediadora no diálogo entre o governo e a oposição, acolheu a convocação de paralisação.

Com a crise sociopolítica, estimativas não oficiais esperam uma queda de 1% do PIB, que, em termos de valor, chega a 800 milhões de dólares.

A Conferência Espiscopal da Nicarágua (CEN) convocou nesta sexta-feira uma sessão de mesa plenária do diálogo para revelar a resposta de Ortega a sua proposta de democratização. 

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