Com todo o respeito que merece o Procurador Geral da República, Augusto Aras, mas Sua Excelência trata o presidente Jair Bolsonaro como aquela senhora narrada na música "Não sei o que lá", eternizada nas vozes de Marilia Mendonça e Maiara e Maraisa, que abre o show "As Patroas", que programavam percorrer a Europa, não fosse a tragédia do acidente de matou Marília Mendonça na última sexta feira.
A música disponível no YouTube (Não sei o que lá), que já teve mais de 14 milhões de visualizações e 5,5 milhões de audições do Spotify, fala de uma mulher angustiada que no sábado, à meia-noite, sofre com o amante que não dá sinais de vida depois de ter saído para beber.
Ela se pergunta angustiada se o álcool ainda não fez efeito. “De passar para a cabeça o que tá no peito".
E enquanto ela está sofrendo, finalmente, o celular vibra e, num áudio de dois minutos, ela sem paciência só escuta a frase central onde ele pede um resgate:
Eu não sei o que lá, te amo
Não sei o que lá, saudade
Não sei o que lá, vem me buscar aqui
Na música, ela acelera o áudio o suficiente para entender, repetindo para si mesmo:
Toda vez que ele bebe é assim
Ela digita que não vai, mas já está a caminho
Olhando o comportamento do senhor procurador, a imagem que passa é a de que o presidente e o PGR se comportam desse jeito tipo, Bolsonaro dizendo:
“Eu não sei o que lá, o STF
Não sei o que lá, o TSE
Não sei o que lá, ninguém vai me tirar daqui”
E que Augusto Aras, resignado, se queixando que
“Toda vez que Bolsonaro fala é assim. Toda vez que Bolsonaro fala é assim”
Mas, mesmo dizendo que não vão aceitar, acaba dando um jeitinho de resgatá-lo.
Esta semana, a PGR resgatou o presidente mais uma vez ao dizer que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) não cometeu crimes em seus discursos golpistas no último dia 7 de Setembro.
Como se sabe, naquele momento, o presidente fez um desafio explícito ao STF, dizendo que não respeitaria "qualquer decisão" do ministro Alexandre de Moraes.
Mas para a PGR, as falas foram um "arroubo de retórica". Na interpretação do vice-procurador-geral da República, Humberto Jacques de Medeiros, que assina o parecer, a atitude de Bolsonaro "não afetou ou ameaçou" o livre exercício do Judiciário.
O comportamento do vice-PGR reflete exatamente o pensamento do seu chefe, o PGR Augusto Aras, que acaba de ser reconduzido ao cargo após dois anos de alinhamento próximo ao pensamento do presidente - ao ponto de ser cobrado pelos membros do STF.
Não foi a primeira vez. Em outubro, a ministra Rosa Weber, do STF, cobrou um novo parecer da PGR sobre os pedidos do PT e do PSOL para investigar se o presidente Jair Bolsonaro cometeu crime ao sair sem máscara e causar aglomeração em eventos públicos durante a pandemia.
Também a sub-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, considerou que Bolsonaro não cometeu crime. Mas a ministra afirmou que não cabe ao Ministério Público ou ao Judiciário fazer juízo de valor sobre as normas sanitárias em vigor na pandemia.
O próximo embate parece que será com o Senado.
A Frente Parlamentar Observatório da Pandemia discute convocar Augusto Aras e prestar explicações aos senadores em alguma comissão caso ele não se manifeste sobre o relatório final da CPI da Covid e os indiciamentos propostos em até 30 dias.
Depois de três anos, há de fato um desgaste entre a Suprema Corte e o PGR, que acumula desgastes perante o STF, o que dificulta sua relação com a corte e impõe um desafio em seu segundo mandato à frente da instituição.
Ministros como Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Edson Fachin e, especialmente, Rosa Weber, usaram decisões recentes para fazer críticas públicas sobre a atuação de Aras.
Mas parece claro que o PGR, ao sentir o celular vibrar e Bolsonaro mandar um “áudio de dois minutos pra lá”, mesmo com zero paciência de escutar e até mesmo digitando que não vai aceitar outras falas do presidente, acaba estando a caminho de resgatá-lo.
Talvez porque goste mesmo do trecho da canção de Maiara e Maraisa quando diz:
Eu não sei o que lá, te amo
Não sei o que lá, saudade
Não sei o que lá, vem me buscar aqui.