Certamente, a maioria dos atuais técnicos e engenheiros da Prefeitura do Recife já nem se lembra. Mas a Rua da Palma, cuja restauração foi entregue na semana passada, já teve, na década de 70 e 80, juntamente com as ruas da Concórdia, Frei Caneca e Tobias Barreto, o nome de "Vietnã", devido à feroz concorrência das lojas de móveis e eletrodomésticos, capaz de formar preço para todo o Nordeste.
A referência ao "Vietnã" se deve à estratégia de guerrilha adotada pelos vietcongs contra as tropas americanas, surpreendendo o poderio bélico militar dos Estados Unidos com pequenas ações que exigiam conhecimento do terreno. No "Vietnã" do Recife, nos anos 70 e 80, essa guerra se travava nas lojas, onde o cliente poderia comprar um produto mais barato se mostrasse o preço de uma outra loja, às vezes situada a poucos metros.
Essa movimentação do mercado tinha a ver com a força que o comércio do Centro do Recife teve nesses 20 anos, onde a força dos shopping centers ainda não se consolidara no Estado e onde os bairros de Santo Antônio, São José e Boa Vista tinham eixos de produtos bem definidos. A Rua da Conceição, na Boa Vista, por exemplo, era referência pelas casas Agra e Batista, de serviços funerários.
Na Rua da Praia, por exemplo, se concentrava o comércio de ferragens e de material de construção, como iluminação, fechaduras e material elétrico. Na Rua Nova, além do varejo de luxo, existiam os bancos, enquanto nas ruas Duque de Caxias e Livramento, o nicho era de tecidos liderado pela centenária Casas José Araújo.
O "Vietnã" cuidava especificamente de eletrodomésticos e eletroeletrônicos. Essa guerra de preços era tão feroz que era acompanhada de perto pelas indústrias em negociações específicas, já que o preço médio das lojas da Rua da Palma e da Rua da Concórdia, do outro lado, definiam as margens de outras capitais.
A restauração da Rua da Palma está devolvendo, portanto, essa disputa, agora envolvendo as quatro grandes empresas do segmento com sede em Pernambuco: Credimóveis Novolar, Laser Eletro, Millena e Império, que travam, na Rua da Palma, uma disputa de preços, batendo de frente com os gigantes do setor, Magazine Luiza e Casas Bahia, que não abrem mão de ter ali suas lojas de rua.
Todas essas seis empresas estão presentes na Rua da Palma, ocupando espaços que já foram de marcas como a Mesbla, Arapuã e as pernambucanas Pedrosa da Fonseca, A Primavera e Boa Vista, entre outras que igualmente disputavam preços.
O prédio da antiga Mesbla, por exemplo, hoje é ocupado pela Credimóveis Novolar e Império. Eles agora são vizinhos da Millena e em frente a loja da Laser Eletro.
De certa forma, a restauração da Rua da Palma devolveu ao Centro do Recife uma guerra de preços e presença de público das classes C, D e E, que havia migrado para os bairros, mas que agora já sabe que nessas lojas é possível encontrar produtos com preços mais baixos depois de negociação direta com os vendedores.
A revitalização da Rua da Palma ajuda porque há um movimento de modernização dessas redes nas lojas da região, já que o público voltou. Embora já não esteja mais na disputa, a icônica Viana Leal, que já foi a loja mais famosa do Nordeste pela suas escadas rolantes e cujo prédio foi transformado numa galeria de pequenas lojas, já esteve ali mesmo, na Rua da Palma.