Preocupados com o debate sobre o retorno das aulas presenciais em Pernambuco, pesquisadores e professores do Departamento de Estatística da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) elaboraram um documento, com base nos cenários epidêmicos da covid-19, para alertar a sociedade em geral sobre os riscos da volta às escolas – um assunto que ganhou peso nos últimos dias, após criadas expectativas para a retomada do ensino particular no próximo mês. Incisivos, o grupo de professores que preparou a carta deixa claro que as escolas do Estado não deveriam mais voltar a realizar atividades presenciais ainda este ano.
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“Acreditamos que não é uma boa hora a retomada em julho ou agosto. Creio que só em 2021, pois devemos ter um tempo para adaptar e melhorar essa situação (da curva epidêmica). O nosso documento representa o entendimento (sobre a retomada das atividades educacionais) de 19 dos nossos 29 professores. Consideramos desde o ensino infantil até o universitário”, diz a chefe do Departamento de Estatística da UFPE, Carla Monteiro.
O depoimento da especialista desponta em sintonia com entrevista publicada, nesta sexta-feira (19), com o médico e vice-presidente da Sociedade de Pediatria de Pernambuco, Eduardo Jorge Fonseca, nesta coluna Saúde e Bem-Estar. Ele explicou por que os indicadores atuais ainda não oferecem a segurança necessária para afirmar que o próximo mês pode ser um momento de retorno das aulas para as crianças, especialmente quando se fala sobre as menores de 5 anos de idade.
Na opinião do professor Gauss Cordeiro, do Departamento de Estatística da UFPE, o maior problema enfrentado para garantir a volta à escola com segurança está centrado no afastamento social, algo que é difícil de ser cumprido na faixa etária infantojuvenil. “Não há condições de se fazer distanciamento de um metro e meio ou dois metros com os alunos. Eles não conseguem”, frisa Gauss, que é membro da Academia Pernambucana de Ciências.
O professor explica que, apesar de estudos mostrarem que a infecção não causa riscos elevados às crianças, elas podem ser potenciais pacientes assintomáticos (ou com sintomas leves) e acabam se transformando em elo de transmissão da doença. “Esse vírus, principalmente em ambiente com ar-condicionado, pode se deslocar por quatro metros e ficar no ar por algumas horas.” Além disso, Gauss diz que o documento elaborado é direcionado à sociedade em geral. "Pais de alunos, inclusive, já compartilham essa carta em seus grupos no WhatsApp. O texto é público e bem verdadeiro. O que estamos colocando não é só para o Grande Recife; é para todo o Estado."
No documento, os professores de estatística sublinham que, “as gotículas geradas pela fala, espirro ou tosse de infectados podem permanecer suspensas no ar durante horas em ambientes fechados. Se houver retorno (das aulas presenciais) este ano, muitos alunos serão infectados e inúmeros levarão carga viral para seus lares. A maioria dos estudantes não terá transtorno, mas passará para os pais e os idosos, além de transmitirem para outros alunos com doenças crônicas e que, dessa maneira, poderão sofrer problemas sérios de saúde”.
O documento ainda menciona casos em que unidades de ensino não abrirão mais as portas para os estudantes este ano. “Inúmeras instituições, mundo afora, só planejam retornar em forma presencial em 2021.” O texto destaca a Universidade de São Paulo e a Federal do Rio de Janeiro, que indicam a retomada somente em 2021, e o Ministério da Educação, que estende aulas online de federais até o fim do ano. “A Universidade de Cambridge, uma das melhores universidades do planeta, planejou retorno em 2022”, dizem os professores.
Nesta sexta-feira (19), em coletiva de imprensa transmitida pela internet, o secretário de Saúde de Pernambuco, André Longo, informou que trabalha em parceria com a Educação para apresentar à população um planejamento de retomada gradual e extremamente cauteloso às escolas, focado na segurança de estudantes, professores e famílias. “Existe um grande contingente de pessoas que circula nesse processo de retorno. A nossa meta é que, até o fim deste mês, possamos entregar esse plano das atividades da educação, que será por fases, mas ainda não temos as datas precisas”, afirmou André Longo.
O secretário ainda acrescentou que a área de educação movimenta praticamente 2,5 milhões de pessoas no Estado, desde o básico até o ensino superior, além de cursos livres. "É preciso ter cautela para iniciar o plano de convivência com a covid-19 nessa parcela extremamente expressiva da população”, esclareceu Longo.