Aos 25 anos e grávida de sete meses, Maria do Carmo criou a maior empresa de laboratórios do Sertão de Pernambuco

Para quem mora no Recife ou numa das capitais do Nordeste, certamente está mais acostumado com marcas de laboratórios de análises clínicas como as Gilson Cidrin, Marcelo Magalhães, Edmar Victor. Ou como Dasa, Sabin ou Sérgio Fleury.

Mas na região do sertão de Pernambuco, nenhuma dessas marcas tem relevância. Ali, quando se fala em laboratórios de análises clínicas, o nome mais importante é o Maria do Carmo Diagnósticos. Ou da empresa criada, há 40 anos, por Maria do Carmo de Lima e Silva.

O Maria do Carmo Diagnósticos é uma referência da Região do Vale do Pajeú, e é a empresa líder de um grupo empresarial comandado pela empresária que, com apenas 25 anos, abriu, sozinha, as portas do laboratório, aos sete meses de gravidez de sua filha Laíse Lima, que hoje está na companhia.

Hoje, é o maior e mais completo laboratório de análises clínicas da Região, que se transformou num grande centro de diagnóstico, numa rede de farmácias, num Clinical Center e numa distribuidora de medicamentos que atende todo o Nordeste, sob o comando da empresária e do marido Joseph Domingos, que virou seu sócio.

O Laboratório Maria do Carmo de Lima e Silva acabou abrindo o caminho para expansão de diversas atividades e formação do hoje Grupo JM, sediado no município sertanejo de Afogados da Ingazeira, graças à combinação de três elementos básicos que marcam a visão da empresária: visão estratégica para o negócio, profissionalismo e empreendedorismo.

Maria do Carmo foi aprovada no curso de Farmácia pela UFPE, mas concluiu a graduação na Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Quando completou 25 anos, era recém-graduada quando um grupo de professores da UFPB decidiu vender os equipamentos de um laboratório que possuíam.

Ela não hesitou, comprou os equipamentos e chamou o marido para ser seu sócio. Mas decidiu retornar à cidade natal de Afogados da Ingazeira para abrir o próprio laboratório da cidade, cujos exames eram feitos no Recife, a mais de 500 quilômetros.

Ao voltar para sua terra natal, pediu ajuda à família, que alugou uma casa para que a jovem desse início ao seu sonho. Na época, a cidade tinha apenas um pequeno laboratório. Os equipamentos que ela trouxera de João Pessoa permitam muito mais análises.

“No primeiro dia de funcionamento, não apareceu nenhum paciente”, conta Maria do Carmo, lembrando as primeira dificuldades como empreendedora. “Ficamos eu e a primeira funcionária contratada como atendente sem ter o que fazer’, lembra hoje, 40 anos depois.

LUTA PARA TER CREDIBILIDADE

Mas ao invés de desanimar, Maria do Carmo entendeu que precisaria ter muito foco para conquistar o reconhecimento da população e, principalmente, adquirir credibilidade da classe médica. Os anos que se seguiram foram de muitos desafios, segundo relata Maria do Carmo.

Quatro anos depois, o casal de empreendedores precisou vender o carro da família, uma Belina, e comprar o imóvel onde até hoje funciona uma unidade do laboratório e só em 1988, o Maria do Carmo transformou-se no Centro de Diagnóstico, ocupando um prédio de primeiro andar. Num ponto numa rua movimentada da cidade, eles já tinham inaugurado a outra empresa do casal, a Farmácia dos Municípios.

O espírito empreendedor aliado ao fascínio de participar do processo de descoberta de uma patologia de um paciente num laboratório de análises clínicas. Os 40 anos do Maria do Carmo Diagnósticos representam, portanto, a celebração de uma história de força, garra, superação e de quebra de paradigmas.

Maria do Carmo diz que - ao lado Joseph Domingos - se reconhecem como personagens de uma importante colaboração à Região de Afogados da Ingazeira, mas insistem que isso só aconteceu porque desde o primeiro dia de trabalho, se dedicaram a conquistar a credibilidade da população, através do excelente atendimento e o cuidado com as pessoas.

“A gente sabia que quanto mais o negócio da família crescia, cada vez mais aumentava a responsabilidade de entregar meios de apoio ao diagnóstico dos serviços médicos e hospitalares."

"Porque, numa cidade do interior, todo mundo conhece toda a nossa família. Então, era o nosso nome quem avalizava as entregas. Até porque o meu nome estava na porta de cada unidade”, adverte a empresária.

