Escalonamento é aprovado pelos passageiros do transporte público da Região Metropolitana do Recife

Passageiros demonstraram interesse na flexibilização dos horários de trabalho ou estudo em troca de um transporte menos lotado
Roberta Soares
Publicado em 06/11/2020 às 19:44
Determinação segue nota técnica da Secretaria Estadual de Saúde e vai durar, a princípio, pelo menos 60 dias, contados desde o dia 6 de dezembro de 2022 Foto: FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM


A proposta de adotar o escalonamento de horários das atividades econômicas para ajudar a superlotação do transporte público da Região Metropolitana do Recife na pandemia - tão rejeitada pelos setores que poderiam colaborar - ganhou respaldo de quem mais deveria importar: o passageiro do sistema. É o que aponta pesquisa realizada pelo setor empresarial de ônibus com o objetivo de fortalecer a proposta e forçar o poder público a adotá-la, juntamente com outras estratégias que atraiam antigos e novos passageiros. Entre elas, a redução de tarifas nos horários fora pico - medida adotada, com bons resultados, em duas capitais brasileiras e sendo proposta numa terceira: Curitiba (PR), desde o fim de 2019, Fortaleza (CE) no início de 2020, e Porto Alegre (RS), que começa a cobrar a menos nesta segunda-feira (9/11).

 

CONFIRA A SÉRIE ESCALONAMENTO EM DISCUSSÃO



Em resumo, os passageiros demonstraram interesse na flexibilização dos horários de trabalho ou estudo em troca de um transporte menos lotado. Quando questionados se poderiam mudar seus horários em até uma hora para usar o serviço de ônibus com mais conforto e menor lotação, 45,8% dos quase mil usuários que responderam à pesquisa disseram que sim. E outros 30,4% que talvez. Ou seja, 76,2% foram receptivos às mudanças, caso elas fossem adotadas. Apenas 23,8% foram declaradamente contrários à flexibilização.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM - A mesma pesquisa também confirmou o que todos que convivem com o transporte público coletivo estão cansados de ouvir: que os sistemas precisam se modernizar, inovar, oferecer serviços, facilidades e atrativos para quem o utiliza


Os resultados animaram os operadores porque, há aproximadamente dois meses, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE), lançou a proposta de escalonamento permanente de algumas atividades econômicas para pulverizar a concentração de passageiros nos horários de pico do transporte público. Na RMR, assim como em quase todo o País - com poucas exceções -, praticamente 50% da demanda se concentra em quatro horas do dia (duas pela manhã e duas no fim da tarde e início da noite) - algo que assusta em tempos de pandemia e que afasta o usuário que tem escolha. É tanto que os números do sistema apontam uma permanente fuga de 30% dos passageiros. A proposta de escalonamento, no entanto, teve ampla rejeição e nunca foi sequer encampada pelo governo do Estado, gestor do sistema de ônibus da RMR e quem poderia viabilizar, politicamente, os novos horários.

NOVOS ATRATIVOS
A mesma pesquisa também confirmou o que todos que convivem com o transporte público coletivo estão cansados de ouvir: que os sistemas precisam se modernizar, inovar, oferecer serviços, facilidades e atrativos para quem o utiliza. Que o transporte público está velho, atrasado e ainda burocrático, enquanto é engolido pela tecnologia dominante da nova mobilidade urbana, com o conceito Maas - Mobility as a Service - em plena ascensão. Ou seja, a mobilidade desejada como um serviço, na palma da mão, com várias possibilidades e funcionalidades.

 

ARTES JC - Detalhes da pesquisa

De olho no que vem acontecendo em outras cidades - como Curitiba, Fortaleza e Porto Alegre - a Urbana-PE e o Cittamobi questionaram se os usuários mudariam seus horários de deslocamento caso houvesse um atrativo que os levassem para o fora pico. E provocaram: se fosse oferecida uma passagem mais barata nesses horários, haveria adesão? 66% dos passageiros responderam que considerariam a mudança de horário com a possibilidade de uma tarifa diferenciada. 42,8% dos entrevistados disseram sim e 23,7% talvez, enquanto 33,4% foram contrários.

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM - O escalonamento dos horários das atividades econômicas ajudaria muito a reduzir a concentração do pico do transporte


A pesquisa foi realizada de forma digital e espontânea, através do Cittamobi, aplicativo que funciona como o app oficial do sistema de transporte da RMR, indicando os horários dos ônibus e um dos canais de recarga dos créditos eletrônicos dos cartões VEM. Como o Simop até hoje não foi implantado plenamente - há mais de um ano está em teste apenas no Sistema BRT -, o Cittamobi é utilizado amplamente pela população.

