Home office pode ser o futuro de 20,8 milhões de brasileiros no pós-pandemia

Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) mostra que o teletrabalho poderá ser adotado por 22,7% das profissões no Brasil
Marcelo Aprígio
Publicado em 06/06/2020 às 12:25
Brasil pode ficar no 2º lugar no ranking de trabalho remoto na América Latina, atrás apenas do Chile Foto: ANA LUISA ERTHAL/CORTESIA


Com a pandemia do novo coronavírus, milhões de brasileiros deixaram os escritórios e passaram a trabalhar de casa. O home office, que já era uma tendência, ganhou impulso e, com a mudança nos hábitos, deve se fortalecer mesmo após o isolamento. Um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea) mostra que o home office poderá ser adotado por 22,7% das profissões no Brasil, alcançando mais de 20,8 milhões de pessoas. Isso colocaria o país na 45ª posição mundial e no 2º lugar no ranking de trabalho remoto na América Latina, atrás apenas do Chile.

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Batizada de “Potencial de Teletrabalho na Pandemia: Um Retrato no Brasil e no Mundo”, a pesquisa adaptou à realidade brasileira uma metodologia usada pela Universidade de Chicago na estimativa do home office em 86 países. Os pesquisadores fizeram a conversão das funções para a Classificação de Ocupações para Pesquisas Domiciliares, adotada pela Pnad Contínua, do IBGE.

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Para o sociólogo Bruno Callou, o estudo do Ipea é importante, apesar de ainda não ser possível avaliar o impacto das medidas de distanciamento social no teletrabalho no Brasil. “Ainda não dá para apontar com certeza quais as influências da pandemia no crescimento do home office no país, mas a pesquisa do Ipea já nos dá uma noção do que pode nos esperar no futuro”, diz Callou, lembrando que os dados da Pnad Contínua do primeiro trimestre de 2020 apontaram uma leve alta, embora não significativa, em relação ao do 4º trimestre de 2019.

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O estudo revelou que o grupo de profissionais das ciências e intelectuais possui o maior potencial de teletrabalho (65%), seguido por diretores e gerentes (61%), trabalhadores de apoio administrativo (41%) e técnicos e profissionais de nível médio (30%). Na outra ponta, trabalhadores rurais, da caça e da pesca e militares não podem trabalhar remotamente.

Diante disso, o economista Daniel Duque, da Fundação Getulio Vargas (FGV), acredita que haverá um aumento da desigualdade. Ele lembra que os empregos mais protegidos são aqueles com maior potencial de teletrabalho, ou seja, os que exigem qualificação, com acesso ao trabalho e à produção por meios digitais. “Esse trabalho exige conhecimento de software, de programas que são valorizados. Isso vai gerar agravamento grande da desigualdade”, afirma ele.

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Callou compartilha do pensamento com Duque e acredita que a retomada das atividades econômicas vai prestar atenção nas novas modalidades de trabalho surgidas durante a pandemia. “Com os governos decidindo reabrir a economia, certamente as empresas devem levar em consideração as novas modalidades de trabalho que emergiram e foram essenciais no período de isolamento, a fim de repensar as dinâmicas de trabalho”, diz ele.

Na mesma linha de Callou, a especialista em desenvolvimento humano Júlia Nascimento acredita que, diante deste possível comportamento das organizações, os profissionais também vão precisar considerar as novas tendências de trabalho no pós-pandemia se quiserem continuar no mercado.

“As empresas vão optar pelo home office, porque ele provou ser eficiente, e os trabalhadores precisam estar dispostos a trabalhar de casa para permanecer na ativa”, diz Júlia. “Para uns, de repente, será possível passar quatro dias trabalhando em casa e um no escritório. Para outros, pode ser uma ou duas vezes em casa”, afirma ela, explicando que essa decisão será tomada seguindo, entre outras coisas, o potencial de teletrabalho apontado pelo Ipea.

DESIGUALDADES ENTRE OS ESTADOS

Quando a análise é feita por Estados, ela mostra um aprofundamento maior das desigualdades regionais. De acordo com o Ipea, o maior potencial de adoção do home office está no Distrito Federal, onde 31,6% dos empregos podem ser executados de forma remota (cerca de 450 mil pessoas).
O Piauí é onde há o menor potencial de teletrabalho, não atingindo nem a metade do registrado no DF. O Estado nordestino pode ter 15,6% das atividades, ou cerca de 192 mil pessoas, em home office. Em Pernambuco, o trabalho remoto pode ser adotado por 18,8% das profissões, atingindo aproximadamente 654 mil pessoas.

Na avaliação de Callou, o estudo aponta uma relação entre o potencial de adoção do teletrabalho e a economia dos estados brasileiros. “Quando observamos os números de home office e os dados econômicos, vemos que há uma relação entre o teletrabalho e a renda per capita dos Estados”, aponta.
O estudo, para o sociólogo, confirmou uma tese defendida por pesquisadores mesmo antes da pandemia. “Quem se dedica a estudar a evolução do home office no Brasil já vinha defendendo esta correlação antes mesmo de o coronavírus chegar aqui.”

Na visão dos analistas, porém, o home office pode impulsionar contratação, por exemplo, de muitos nordestinos por empresas do Rio e São Paulo, o que abrandaria as disparidades o ofereceria mais oportunidades para quem está fora do eixo econômico mais forte do País. “É vantajoso, e as empresas não perdem produtividade”, pontua Callou.

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