Sem acordo sobre o texto, a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que altera o sistema eleitoral brasileiro para o chamado distritão nas eleições de 2018 e que cria um fundo eleitoral com recursos públicos para bancar as campanhas deve ser novamente adiada na Câmara. Segundo o relator da proposta, deputado Vicente Cândido (PT-SP), não há consenso entre partidos, tanto da base quanto da oposição, principalmente sobre a mudança no sistema eleitoral.
Desde cedo o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), reúne-se com deputados da base aliada e da oposição para discutir a PEC. "Não tem consenso e corre o risco de não votar nada", disse à reportagem o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), um dos presentes em almoço com Maia na residência oficial. Segundo ele, o presidente da Casa marcou duas reuniões na tarde desta terça-feira com a base aliada e com a oposição para tentar chegar a um acordo.
Sem consenso sobre a PEC do distritão, Silva disse que Maia pediu que a Casa avance na discussão da PEC do Senado que trata do fim das coligações e que cria uma cláusula de barreira. A votação do parecer sobre a PEC em uma comissão especial da Câmara está marcada para logo mais, às 16 horas desta terça-feira (22). Segundo o deputado do PCdoB, caso o relatório seja aprovado no colegiado até às 19 horas, Maia prometeu colocar a proposta para votar no plenário ainda nesta terça (22).
A votação da PEC relatada por Cândido estava marcada para a última quarta-feira (16), mas não ocorreu por falta de acordo. Naquele dia, o presidente da Câmara remarcou a análise da proposta no plenário para esta terça-feira, o que não deve ocorrer novamente. A base e a oposição não chegam a um consenso sobre a adoção em 2018 do distritão, sistema pelo qual são eleitos os deputados mais votados em cada Estado, sem levar em consideração os votos da legenda.
Sem acordo, o líder do DEM na Câmara, deputado Efraim Filho (PB), apresentou a proposta de um distritão misto em 2018. Por esse sistema, o eleitor poderá votar tanto no candidato quanto apenas no partido. Os votos da legenda serão distribuídos proporcionalmente entre todos os deputados, de acordo com os números de votos nominais que receberam no pleito. Porém, também não há consenso sobre esse modelo.
Enquanto a PEC 77/03 tramita no plenário, duas comissões especiais da Câmara analisam um anteprojeto de lei (PL) e outra emenda constitucional que também compõem a proposta de reforma política.
O PL inclui algumas normas que vão regulamentar a forma como os recursos do fundo de financiamento serão distribuídos entre os partidos e regras para as doações de pessoas físicas, definição que deve ficar a cargo do Tribunal Superior Eleitoral.
O objetivo é mesclar a possibilidade de financiamento público e privado, mas com limites para as doações. No PL, está estabelecido o teto de 10% da renda bruta do doador ou dez salários mínimos, o que for menor, para doação em dinheiro a cada cargo em disputa.
O projeto inclui o Fundo Especial de Financiamento da Democracia, a ser criado caso a PEC 77 passe no plenário, entre as formas de contribuição financeira com recursos públicos aos partidos. O projeto prevê, por enquanto, que 90% dos R$ 3,6 bilhões previstos inicialmente para compor o fundo, sejam destinados às campanhas de vereadores, deputados estaduais, federais e distritais, senadores, primeiro turno de governadores e presidente da República, e 10% para segundo turno dos cargos do Executivo.
O percentual a que cada partido terá direito e a forma de distribuição serão definidos pelo TSE. Cada cargo eletivo terá limites de gastos de campanha. Os recursos também poderão ser levantados pelo Fundo Partidário, por recursos próprios do candidato (até o limite de R$ 10 mil) ou por meio de financiamento coletivo na internet.
O projeto em análise estabelece também que os partidos políticos sejam incluídos entre as instituições públicas ou filantrópicas autorizadas a organizar a distribuição de prêmios por meio de “sorteios, vale-brinde, concursos, bingos ou operações assemelhadas”, como loterias, para “obter recursos adicionais necessários ao custeio das finalidades partidárias e eleitorais”.
Na versão entregue no semestre passado, o relator da proposta, deputado Vicente Cândido (PT-SP), havia previsto que o doador poderia pedir que sua identidade fosse mantida em sigilo. Depois que o parecer foi divulgado, as reações levaram o relator a incluir a ressalva de que o sigilo não valeria diante de órgãos de controle. A alteração não foi suficiente para conter as críticas, e o deputado anunciou que vai retirar esse artigo do projeto. Outras alterações nas regras do financiamento ainda serão feitas no anteprojeto, dependendo do resultado da votação da PEC 77 no plenário.
No PL também consta a proposta de criação da habilitação prévia das candidaturas. A ideia é antecipar para oito meses o processo de registro dos candidatos a fim de dar mais tempo para a Justiça Eleitoral julgar todas as candidaturas antes da data do pleito. Nesse período de “pré-registro”, o candidato pode também fazer arrecadação prévia de recursos.
O projeto prevê a possibilidade de propaganda eleitoral na internet e por telemarketing, com regras específicas para cada situação. Os partidos e coligações estão sujeitos a sanções caso promovam propaganda eleitoral irregular.
O relatório permite que os partidos e coligações tenham um fiscal em todos os lugares onde ocorre o processo de votação e apuração dos votos, para acompanhar a totalização dos resultados.
Nessa comissão, já foram aprovados dois relatórios parciais que estão aguardando a análise final do projeto para seguir em bloco ao plenário. O primeiro relatório propõe a regulamentação e ampliação dos mecanismos de democracia direta, como referendos, plebiscitos e a apresentação de projetos de iniciativa popular. O segundo uniformiza em quatro meses os prazos de desincompatibilização ou afastamento de candidatos de diferentes cargos ou funções públicas.
O conjunto de propostas também deve ir a plenário após a conclusão da votação da PEC 77/03.
A segunda comissão que se reúne hoje na Câmara analisa a PEC 282/2016, que propõe o fim das coligações partidárias para eleições proporcionais, estabelece normas sobre fidelidade partidária e acesso dos partidos políticos aos recursos do Fundo Partidário.
A proposta tem como relatora a deputada Sheridan (PSDB-RR), que prevê, em seu substitutivo, a formação da federação de partidos que tenham o mesmo programa ideológico no lugar das coligações partidárias que vigoram atualmente nas eleições proporcionais.
O substitutivo estabelece que não há obrigatoriedade de vinculação entre as candidaturas em âmbito nacional, estadual, distrital ou municipal. Outro ponto que Sheridan incorporou na proposta foi a perda do mandato em caso de desfiliação partidária, inclusive para suplentes e detentores dos cargos de vice-presidente, vice-governador ou vice-prefeito.
De acordo com o substitutivo elaborado pela deputada, a partir de 2030 somente os partidos que obtiverem no mínimo 3% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos um terço dos estados, terão direito aos recursos do Fundo Partidário. Para ter acesso ao benefício, os partidos também deverão ter elegido pelo menos 18 deputados distribuídos em pelo menos um terço dos estados.
O mesmo critério será adotado para definir o acesso dos partidos à propaganda eleitoral gratuita no rádio e na televisão. A mudança, no entanto, será gradual, começando pelo piso de 1,5% dos votos válidos nas eleições de 2018, chegando a 2% em 2022, a 2,5% em 2026, até alcançar o índice permanente de 3% em 2030.
A expectativa é de que as duas comissões encerrem as discussões e comecem o processo de votação de seus projetos ainda nesta semana. Para que as mudanças sejam válidas para as eleições do ano que vem, elas devem ser aprovadas em dois turnos pelos plenários da Câmara e do Senado até 7 de outubro.