PERNAMBUCO TEM PROJETO PARA REDUÇÃO DA TARIFA PRONTO
Para a Urbana-PE, os resultados mostram que é necessário oferecer serviços mais flexíveis, alinhados com as demandas dos passageiros - como é o caso das tarifas diferenciadas. O setor defende que essa possibilidade seja estudada para o Sistema de Transporte Público de Passageiros da Região Metropolitana do Recife (STPP/RMR) pelo governo do Estado - único que pode analisar e implantar a medida.

ARTES JC - Propostas para o transporte público


Pernambuco, inclusive, tem pronto um modelo de projeto de lei propondo a flexibilização e modernização do serviço de ônibus na RMR que inclui a redução das tarifas fora dos horários de maior movimento e a criação do transporte sob demanda, ou seja, acionado por aplicativo. As propostas fazem parte do pacote de ações apresentado pelo governo do Estado no início de 2020, como compensação ao não reajuste das passagens.

ARTES JC - MOBILIDADE

No caso do desconto da tarifa fora pico, a proposta está pronta na Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Seduh), que gerencia o sistema de ônibus da RMR, mas a implantação foi adiada devido à pandemia. Segundo o secretário Marcelo Bruto admitiu ao JC em outubro, na série de reportagens Escalonamento em discussão, o governo decidiu aguardar pelo menos até o fim do ano para ter mais segurança do impacto sobre o sistema, já que não há mais previsibilidade da situação da demanda de passageiros. O Consórcio Conorte, que opera na área Norte da RMR, também tem estudando o modelo junto ao governo do Estado. Mas tudo depende do impacto na receita do sistema.

EXEMPLOS PELO BRASIL
A redução do preço da passagem no chamado fora pico é uma estratégia que já vem sendo testada há pelo meno um ano no País e apresentado bons resultados.

CURITIBA
Curitiba, capital paranaense, inovou na redução da tarifa fora pico antes mesmo da pandemia e do ressurgimento da discussão sobre o escalonamento de horários de início das atividades econômicas. Por volta de setembro de 2019, implantou a redução e, de acordo com levantamento divulgado no fim do mesmo ano pela Urbs (Urbanização de Curitiba), gestora do sistema, a medida teria provocado um aumento médio de 134 mil passageiros por dia útil nas seis linhas do projeto. O acréscimo registrado foi de 3 mil passageiros pagantes, em um mês (22 dias úteis). A passagem foi reduzida em R$ 1 nos horários das 9h às 11h e das 14h às 16h e para pagamento exclusivo com o cartão-transporte usuário.

FORTALEZA
Fortaleza (CE) também deu start em projeto semelhante no início de 2020, um pouco antes da pandemia do coronavírus começar. Reduziu em 20% a passagem nos horários fora do pico da manhã e da tarde (9h às 11h e 14h às 16h) do projeto Hora Social, que já oferece uma redução dos valores por duas horas do dia. O valor cobrado é de R$ 3,40 (inteira) e R$ 1,50 (meia). Com a nova redução, os passageiros passaram a pagar R$ 3,00 (inteira) e R$ 1,30 (meia).

FELIPE RIBEIRO/JC IMAGEM - A redução de tarifas nos horários fora pico foi adotada, com bons resultados, em duas capitais brasileiras e está sendo proposta numa terceira: Curitiba (PR), desde o fim de 2019, no início de 2020 Fortaleza (CE), e Porto Alegre (RS), que recentemente enviou projeto de lei semelhante para o Legislativo municipal


PORTO ALEGRE
A capital gaúcha é a mais recente a adotar o modelo. A passagem de ônibus em Porto Alegre será reduzida em R$ 0,15 a partir da segunda-feira (9/11). O valor passará de R$ 4,70 para R$ 4,55. A redução foi proposta pela prefeitura e aprovada por unanimidade pelo Conselho Municipal de Transportes Urbanos (Comtu).

A medida só foi possível porque anteriormente a Câmara de Vereadores aprovou a extinção da remuneração pelo gerenciamento da Câmara de Compensação Tarifária (CCT) - iniciativa adotada no transporte do Grande Recife há mais de cinco anos, mas que até hoje não provocou a redução da passagem dos ônibus.
A extinção da CCT foi um dos projetos enviados à Câmara Municipal de Porto Alegre em janeiro de 2020 e fazia parte de um pacote de medidas para reduzir o valor da passagem e que ainda tramita na Casa. Se todas as medidas forem aprovadas, o valor da tarifa poderia baixar para até R$ 2,00 na capital gaúcha.

 

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