Greve dos caminhoneiros: com equipamento velho, motorista corre o risco perder mercado que ainda ocupa
A questão do futuro está ligada à modernização. O setor mudou, deixou de ser transporte e agora é logística. Um cadeia integrada na qual o caminhão é uma parte pequena
No Registro Nacional de Transportadores Rodoviários de Cargas (RNTRC), controlado pela ANTT, existem hoje cerca de 1,7 milhão de caminhoneiros. O número está diminuindo a cada ano com a saída dos profissionais mais velhos que não aguentam o tranco de rodar no Brasil.
Mas o movimento agregador do setor é extremamente dividido. A Associação Brasileira dos Caminhoneiros (ABCAM), composta por 54 entidades filiadas, incluindo Sindicatos, Associações e Cooperativas, representa aproximadamente, 600 mil caminhoneiros autônomos em todo o País.
Existe ainda a Associação Brasileira dos Condutores de Veículos Autônomos (Abrava) e a Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA). As duas últimas apoiadoras da greve que fracassou.
O problema é que o espaço do caminhoneiro autônomo está se reduzindo. E as causas vão além das brigas internas e ligações políticas de cada uma delas. Está no futuro do negócio e na competitividade.
A questão do futuro está ligada à modernização. O setor mudou, deixou de ser transporte e agora é logística. Um cadeia integrada na qual o caminhão é uma parte pequena.
Competitividade tem a ver com tecnologia e equipamento. Os autônomos não conseguiram entrar no programa de financiamento do governo com taxa de juros baixa porque não tinham como pagar as prestações. A maioria nem se habilitou. Porque não tem frete.
Sem frete, não tem como comprar caminhão novo. E sem caminhão novo, o custo do diesel vai lá para cima. O Governo está enganando os dirigentes e caminhoneiros dizendo que pode tabelar ou estipular prazo para aumento de óleo diesel.
Não pode e nem vai. Assim como não pode isentar caminhoneiro de pedágio. Ora, pedágio é concessão para empresa privada. Não existe isso de isenção em rodovia pedagiada.
Mas então qual o espaço do mercado de autônomos?
Existem alguns nichos. Por exemplo, transporte de água, gás de cozinha e produtos agrícolas. Também pequenos transportes como agregado de terceiros com grandes contratos. Tem ainda os trechos de containers entre portos e clientes finais. Existe uma série de nichos pequenos.
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Mas à medida que o negócio exige logística, o caminhoneiro autônomo vai perdendo frete e espaço.
Para completar, venderam a ideia da tabela de frete. Foi um tiro no pé. A tabela não existe de fato.
Muita empresa grande migrou para o navio. Na média, houve crescimento de 17,5% no volume transportado por cabotagem em todo o país desde o fim da paralisação até fevereiro deste ano, segundo levantamento do Ilos (Instituto de Logística e Supply Chain).
Outros segmentos
O caso do agronegócio é bem interessante. Sempre falta caminhão para transportar milho e soja. Mas como o negócio ficou bom, o fazendeiro decidiu comprar seu caminhão. Hoje existem centenas de empresas transportadoras ligadas as fazendas. Foi mais uma parte do negócio que despareceu do autônomo.
Outro segmento que comprou caminhão foi da rede de postos de combustíveis. Caminhão-tanque é frete de uma via única. Só serve para uma finalidade. Então, as redes de postos começaram a comprar caminhão para abastecer os seus postos.
Um bom gerenciamento permite que os postos de uma rede sejam abastecidos por dois ou três caminhões. E como tem financiamento, o caminhão novo se paga.
O problema dos autônomos é que a frota que pilotam ficou velha e custa caro para rodar. Vira um ciclo ruim.
Tecnologia
E para completar, tem a questão da automação. Os novos caminhões têm uma tecnologia embarcada que o caminhoneiro semianalfabeto não domina. A profissão de caminhoneiro é uma das mais ameaçadas pela evolução da automação.
De acordo com um estudo do laboratório do Futuro, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) , 27 milhões de trabalhadores podem ter suas tarefas assumidas por robôs ou sistemas de inteligência artificial até 2040.
No Brasil, sete caminhões Volvo VM autônomos operam na colheita de cana de açúcar, reduzindo perdas por pisoteio de mudas graças a precisão de direção. No entanto, por esses caminhões estarem no nível dois de automação, ainda é necessária a intervenção do motorista para colocar o caminhão no modo autônomo.
A Mercedes-Benz já está desenvolvendo caminhões com nível quatro de automação, em que o motorista controla o veículo à distância, por controle remoto. Nesse nível é possível atender demandas de mineração e de áreas de risco no transporte.
Então não é só o caminhoneiro autônomo que está perdendo trabalho; o próprio motorista de caminhão pode perder o seu emprego no futuro.