VIOLÊNCIA

Facção que comprou armas furtadas da polícia eleva mortes no Litoral Sul de Pernambuco

Municípios do Cabo de Santo Agostinho e de Ipojuca, no Litoral Sul de Pernambuco, registraram uma explosão de assassinatos no primeiro semestre de 2022

Raphael Guerra
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Raphael Guerra
Publicado em 19/07/2022 às 6:00
ALEX OLIVEIRA/ACERVO JC IMAGEM
IPOJUCA Morte de menina de 6 anos, em março deste ano, expôs a violência e avanço do tráfico de drogas na praia de Porto de Galinhas - FOTO: ALEX OLIVEIRA/ACERVO JC IMAGEM
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Os municípios do Cabo de Santo Agostinho e de Ipojuca, no Litoral Sul de Pernambuco, registraram uma explosão de assassinatos no primeiro semestre de 2022.

Para a polícia, a guerra entre facções criminosas pelo domínio do tráfico de drogas foi responsável pelo avanço desenfreado da violência e do medo à população.

Um grupo que avança pelo Litoral Sul de Pernambuco, em especial, desafia há anos a polícia: o Comando Litoral Sul (CLS), que até pouco tempo era chamado de Trem Bala.

Violenta e com maior número de integrantes, a facção atua fortemente em Ipojuca. E também conquistou território no Cabo de Santo Agostinho, onde tenta, de vez, assumir o controle da venda das drogas.

A facção é a mesma que adquiriu parte das armas de fogo - como pistolas, revólveres e metralhadoras - que foram furtadas da Coordenadoria de Operações Especiais (Core) da Polícia Civil de Pernambuco, na área central do Recife.

E justamente essas armas podem estar sendo usadas pelo CLS para a prática dos assassinatos como forma de eliminar rivais e ganhar mais território.

Reportagem da coluna Ronda JC revelou, na semana passada, que 1.131 armas de fogo foram furtadas do depósito da Core - e não só 326, como a Polícia Civil havia informado à imprensa em agosto do ano passado.

O número maior consta em ofício encaminhado pelo delegado Adelson Barbosa à Polícia Federal (PF) em Pernambuco, em fevereiro de 2021, um mês após a descoberta das subtrações.

Segundo a PF, até hoje nenhuma das armas que constam na lista foi recuperada.

Durante a investigação sobre o furto, ficou comprovado, por meio de interceptações telefônicas, que parte das armas foi vendida por valores que variavam de R$ 6,3 mil a 6,5 mil para duas facções. Uma delas foi a CLS.

De acordo com estatísticas da Secretaria de Defesa Social (SDS), 29 homicídios foram registrados no primeiro semestre de 2022 em Ipojuca. O número é 61% maior do que no mesmo período de 2021, quando 18 pessoas foram mortas.

O perfil das vítimas, neste ano, também chama a atenção: 20 tinham idades entre 18 e 29 anos - público que é mais atraído por facções para o tráfico de drogas.

Policiais ouvidos em reserva pelo JC contaram que a CLS disputa território em Ipojuca com o PCI (Primeiro Comando de Ipojuca), que atua mais na parte central do município.

"Houve um período de muitas mortes, e isso estava chamando a atenção da polícia. No presídio, as lideranças decidiram dar uma trégua para não atrapalhar o tráfico. Ainda não se sabe o motivo, mas, de seis meses para cá, o acordo se rompeu e os homicídios cresceram muito. A CLS tem vantagem porque tem bem mais integrantes", explicou um policial civil.

Em 30 de março deste ano, uma perseguição de policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) a um suspeito resultou na morte da menina Heloysa Gabrielly, de 6 anos, atingida por um tiro, na praia de Porto de Galinhas, que fica em Ipojuca.

O caso, ainda não esclarecido pela polícia, acabou expondo a violência e o avanço do tráfico de drogas num dos principais destinos turísticos do País.

ARTES JC
VIOLÊNCIA - ARTES JC

CABO DE SANTO AGOSTINHO

Município vizinho, o Cabo de Santo Agostinho somou 107 assassinatos no primeiro semestre de 2022. Foram 26 a mais do que no mesmo período de 2021. O aumento foi de 32%.

"Na cidade há muitas facções disputando o domínio do tráfico, mas todas pequenas. A CLS é maior e tem conquistado território. E, claro, ela tem relação com esse aumento das mortes", pontuou outro policial.

O fato de a facção ter se abastecido com as armas de fogo furtadas da Core também é motivo de preocupação porque, segundo os policiais, elas podem estar sendo usadas nos homicídios registrados no Litoral Sul do Estado.

Outro detalhe é que, das 1.131 armas furtadas, 119 pertenciam à Guarda Municipal de Ipojuca. Elas estavam guardadas na Core enquanto os profissionais passavam por treinamento. As pistolas haviam sido doadas pela Polícia Rodoviária Federal. Porém, as armas acabaram nas mãos erradas e, ao invés do suporte à segurança, passaram a contribuir com o avanço da criminalidade.

PROCESSO DAS ARMAS FURTADAS

O processo criminal relacionado ao furto de armas de fogo da Core está na fase de audiências de instrução e julgamento.

Ao todo há 19 réus - quatro são policiais civis acusados do desvio e venda das armas para os integrantes de facções. Um quinto policial, preso durante operação em agosto de 2021, veio a falecer 19 dias depois no Centro de Observação e Triagem (Cotel), em Abreu e Lima.

Os outros policiais civis continuam presos aguardando sentença.

Além das armas de fogo, mais de 3 mil munições teriam sido desviadas do depósito da Core. A investigação apontou que não havia câmeras onde as armas estavam guardadas.

A câmera que ficava apontada para a porta de entrada do depósito também não estava funcionando 24 horas, o que dificultou ainda mais o trabalho dos investigadores.

 

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