Transporte público em crise no Brasil: ônibus perderam metade dos passageiros na pandemia
Queda foi superior a 50% e acende o alerta sob o risco de o País perder alguns dos seus sistemas de transporte público coletivo regulares
A crise que já castiga o transporte público brasileiro há pelo menos uma década alcançou patamares absurdos com a pandemia de covid-19. O transporte por ônibus - que responde de 70% a 80% dos deslocamentos diários nas cidades e, portanto, leva o País nas costas, verdade seja dita - perdeu mais da metade dos passageiros pagantes - 51,1%. A gigante queda foi verificada em 2020 e segue deixando sequelas para o setor, sob risco de sofrer uma degradação sem volta com o tempo.
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E vale a pena repetir: sem transporte público coletivo, as cidades param, não há justiça social porque os mais pobres não conseguem acessar oportunidades, e o meio-ambiente colapsa. A dura realidade faz parte do Anuário NTU 2020-2021, que há 27 anos avalia o desempenho operacional do setor e está sendo lançado no Seminário Nacional NTU, evento on-line que começa nesta terça-feira (21/9). Na prática, significa dizer que em 2020 foram 167 passageiros transportados por dia. Essa redução significa dizer que menos de sete passageiros foram transportados por hora em sistemas de ônibus que operam por 24 horas (considerando os pagantes).
Para se ter ideia do abismo, há mais de 20 anos cada ônibus transportava 631 passageiros, em média, diariamente. A queda, considerando essa relação, é de 73,6%. Conclusão: a conta não fecha. E o alerta, aceso há alguns anos, está ainda mais preocupante. “Entre 1994 e 2012, a fuga dos passageiros foi de 24%. De 2013 a 2019, foi de 26%. Ou seja, já entramos na pandemia em crise. E ela só piorou: perdemos 80% dos passageiros em março e abril de 2020. A perda se recuperou um pouco, mas ainda está longe do que era mesmo antes da crise sanitária. A maioria das cidades que têm sistemas de ônibus regulares está com 80% da frota nas ruas e apenas 60% da demanda. As únicas exceções no País seriam São Paulo e Brasília porque têm subsídios efetivos para o transporte”, alerta o presidente-executivo da NTU, Otávio Vieira da Cunha.
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O Anuário potencializa o medo que muitos técnicos e estudiosos do setor têm há alguns anos e que foi ampliado com a crise da pandemia: o comprometimento real dos serviços regulares de transporte público nas cidades. “Os sistemas de transporte público não suportam sobreviver apenas sendo financiados pelo passageiro pagante. O prejuízo já vai em R$ 16,7 bilhões. Precisamos fazer algo urgentemente. Nós, operadores, e o poder público, que regulamenta, gere e fiscaliza. Sob risco de o Brasil ficar sem o transporte público. Só precisamos olhar para os exemplos de fora do País. São vários mostrando que toda a sociedade precisa contribuir, de alguma forma, com o financiamento do transporte público, sendo usuária ou não do serviço. Em mais um seminário do setor estaremos trazendo discussões sobre essa urgência.”, reforça Otávio Cunha.
Precisamos fazer algo urgentemente. Nós, operadores, e o poder público, que regulamenta, gere e fiscaliza. Sob risco de o Brasil ficar sem o transporte público. Só precisamos olhar para os exemplos de fora do País. São vários mostrando que toda a sociedade precisa contribuir, de alguma forma, com o financiamento do transporte público, sendo usuária ou não do serviço",Otávio Vieira da Cunha, presidente-executivo da NTU
REGIÃO METROPOLITANA DO RECIFE NO PACOTE
O estudo da NTU considera as médias dos indicadores apurados nos meses de abril e outubro de cada ano, conforme a série histórica realizada pela Associação com base em nove capitais: Recife-PE, Belo Horizonte-MG, Curitiba-PR, Fortaleza-CE, Goiânia-GO, Porto Alegre-RS, Rio de Janeiro-RJ, Salvador-BA e São Paulo-SP. Nessas capitais, que representam 35% da demanda nacional, deixaram de ser realizadas 147,2 milhões de viagens/mês na média dos meses de abril e outubro do ano passado nos serviços de ônibus, em comparação com igual período de 2019.
OUTRAS CONSEQUÊNCIAS
Outra consequência danosa da inércia do poder público - especialmente do governo federal, que durante a pandemia, vale ressaltar, não deu uma única ajuda aos sistemas de transporte público do País - é o comprometimento da frota dos veículos que transportam a população. O Anuário da NTU revela que a idade média da frota nunca foi tão velha em toda a série histórica. Pulou para 5,8 anos nos nove sistemas analisados. Ônibus velhos nas ruas comprometem a segurança dos passageiros.
Otávio Cunha explica que o desequilíbrio econômico-financeiro dos contratos, agravado desde o início da pandemia, comprometeu a capacidade de renovação da frota pelas empresas operadoras, mesmo para atendimento das determinações de vida útil e idade média definidas nos editais de licitação e contratos.
CONFIRA O ANUÁRIO 2020-2021
AnuarioNTUTransportePublico_2020_2021 by Roberta Soares on Scribd
Precisamos fazer algo urgentemente. Nós, operadores, e o poder público, que regulamenta, gere e fiscaliza. Sob risco de o Brasil ficar sem o transporte público. Só precisamos olhar para os exemplos de fora do País. S&ati
Otávio Vieira da Cunha, presidente-executivo da NTU