LITERATURA

Escritora cearense, Vanessa Passos vence Prêmio Kindle de Literatura

"A filha primitiva" terá o romance publicado em formato impresso pela editora Record – e Vanessa também espera ver sua história ganhar os palcos do teatro e do audiovisual. A escritora falou ao JC sobre a importância da premiação, o mercado editorial para as mulheres, e de seu caminho na literatura, antes do prêmio, e a partir de agora.

Cadastrado por

Fábio Lucas

Publicado em 22/02/2022 às 11:02 | Atualizado em 22/02/2022 às 11:04
Vanessa Passos levou o Prêmio Kindle de Literatura - Divulgação

Fábio Lucas
Do Livronews
@livronewsnoinsta


Se nem sempre a soma da teimosia com o talento resulta em consagração, para quem se dispõe à carreira literária, a conquista de prêmios importantes traz o gosto de merecido reconhecimento. Como no caso do Prêmio Kindle de Literatura, lançado em 2017 pela Amazon para escritores independentes no Brasil que publicam suas obras na plataforma de livros eletrônicos Kindle Direct Publishing (KDP). Na terça-feira  15 deste mês, em cerimônia com a presença dos cinco finalistas, foi anunciado o resultado da sexta edição do prêmio, para o qual concorreram mais de 2 mil e-books inéditos. E a vencedora foi a cearense Vanessa Passos, que está atualmente em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, aprimorando a vocação em pós-doutorado em escrita criativa com Luiz Antonio Assis Brasil, um dos maiores nomes da área, na PUCRS. Além da premiação em dinheiro no valor de R$ 50 mil, a autora de “A filha primitiva” terá o romance publicado em formato impresso pela editora Record – e Vanessa também espera ver sua história ganhar os palcos do teatro e do audiovisual. A escritora falou ao JC sobre a importância da premiação, o mercado editorial para as mulheres, e de seu caminho na literatura, antes do prêmio, e a partir de agora.


JC - O Prêmio Kindle chega à sexta edição cada vez mais prestigiado. O que representa a premiação de “A filha primitiva” pra você?

Vanessa Passos - O Prêmio Kindle representa o reconhecimento de um trabalho de anos. Foram 4 anos para o livro ficar pronto, 11 versões. Mais do que isso, o prêmio representa também que escritoras e escritores de outros estados possam ter mais visibilidade nos seus trabalhos, atenção da imprensa e do mercado editorial, sendo eu a primeira cearense a vencer o prêmio.

JC - A expectativa deve ter sido enorme, depois que você ficou entre os finalistas. O que passava por sua cabeça antes do anúncio do resultado?

Vanessa Passos - Apesar do nervosismo e da expectativa, eu estava tranquila de que havia me entregado completamente para esse projeto: na escrita, na revisão e divulgação de “A filha primitiva”. Estava com uma sensação de missão cumprida.

JC - Quais os marcos na trajetória do livro premiado? Como essa trajetória reflete o trabalho e a teimosia que você dedicou à obra?

Vanessa Passos - Um marco importante foi alcançar tantos leitores. Sendo eu uma autora independente, sem apoio de editora e assessoria de imprensa, cearense, nordestina, e fora do eixo RJ-SP, Sul e Sudeste, conquistar mesmo antes do resultado do Prêmio mais de 500 avaliações em poucos meses e ficar no ranking de 50 livros mais vendidos na categoria de Ficção Psicológica é muito. Era um trabalho diário de responder leitores, fazer parcerias, repostar resenhas, participar de lives, clubes de leitura e leituras coletivas. Posso dizer que foi um trabalho incansável.

JC - Como autora, o que você traz do livro que escreveu, esse livro que agora chama a atenção do país para a sua escrita?

Vanessa Passos - O meu desejo e investigação pelo feminino, por mulheres, suas histórias e dores. O sentir na pele de diversas formas as violências e silenciamentos que nós, mulheres, vivemos. E a paixão pela metalinguagem, pela escrita. Em geral, sempre tenho nos meus livros uma personagem escrevendo ou contando uma história, é uma das minhas obsessões literárias.

JC - As leituras de outras escritoras, bem como as resenhas de perfis e canais literários, formam um conjunto expressivo de olhares que deve aumentar bastante, a partir de agora, sobre “A filha primitiva”. Qual a sua expectativa em relação ao novo e ampliado alcance do livro premiado?

