Após mais de dez meses, a Polícia Civil de Pernambuco confirmou, nesta terça-feira (12), que indiciou o policial militar do Batalhão de Choque que atirou no adesivador Daniel Campelo da Silva, de 51 anos. A vítima passava pela Ponte Duarte Coelho, durante um protesto em repúdio ao governo do presidente Jair Bolsonaro, na área central do Recife, em 29 de maio de 2021, quando foi atingida no olho esquerdo e perdeu a visão.
Em nota enviada à coluna Ronda JC, a Polícia Civil informou que o PM foi indiciado pelos crimes de lesão corporal gravíssima e por omissão de socorro. Além disso, outros oito policiais do Batalhão de Radiopatrulha também foram indiciados por omissão de socorro.
Os indiciamentos dos outros PMs ocorreram porque, após ser atingido pelo tiro de bala de elastômero (borracha), Daniel Campelo chegou a pedir ajuda. Mas, como mostraram imagens gravadas, os policiais que estavam na ocorrência não prestaram assistência à vítima.
Os nomes dos policiais não foram divulgados pela Polícia Civil de Pernambuco. O resultado do inquérito foi encaminhado ao Ministério Público, que vai decidir se oferece denúncia à Justiça.
Em caso de condenação, a pena para o crime de omissão de socorro é de um a seis meses de detenção, que pode ser convertida em multa arbitrada pela Justiça. Já para o crime de lesão corporal gravíssima, a pena pode chegar a oito anos de prisão.
Vale lembrar que o protesto ocorria de forma pacífica, porém os policiais militares tentaram dispersar os manifestantes de forma truculenta. E até hoje a Secretaria de Defesa Social (SDS) não explicou quem deu a ordem para tais atos violentos.
OUTRA VÍTIMA
Além de Daniel Campelo, que só passava perto do protesto, o arrumador de contêineres Jonas Correia de França, de 29 anos, foi atingido na Ponte Princesa Isabel.
O terceiro sargento do Batalhão de Choque Reinaldo Belmiro Lins, acusado de disparar o tiro de elastômero, foi indiciado e, atualmente, responde na Justiça pelo crime de lesão corporal grave, com o agravante de o crime ter sido cometido por um militar.
A pena, em caso de condenação, pode chegar a cinco anos de prisão. O processo ainda está em fase de audiências de instrução e julgamento para ouvida de testemunhas.
Durante a ação desastrosa da PM, a vereadora Liana Cirne (PT) foi atingida no rosto por spray de pimenta ao tentar negociar com policiais militares do Batalhão de Radiopatrulha, na Ponte Santa Isabel. Esta investigação foi concluída pela Polícia Civil, mas a SDS não revelou o resultado, sob a alegação de que o caso está sob segredo de Justiça.
QUATRO POLICIAIS INDICIADOS
Por causa da truculência, 16 policiais militares (três oficiais e 13 praças) foram identificados e afastados das atividades nas ruas.
No final de março deste ano, a SDS informou que o Inquérito Policial Militar que havia sido instaurado foi concluído com o indiciamento, por prática de crime militar, de quatro dos policiais investigados, sendo dois oficiais e dois praças, todos já submetidos a processos disciplinares.
"Os autos do IPM foram encaminhados à Central de Inquéritos do Ministério Público, para análise e possível oferecimento da denúncia", disse a nota.
Apesar de questionada pela coluna, a SDS não quis informar por quais crimes os militares vão responder.
Além disso, a Corregedoria da SDS está em fase final das investigações administrativas em desfavor dos PMs envolvidos na ação.
"A Corregedoria finalizou, na esfera administrativa, cinco dos sete Processos Administrativos Disciplinares (PAD) instaurados. Dois desses relatórios concluídos aguardam parecer técnico da Corregedoria Auxiliar Militar, enquanto outros três estão em análise para elaboração de parecer do Corregedor Geral. Dois processos continuam em andamento", informou a pasta, no final do mês passado.
Os PMs podem sofrer punições que vão de advertências até expulsão da corporação, a depender da gravidade atribuída a cada um deles.
QUEM DEU A ORDEM PARA ATIRAR?
Três dias após a ação desastrosa da PM, o então comandante geral da corporação, Vanildo Maranhão, foi exonerado. No seu lugar, ficou o coronel José Roberto Santana. A saída de Maranhão se deu em meio aos depoimentos que apontaram ele como o responsável por dar a ordem de ação dos policiais contra os manifestantes, mesmo com o ato ocorrendo de forma pacífica, conforme documento revelado em primeira mão pela coluna Ronda JC.
Vanildo nunca veio a público dar sua versão sobre o caso. Ele foi transferido para a reserva remunerada.
Dias depois, o delegado federal Antônio de Pádua, até então secretário estadual de Defesa Social, também foi exonerado do cargo. Humberto Freire, até então secretário adjunto, assumiu a titularidade da pasta.