Não está descrito nas funções do cargo. Mas, no mercado, todo mundo sabe que uma das missões do ministro é defender o governo, as contas públicas e a melhoria das condições de arrecadação e pagamentos do Executivo. Além de zelar para que os demais poderes não ataquem o caixa único da União.
Daí, quando um ministro da Economia afirma “devo, não nego; pagarei assim que puder”, o mercado assustado faz a pergunta: "como?"
De fato. Não faz nenhum sentido o chefe da economia de qualquer pais civilizado fazer esse tipo de bravata. Primeiro, porque não pode pagar quando puder. Está orçado. Foi aprovado pelo Congresso. É pagar ou não pagar tendo, nesse caso, que explicar ao TCU a razão de não ter cumprido o empenho e pagamento da despesa.
Quando Paulo Guedes faz isso, a associação é imediata: Um país com a arrecadação que tem, que na semana passada falou em desbloquear todo o que tinha contingenciado, e com um ministro que agora diz que não vai pagar precatório, alguma informação importante está sendo escondida.
E, naturalmente, vem a pergunta: se daqui para frente, o Brasil não pagar os seus títulos? E se começar a atrasar a rolagem da dívida e se deixar de pagar compromissos financeiros internacionais?
Claro que dessas contas internacionais, o Banco Central vai cuidar. Claro que a Secretaria do Tesouro vai honrar como já honrou só este ano, R$ 5,48 bilhões de estados e municípios que tomaram empréstimos em dólar e não pagaram por alguma razão. Mas o comentário é ruim.
Mas uma das funções incluídas no contracheque do ministro é falar bem do Governo. Da gestão, do governo. Da performance da gestão, das contas do Governo. Ministro da Economia é uma espécie de animador do mercado. E, dependendo de sua seriedade, quando fala, o mercado define o rumo do vento.
Claro que Paulo Guedes virou uma espécie de biruta do que Bolsonaro sopra na gestão do governo. Seu prestígio no empresariado é tão baixo que um terço dos convidados de um evento que proveu deram um beiço nele.
Onde já se viu empresário faltar convite de ministro da Economia? Só no Brasil.
Mas voltando para a questão dos precatórios. Esse é um tipo de dívida que não dá para dizer que não vai pagar. Ou que vai pagar quando puder. Existem consequências. A inclusão de precatórios é o final de processo que cumpriu anos de etapas e que, perdendo a questão, cabe ao Executivo pagar e pronto.
A ideia de Paulo Guedes é propor uma PEC para criar uma regra transitória até 2029 que vai atrelar o pagamento dessas dívidas. No total, tudo terá de ficar limitado a 2,6% da receita corrente líquida. É algo tão absurdo como as ideias que o ministério da Economia gesta e depois morrem no primeiro confronto com o Legislativo.
Na prática, Paulo Guedes que criar uma espécie de juizado de pequenas causas deixando de atender uma demanda judicial sempre que ultrapassar R$ 66 mil. E com os agravantes de que os maiores poderão ser pagos em prestação.
A bem da verdade, as chances de uma ideia desse porte prosseguir são poucas. Isso teria que ser via PEC e não se aprova PEC sem acordo geral.
O problema está proposto. Ela por si só já é um problema. E mais ainda quando ele mesmo fala do destino que quer dar essa economia. Isso tudo levanta temores de que a deterioração das contas públicas é bem mais grave do que está sendo revelado.
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É um prato cheio para alimentar o receio dos investidores, pois o próprio Paulo Guedes admitiu que o pagamento de precatórios e o reajuste do Bolsa Família – sob a perspectiva de o governo rever o teto de gastos - são ambições eleitorais.
É importante não esquecer que não pagar precatório acirra a briga com os estados. No exercício de 2022, foram expedidos precatórios para os estados da Bahia, Ceará, Amazonas, Maranhão e Pernambuco, no total de R$ 15,6 bilhões. Os valores destinados aos estados foram: Ceará - R$ 2,6 bilhões, Bahia - R$ 8,8 bilhões, Pernambuco - R$ 3,9 bilhões, AM - R$ 219 milhões.
O Governo perdeu a causa no Supremo referente ao antigo Fundef, criado em 1996 e convertido em Fundeb em 2006. Na verdade, ainda existe R$ 1,1 bilhão relativo a quatro processos sobre dívidas de outras naturezas do Paraná, Goiás e Maranhão.
Como diz o secretário Décio Padilha, Pernambuco tem R$ 3,9 bilhões a receber em precatórios, relativos ao Fundef, e todos os Estados beneficiados com decisão STF tentam um acordo com o Governo Federal há mais de quatro anos. Ele lembra que os Estados fizeram diversas tratativas e negociações para reduzir o valor total e parcelar pagamento dos recursos, que infelizmente não avançaram.
Por isso que quando o ministro da Economia entra nessa rota, os investidores ficam se perguntando: O que mais vem por aí?