Vanessa Passos - Esse é um trabalho que já vinha sendo feito antes do resultado, mas que certamente vai ampliar, sem falar que o livro ganhou muito espaço na grande imprensa. Quero fortalecer esses diálogos, ocupar espaços para discussão do livro (eventos literários, bienais, lives, clubes, escolas). Pra mim, essa aproximação de quem escreve com quem lê é incrível e necessária. Tenho também muito desejo de que o livro seja adaptado para outra arte, seja para o teatro, seja para o audiovisual. Sempre foi o meu sonho, porque amo esse diálogo entre as artes.

JC - Antes de escritora premiada, você se propõe a ajudar as pessoas a escreverem e publicarem seus livros, estimulando e orientando, no curso 321Escreva. O que a conquista do Prêmio Kindle pode incorporar a essa proposta?

Vanessa Passos - É um trabalho que venho desenvolvendo desde 2018. Primeiro com oficinas e curso presenciais. Depois, a partir de 2020, de forma online, com o 321escreva. Mas sempre estamos aprendendo. Minha forma de aprendizado parte muito da experiência, da experimentação. O que sempre repito para os alunos é que a teoria sem prática não gera resultados. Nesta nova turma, acrescentamos, por exemplo, um curso sobre como publicar por financiamento coletivo, porque a autopublicação tem sido uma opção interessante para novos autores.

JC - Parte da premiação do Kindle, suporte para o livro eletrônico, é a publicação da obra em formato impresso por uma grande editora, no caso, a Record. Trata-se quase de um reconhecimento hierárquico à história e à paixão que as leitoras e leitores – e as escritoras e os escritores – nutrem pelo bom livro de papel. O que acha? Sem desmerecer o valor do e-book, com evidentes qualidades, você estava ansiosa para materializar “A filha primitiva” no livro táctil?

Vanessa Passos - Para mim, é uma grande honra ser publicada pela José Olympio, pelo grupo editorial Record. Admiro muito o trabalho que realizam e o processo de edição da versão física de “A filha primitiva” já começa em março. Esta possibilidade me alegra muito, porque acredito na diversificação das estratégias para alcançar mais leitores, falo sobre ter o livro físico e o digital, isso só amplia o alcance do livro.

JC - Em um comentário em sua rede social, você disse que gosta de tirar os leitores do livro da zona de conforto. Por que? E como “A filha primitiva” proporciona isso?

Vanessa Passos - Acredito que, na vida e na literatura, existem temas tabus, intocáveis. A partir disso, por um lado, temos grandes silenciamentos em relação a temas espinhosos como a violência sexual e, por outro, romantização de temas como a maternidade e a amamentação. “A filha primitiva” traz uma narrativa nua e crua, sem floreios, sem colocar a sujeira para debaixo do tapete, ela escancara os silêncios, seja no conteúdo, seja na linguagem.

JC - Ao ver o livro entre as obras finalistas, você convidou algumas escritoras para compartilhar publicamente a leitura de trechos do romance. Na sua visão, como anda a literatura feita por mulheres, e o mercado editorial para as mulheres no Brasil?

Vanessa Passos - Sim, foi o projeto #lendoafilhaprimitiva. Convidei autoras vivas que admiro, que leio e que de alguma maneira fizeram parte desse projeto, como: Giovana Madalosso, Natalia Timerman, Aline Bei, Andrea Del Fuego, entre outras. O mercado editorial ainda é desigual, sem dúvidas. Não só o mercado, como a imprensa ainda dá mais visibilidade para a produção de homens. Mas as mulheres têm "forçado passagem", como diz Conceição Evaristo. As mulheres têm escrito e colocado seus textos no mundo com muita gana e garra. É bonito de ver. Eu estou sempre lendo e apoiando o trabalho de outras escritoras.

JC - Parabéns pelo livro e pelo prêmio, Vanessa. E agora, o que vem pela frente? Quais os próximos passos que já dá para ver? A publicação do livro impresso tem previsão?

Vanessa Passos - Os próximos passos são divulgar muito “A filha primitiva”. O livro ainda tem muitos leitores a conquistar mundo a fora e, sem dúvidas, vou trabalhar duro para isso. A edição da versão física pela Record já começa em março. E estou escrevendo o segundo romance, “A primogênita”. O livro será trabalhado ao longo do meu Pós-Doutorado em Escrita Criativa pela PUC/RS, com orientação do Assis Brasil.

 

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