Enquanto rede privada quer reabrir escolas, representantes de escolas públicas discordam com receio da covid-19

Decreto que proíbe aulas presenciais em Pernambuco, por causa da covid-19, expira na próxima terça-feira (15). Na véspera, dia 14, governo estadual vai se posicionar sobre o assunto
Margarida Azevedo
Publicado em 12/09/2020 às 0:03
Muitas escolas não têm estrutura adequada para cumprir protocolo, diz presidente da Undime PE Foto: DAY SANTOS / TV JORNAL


Enquanto na rede privada, em Pernambuco, a defesa é pela reabertura das escolas, mesmo com retorno de forma gradual e turmas reduzidas, entre representantes da rede pública a volta das aulas presenciais é vista com mais cautela. Um dos argumentos do setor público é a falta de estrutura adequada nos colégios, principalmente os da rede municipal. O Estado tem cerca de 2,1 milhões de estudantes no ensino básico. Mais da metade, 1,1 milhão, está matriculada em estabelecimentos municipais. Outros 575 mil na rede estadual e 400 mil nas escolas particulares.

Decreto que proíbe aulas presenciais, por causa da pandemia de covid-19, foi editado pela primeira vez quase seis meses atrás, em 18 de março. Expira na próxima terça-feira (15). Na véspera, o governo estadual promete informar se autoriza ou não a reabertura das escolas. Para o presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) em Pernambuco e secretário de Educação de Belém de Maria (Sertão do Estado), Natanael Silva, o momento não é de voltar com o ensino presencial.

"Em períodos normais muitas redes não têm condições adequadas de infraestrutura e transporte dos alunos. Imagine nesse momento de pandemia", ressalta Natanael. "O retorno é uma incógnita. São muitos aspectos que devem ser considerados. A transmissão do vírus ainda não foi controlada. A falta de testagem em massa é outro complicador, assim como a grande quantidade de profissionais da educação com comorbidades", observa o presidente da Undime.

Outra preocupação é justamente a preparação das redes para receber os alunos, caso seja autorizado pelo Estado. "Há uma queda escalonada do Fundeb, a cada mês, por causa da diminuição das receitas. As prefeituras estão com imensas dificuldades de cumprir as folhas de pagamento. Pequenos municípios dificilmente terão condições financeiras para adequar as escolas às exigências do protocolo", afirma Natanael.

ELEIÇÃO

"Não consigo vislumbrar mais datas de retorno presencial. Havia algumas propostas e que não se concretizaram. Pesquisas realizadas pelos municípios nas suas redes mostram que entre 70% e 80% das famílias discordam do retorno presencial. E com esse cenário político, eleições se aproximando, a maioria dos prefeitos não vai querer ir de encontro a esse posicionamento dos pais", destaca.

"Tenho dialogado bastante com Tribunal de Contas, Ministério Público, Amupe e cada vez mais me convenço que dificilmente será possível, com segurança, ter aula presenciais nas escolas este ano. Por isso a importância de discutir o fortalecimento do ensino remoto, para que as aulas à distância cheguem com mais qualidade e ao maior número de alunos", diz o secretário de Belém de Maria.

Em carta aberta à população, 11 sindicatos de professores de cidades pernambucanas e a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) defendem que nenhuma medida de retorno às aulas seja tomada sem que haja controle da pandemia.

"Pernambuco adota medidas de reabertura do comércio, que preocupam, pois é imenso o risco de retomada no crescimento da curva de contágios e óbitos. As redes de ensino estudam medidas preparatórias para a reabertura de escolas e demais locais de trabalho. Muito se fala em protocolos de segurança, difíceis de serem efetivados por conta da precariedade estrutural das nossas unidades públicas", afirmam.

DIREITO

Professora do Centro de Educação da Universidade Federal de Pernambuco e coordenadora do Fórum Estadual de Educação, Márcia Ângela Aguiar também não acha que as aulas devem voltar agora. "Para responder a essa pergunta precisamos atentar para os preceitos constitucionais que garantem à vida e uma existência digna", respondeu, ao ser questionada se esse era o momento de reabrir as escolas.

"O direito à vida é inviolável, trata-se de uma cláusula pétrea. Cabe ao Estado resguardar a vida humana. A educação é também um direito fundamental para o desenvolvimento humano. Em tempos de calamidade pública como a que estamos vivendo é preciso considerar esses direitos. Para garantir o direito à educação no ambiente das escolas é necessário que as garantias à vida da comunidade escolar sejam efetivadas pelos poderes públicos", observa Márcia.

"Daí, o meu entendimento que o retorno às aulas presenciais só deve ocorrer com o aval das autoridades sanitárias e de saúde quanto ao controle da transmissão do coronavírus", complementa.

PESQUISA

Pesquisa divulgada esta semana pela Undime nacional mostra que 3.769 cidades brasileiras ainda não têm data para retornar ao ensino presencial. Essas redes somam 13,3 milhões de alunos. O levantamento, realizado pela entidade com apoio da Fundação Itaú Social e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), envolveu 4.272 prefeituras, que representam 77% do total de municípios e corresponde a 79% do total de matrículas das redes municipais do País. Sobre a preparação para voltar ao ensino presencial, apenas 40% afirmaram que já iniciaram ou concluíram seus protocolos de retorno.

O estudo mostrou ainda que 96% das cidades estão oferecendo atividades pedagógicas não presenciais aos estudantes durante o período de pandemia. Entre as redes que adotaram o ensino remoto, 95% fazem a distribuição de materiais impressos e 80% optaram pela distribuição de aulas gravadas como parte das estratégias. Associado a isso estão também plataformas educacionais, videoaulas online ao vivo e TV educativa. A pesquisa foi realizada entre 7 e 18 de agosto por meio de questionário online.

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