O Maria do Carmo diagnósticos virou referência, tem todas as certificações e é considerado uma empresa inovadora, mas tudo isso tem a ver com a determinação da empresária, manifestada desde o primeiro dia de trabalho, quando decidiu mudar o rumo de sua história e voltar para Afogados da Ingazeira, grávida do primeiro filho, e tocar o negócio sozinha, já que o marido precisou ficar em João Pessoa, para onde o casal se mudou depois de casado.

Mas isso também foi um gesto de amor, esclarece Maria do Carmo. É que, seguindo uma tradição, Joseph Domingos prestou e foi aprovado no concurso do Banco do Brasil, onde desenvolveu uma exitosa carreira, mas ao ser classificado, foi transferido para João Pessoa.

Eles se casaram e Maria do Carmo foi para a UFPB concluir seu curso, e morava na cidade até surgir a oportunidade de comprar os equipamentos que deram origem ao Maria do Carmo Diagnósticos.

MÃE, MULHER E EMPREENDEDORA

Isso obrigou Maria do Carmo a seguir presencialmente sozinha, já que seu marido ainda morava em João Pessoa e só visitava a família nos finais de semana. Somente no Natal de 1982 ele conseguiu ser transferido para a cidade vizinha a Afogados da Ingazeira, Carnaíba, a 20 km de distância, onde, aliás, foi instalada a primeira filial do laboratório.

Joseph lembra que, na verdade, são 50 anos de relacionamento, entre o namoro e o casamento. E ele destaca a coragem e a determinação de Maria do Carmo em começar a tocar o laboratório sozinha, quando ele estava morando em João Pessoa.

“Eu a admiro como companheira e mãe de nossos filhos (Pedro Henrique, cardiologista; Clarissa, radiologista radicada em Florianópolis, e Laíse, que entrou na gestão da companhia). Mas admiro a determinação e a disciplina profissional e empresarial da Dra. Maria do Carmo”, fala o sócio e marido.

Na empresa, essa parceria da adolescência aos negócios, o casamento de Maria do Carmo com Joseph foi celebrado em 1980 e a integração aos negócios da família foi celebrada com a criação do Grupo JM, que carrega as iniciais dos dois e hoje compreende quatro empresas administradas pela família, com a participação dos filhos.

Joseph Domingos diz que, na operação prática, Maria do Carmo vai muito além. “Ela tem capacidade de trabalho muito grande e essa habilidade perdura desde o começo da empresa até hoje. E mesmo depois que me dediquei, após me aposentar e entrar na operação do grupo, a presença dela é fundamental. Até hoje, ela faz questão de conhecer os funcionários que atuam no grupo, acompanhando pessoalmente o trabalho”.

PAIXÃO NASCEU NA ESCOLA PÚBLICA

Na verdade, a paixão pela bioquímica de Maria do Carmo começou quando ela, aos 16 anos, ouviu de uma amiga que o curso de Farmácia tinha muitas noções de Química, que ela tinha. Estudante do então Científico (hoje Ensino Médio) em escola pública de Afogados de Ingazeira, ela começou a ter insights na adolescência para seguir a trilha acadêmica e empreendedora que acabou abrindo caminho para construção de sua empresa, que é referência em saúde e motivo de orgulho para o Sertão do Pajeú e para o Nordeste do Brasil.

“Eu gostava muito de Química. Estava encantada com a matéria”, lembra ela. “Acredito que isso uniu meu senso de percepção e a veia empreendedora. Isso me norteou ao longo da vida. Eu segui minha intuição ao fazer o vestibular para o curso de Farmácia na UFPE, mesmo com uma certa insegurança do meu pai, que me incentivava a fazer Medicina”.

Essa ligação era muito forte e ela lembra de estar nas salas de aulas e olhar no laboratório as imagens dos cálices, das pipetas, vidros coloridos. “Era uma fascinação toda vez que entrava num laboratório. Era um mistério que tinha curiosidade em desvendar”, relembra Maria do Carmo.

Filha de sertanejos empreendedores, Maria do Carmo, ainda garota, vez ou outra vendia a pipoca que sua própria mãe fazia para os filhos na frente de casa. Mas se herdara do pai a inspiração para os negócios, sabia que só se diferenciaria pela Educação. Ela foi a primeira mulher de Afogados da Ingazeira a se formar em Farmácia e fez especialização em Bioquímica.

"Eu nasci no dia 24 de junho de 1957, quando a música “Riacho do Navio”, de Luiz Gonzaga, foi o grande sucesso do ano. E essa música diz que o rio vai se expandindo até o mar, crescendo, ganhando força. Eu sabia que meu destino era chegar no mar", diz Maria do Carmo.

