A Polícia Civil de Pernambuco deflagrou, nesta quarta-feira (28), uma operação para prender suspeitos de integrar a Trem Bala, facção perigosa e violenta que tem como base a praia de Porto de Galinhas, cartão-postal de Pernambuco. A investigação apontou que o grupo tem ligação com facções do Sudeste, como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e, principalmente, o Comando Vermelho.
As investigações comandadas pelo delegado Ney Rodrigues foram iniciadas em junho de 2020, com o objetivo de identificar e desarticular a organização criminosa especializada no tráfico de drogas, comércio ilegal de armas de fogo, tortura e lavagem de dinheiro. O grupo também torturava e enterrava as vítimas em cemitérios clandestinos.
Para a polícia, o grupo é bem organizado, com estrutura hierárquica e divisão de tarefas entre os membros: há "olheiros", vendedores de drogas, gerentes do tráfico, homicidas, "laranjas" que emprestam contas bancárias para a lavagem de dinheiro, chefias e líderes da organização.
A facção tem forte atuação nos municípios de Ipojuca (onde Porto de Galinhas está localizado), Cabo de Santo Agostinho, Sirinhaém, Itamaracá, Escada, Jaboatão dos Guararapes, entre outros.
No último dia 16 de junho, o atual líder da Trem Bala foi preso. Pedro Paulo de Jesus Teixeira, conhecido como Carioca, estava morando na chamada Zona de Expansão de Aracaju, uma espécie de região metropolitana recém construída, onde estaria investindo em imóveis. Evanilson José da Silva, conhecido por "Bambam", o líder anterior ao Carioca, também está preso.
Ambos, segundo a polícia, tem forte ligação com o Comando Vermelho, do Rio de Janeiro, que seria a principal fornecedora de drogas. A descoberta foi feita porque integrantes da Trem Bala usavam, nas redes sociais, usam expressões como "Tudo dois", que pertencem à simbologia alusiva à facção carioca.
Na Operação Manguezal Vermelho, como está sendo chamada, foram cumpridos 24 mandados de prisão preventiva e nove de busca e apreensão domiciliar, todos expedidos pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Ipojuca. Há mulheres entre os presos.
No total, 150 policiais civis participaram da operação, que ocorreu nas cidades de Ipojuca, Igarassu, Abreu e Lima, Recife, Palmares e Limoeiro (todas em Pernambuco), além de Aracaju, em Sergipe.
A Trem Bala consegue movimentar milhões de reais todo mês. Somente em uma operação de repressão qualificada, a polícia apreendeu R$ 2 milhões com os capturados.
"TRIBUNAL DO CRIME"
Manguezal vermelho faz referência à planta mangue vermelho, vegetação típica de mangues que, quando tem sua casca raspada, apresenta uma coloração avermelhada. O nome dado a operação é uma alusão à existência de cemitérios clandestinos nas áreas de mangue nos distritos de Porto de Galinhas e Nossa Senhora do Ó, também em Ipojuca.
Segundo as investigações, os traficantes torturam e enterram pessoas apontadas como informantes da polícia, usuários de drogas em dívidas com a facção e outros criminosos que vendem entorpecentes sem a autorização dos líderes da Trem Bala.
Moradores locais que praticam crimes patrimoniais ou de violência doméstica em Porto de Galinhas também são "julgados e condenados" por uma espécie de tribunal do crime.
FACÇÃO TREM BALA, ALVO DE OPERAÇÃO, TAMBÉM TEM LIGAÇÃO COM O PCC
Durante as investigações da Polícia Civil, nos últimos anos, constatou-se que o grupo Trem Bala também tem ligações com a facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC), que seria uma fornecedora de drogas.
Fotos de comprovantes bancários encontradas em celular periciado demonstram transações financeiras com indivíduos integrantes da facção paulista.
COMPRA DE ARMAS DE FOGO DA POLÍCIA CIVIL
A Trem Bala, inclusive, é apontada como uma das facções que compraram armas de fogo subtraídas da sede da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), no Recife. O esquema, que envolveu policiais civis, foi descoberto em 2021.
No total, 1.131 armas (entre metralhadoras, pistolas e revólveres) e milhares de munições foram desviadas e vendidas por valores médios entre R$ 6,3 mil a 6,5 mil. Já as submetralhadoras custavam R$ 22 mil no comércio ilegal.
FACÇÃO COMANDA ROTINA DE COMUNIDADE EM PORTO DE GALINHAS, APONTA INVESTIGAÇÃO
A investigação revelou que a comunidade de Salinas, em Porto de Galinhas, é comandada por integrantes da Trem Bala. O acesso de pessoas à localidade só é permitido com autorização dos criminosos, que portam armas de grosso calibre pelas ruas em plena luz do dia.
Eles se comunicam por meio de rádios e monitoram os lugares por meio de câmeras de segurança.
Até mesmo o acesso para realização de serviços públicos essenciais, como a coleta de lixo, reparos e instalação de iluminação pública e entrega de encomendas, só podem ser feitos com a permissão do chefe da boca de fumo.
PROTESTOS APÓS MORTE DE MENINA FORAM ORGANIZADOS PELA TREM BALA
As investigações também revelaram que os protestos de moradores da comunidade de Salinas após a morte da menina Heloysa Gabrielle, de 6 anos, em março de 2022, foram orquestradas por integrantes da Trem Bala.
Nos protestos, que resultaram em dias tensos no cartão-postal pernambucano, moradores pediam a retirada dos policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) da região, sob a acusação de que seriam violentos.