Ativista socorre cavalos abandonados nas ruas do Recife

Goretti Queiroz criou uma rede de solidariedade para recolher os equinos e achar padrinhos dispostos a adotar os bichos
Cleide Alves
Publicado em 15/11/2015 às 9:05
Goretti Queiroz criou uma rede de solidariedade para recolher os equinos e achar padrinhos dispostos a adotar os bichos Foto: Foto: Ashley Melo/JC Imagem


Juju, Chica e Netti foram encontradas perambulando pelas ruas do Recife. Magras, maltratadas e com o corpo ferido, precisavam de ajuda. O problema é que elas são graúdas. Mesmo nessas condições pesam uns 200 quilos. E, vamos combinar, o socorro não é fácil. Éguas não cabem dentro de caixas de papelão, nem em carro de passeio, como gatos e cachorros recolhidos em beira de estrada.

O resgate de um cavalo exige força (se o animal não consegue ficar de pé), veículo apropriado, espaço físico para acomodar o bicho e a boa vontade de alguém que corra atrás disso tudo. No Recife, quem pegou as rédeas dessa causa foi a jornalista Goretti Queiroz. Ela faz o resgate, mobiliza veterinários e amigos para oferecer os primeiros socorros e arruma gente para adotar os equinos.

Tão complicado quanto o transporte é achar um padrinho. “Cavalo precisa de espaço, é diferente de gato, que pode ser criado em apartamento”, comenta Goretti, defensora da causa animal desde 2009. Com a ajuda da ativista, Chica e Netti conseguiram um lar para chamar de seu. Juju, ainda em tratamento, está abrigada provisoriamente numa granja.

Das ruas da Bomba do Hemetério, na Zona Norte do Recife, Netti migrou para um sítio em Aldeia, no município de Camaragibe. Antes, passou uma temporada no Hospital Veterinário da Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), em Dois Irmãos, para se livrar das mazelas. O novo endereço da égua é o quintal de Cau Suassuna, veterinária que não exerce a função, mas preserva a paixão pelos bichos.

“Fico triste com a situação desses animais, sofrendo tantos maus tratos. Quando Goretti publicou a foto de Netti no Facebook, pensei: tenho muito espaço, posso pegá-la”, diz Cau. Curada de uma ferida no dorso, a égua engordou, toma banho todos os dias e tem capim a perder de vista para se alimentar. “Pratico com ela o que aprendi na faculdade. O que não sei, recorro a veterinários que moram por perto. Agora, Netti está livre do chicote”, declara.

O autônomo Renato Nascimento não tem um quintal tão grande quanto o de Cau. Mas não pensou duas vezes quando viu Chica fatigada e largada no bairro de Boa Viagem, na Zona Sul. “A égua passou um fim de semana circulando solta, fui acionada por uma protetora e a adoção aconteceu de forma imediata”, conta Goretti. “Deu pena ver o animal naquela situação”, diz Renato.

Movido pela compaixão, ele botou Chica no jardim de casa, no Curado V, em Jaboatão dos Guararapes. “Só peguei para cuidar. Estou fazendo uma casinha para Chica, no quintal, e comida não falta”, diz Renato, vendedor de frutas e verduras em Boa Viagem. “Não desperdiço mais nada, ela come frutas e verduras, além de capim, milho e ração.”

Renato, que já tinha gatos, cachorros e galinhas, não esconde a satisfação quando fala da nova hóspede. “Ela está comigo há menos de um mês e relincha quando me vê chegando com água e comida, já me reconhece”, diz. Amigos do comerciante, criadores de cavalos, avisaram que Chica está prenhe. “Mais um que vai chegar.”

Na verdade, ele pretendia aumentar a bicharada, adotando outra égua abandonada e resgatada por Goretti. “Não deu tempo, Maria Clara morreu antes.” O mesmo destino de Branco, Luara e Boy. “Todos morreram logo depois de serem recolhidos. Muitos desabam nas ruas de exaustão. Esses cavalos são chicoteados, têm feridas no pescoço e trabalham muito. Pegamos um que pesava 150 quilos e puxava 300 quilos de cimento numa carroça”, comenta Goretti.

Enquanto vai socorrendo os bichos, ela sonha com a regulamentação da Lei Municipal nº 17.918/2013, que proíbe carroças puxadas por animais no Recife. E espera não mais acompanhar o sofrimento de um cavalo, como Boy, que teve de ser sacrificado por causa de uma fratura nas costas.

Aos poucos, ela vem tecendo uma rede de solidariedade, que reúne veterinários, proprietários de sítios e pessoas sensíveis à causa. Um doa vacina e medicamentos, outro trata dos bichos sem cobrar nada, um compra feno, outro fornece ração e quem pode abre as porteiras para receber o cavalo. O Centro de Vigilância Animal da Prefeitura do Recife empresta o caminhão-boiadeiro para o transporte dos animais até o Hospital Veterinário da UFRPE.

E por falar em comida, cavalos não fazem cerimônia. São 20 quilos de capim e até seis quilos de ração por dia para alimentar um só animal, diz a veterinária Fernanda Caju, uma das voluntárias. Saudáveis, pesam de 350 a 450 quilos.

“Ninguém olhava para os cavalos soltos nas ruas, nem o poder público, nem entidades privadas. É muito fácil levar gato e cachorro, mas animal de grande porte também merece nossa atenção”, observa Goretti, ao explicar como se tornou uma cuidadora de cavalos, a partir de 2015.

Se você quer fazer parte dessa rede, pode entrar em contato com a ativista pelo e-mail dogmidia@terra.com.br.

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