Quando concluiu o ensino médio, em 1976, no Colégio Normal Estadual, ela ouviu um conselho do pai: Você pode fazer tudo que quiser, “só não quero que ela deixe de estudar”, até mesmo após seu casamento. Ela seguiu o conselho.

Depois de formada, ela iniciou uma especialização de Bioquímica e Análises Clínicas e, um ano depois da formação, em julho de 1982, utilizou seu conhecimento e visão estratégica para se estabelecer na região. Ela também fez curso de Pedagogia, formou-se como professora, mas nunca chegou a exercer.

“Esse conhecimento obtido no curso foi a base para unir sua vocação de cuidar das pessoas ao talento de empreender", diz a empresária. “Eu ensinei minha primeira funcionária a colher sangue, receber o material, distribuir o material, eu fazia os exames, eu fazia a parte técnica. Foi desafiador e a funcionária aprendeu tudo”, lembra Maria do Carmo.

Deu certo. O grupo, que começou com uma funcionária, hoje emprega mais de 200. O Maria do Carmo Diagnósticos tem filiais nos municípios sertanejos de Carnaíba, Iguaracy e Ingazeira, além de postos de coleta na própria cidade de Afogados da Ingazeira.

E passou a oferecer, além dos exames laboratoriais, diagnóstico por imagem. Todos os exames de prevenção de câncer ginecológico através do SUS na região do Pajeú são realizados no Maria do Carmo Diagnósticos. Além de Bioquímica, a empresária é também citologista.

Junto com a tecnologia de ponta e refinados processos na área da saúde, as empresas proporcionaram uma geração de emprego e renda e oportunidades de crescimento na formação profissional dos seus colaboradores.

“Durante esses 40 anos, nunca paramos. Mesmo quando era eu sozinha à frente da gestão da empresa, sempre tivemos compromisso maior com a qualidade e fomos crescendo com recursos próprios”, se orgulha.

GRUPO JM DE AFOGADOS DA INGAZEIRA

Hoje, o laboratório, empresa mãe do grupo JM (Maria do Carmo Lima e Joseph Domingos), junta-se a mais três empresas: a Pharmaplus, distribuidora de medicamentos que atua em todo o Nordeste, a rede de drogarias Farmácia dos Municípios e o Clinical Center, formado por consultórios médicos com mais de 20 especialidades.

Este ano, a Pharmaplus recebeu uma chancela nacional que é um reconhecimento fundamental para uma distribuidora: a Certificação de Boas Práticas de Armazenagem e Distribuição da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A conquista do certificado pela Distribuidora Farmaplus foi decisiva para os novos planos de expansão.

A Distribuidora de Medicamentos atualmente ocupa o Top 5 no setor em Pernambuco. A Pharmaplus funciona com cobertura efetiva em todo o Nordeste.

Segundo Joseph Domingos, que depois da aposentadoria do Banco do Brasil virou o CEO do Grupo JM, “foi um reconhecimento que muito nos orgulha, pois todas as nossas empresas têm um zelo extremo em todos os nossos serviços e processos. Sempre cuidamos da saúde das pessoas.

“Depois que me aposentei, criamos a distribuidora de medicamentos, que hoje é a empresa que eu mais me dedico, e criamos o Clinical Center, em 2010”, conta Joseph. Logo em seguida, Laíse Lima, filha mais nova do casal, passou a integrar o time de gestão no laboratório, seguindo os passos da família, que já contava com Pedro Henrique, cardiologista e filho mais velho, e Clarissa, radiologista, que reside em Florianópolis.

O empresário diz que o relacionamento do grupo com o cliente, de uma forma geral, é totalmente eletrônico. No laboratório, o atendimento é presencial, mas o resultado é distribuído de forma eletrônica. Portanto, o paciente só retorna se quiser.

“As pessoas estão se acostumando com isso, não estão mais voltando para pegar resultados”, detalha. A telemedicina, para Joseph Domingos, é uma tendência que precisa estar sendo estudada permanentemente, tanto para o laboratório, quanto para o Clinical Center, quanto para a farmácia, já que agora o cliente tem acesso ao nosso mix de produtos.

“Ele tem acesso e pode fazer a compra completa”, conta ele ao falar sobre o sistema de e commerce.

“São evoluções que precisamos estar acompanhando. Sempre”, sentencia ele, afirmando que ficar parado não é uma opção para o grupo de saúde, que virou motivo de orgulho para o Sertão do Pajeú e o Nordeste do Brasil.