Depois de décadas de dedicação ao trabalho, conquistar uma aposentadoria com um salário digno é o sonho de qualquer trabalhador. Mas, na maioria das vezes, nem sempre este sonho é possível. Segundo um estudo da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e SPC Brasil, feito há quatro anos, um terço dos aposentados brasileiros acima de 60 anos de idade continua trabalhando para complementar a renda.
Para otimizar os ganhos com a aposentadoria é que existe o planejamento previdenciário, prática ainda pouco comum, mas que pode fazer uma grande diferença quando chega a hora de pendurar as chuteiras. O planejamento de aposentadoria é feito a partir da análise detalhada dos dados previdenciários do trabalhador com o objetivo de obter o melhor benefício possível. Os cálculos geralmente são feitos por um contador ou um advogado especialista em direito previdenciário.
São levados em conta o tempo de contribuição, a idade, tipo de atividade que o trabalhador exerce, e o cumprimento de requisitos específicos. Esses dados são cruzados e o profissional responsável pelo planejamento apresenta estratégias para a aposentadoria, que pode incluir o aumento no valor da contribuição, contribuir por mais tempo, ou as duas coisas. O planejamento pode ser feito por jovens no início da vida profissional ou mesmo pessoas mais velhas, próximas de cumprir o tempo mínimo necessário para se aposentar.
Para o advogado especialista em direito previdenciário, Eliseu Leite, não há uma idade ideal para começar a se planejar. “Quanto mais cedo melhor, principalmente agora, após a reforma da previdência. O objetivo do planejamento é otimizar o valor da aposentadoria o máximo possível, e também não contribuir mais do que o necessário”, diz Eliseu.
O advogado explicou que existem situações onde, por estar próximo de se aposentar, o trabalhador não precisa mais fazer o recolhimento máximo ao INSS, porque o que importa é a média de todas as contribuições. Segundo o INSS, o teto máximo de contribuição é hoje de R$ 671 para trabalhadores autônomos e R$ 1.220 para empregados. Já os benefícios pagos ficam entre R$ 1.045 (um salário mínimo), e R$ 6.101 (benefício máximo).
O caso do assistente administrativo Geraldo (nome fictício) é um exemplo de planejamento previdenciário. Seu Geraldo teve um ganho expressivo ao recalcular seu tempo de serviço e, como pretende continuar trabalhando depois de se aposentar, alegou que prefere não ser identificado com o nome verdadeiro nesta matéria. Ele contribuiu com o INSS durante 31 anos e, agora, aos 65 anos de idade, ao atingir a idade mínima para se aposentar, procurou o advogado para calcular o valor que receberia da previdência. Pelo INSS seu Geraldo iria receber um salário mínimo, R$ 1.045, de aposentadoria.
O advogado Eliseu Leite explicou que a Emenda Constitucional 103, de novembro de 2019, que instituiu a Reforma da Previdência, permite excluir do cálculo, contribuições até o tempo mínimo necessário para a aposentadoria (15 anos). “No caso de Seu Geraldo descartamos dez anos, 120 contribuições, deixando ele então com 21 anos de contribuição. Como ele havia feito diversas contribuições com percentuais de referência acima do salário mínimo, deixamos as 21 maiores contribuições, fazendo com que a média subisse”. O valor final da aposentadoria, depois de apurada a média, ficou em R$ 3.759. Ou seja, R$ 2.714 a mais, afirmou o advogado. O requerimento da aposentadoria é feito junto ao INSS pelo advogado com a nova média já calculada. O INSS pode aceitar, refazer os cálculos e apresentar uma nova média, ou contestar o cálculo.
Para quem busca um complemento da previdência social, a saída pode estar nos planos de previdência privada. Assim como a pública, o plano privado começa com o período de acumulação, quando são feitos aportes, geralmente mensais, que irão compor o patrimônio financeiro total. Depois vem a parte do benefício. A diferença aqui para a previdência pública é que o contribuinte escolhe por quanto tempo quer contribuir e de que forma quer receber o patrimônio acumulado Pode ser de uma vez só (com algumas perdas) , ou na forma de um salário mensal. Segundo balanço da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (FenaPrevi), no ano passado, 6,3% da população brasileira possuía plano de previdência privada. No quarto trimestre de 2019 a procura por esse tipo de investimento havia crescido 35,4%.
Para Leandro Trajano, personal financeiro, a previdência privada também exige planejamento e, nem sempre é um bom investimento. “Só é interessante para quem tem disciplina em poupar a longo prazo, conhece bem o mercado e faz um acompanhamento rigoroso daquele investimento”, diz Trajano. Outro problema, segundo o consultor, é a grande variedade de produtos financeiros que existem no mercado.
“Alguns bancos cobram taxas de administração altíssimas ou remuneram o capital investido de forma muito ruim. Nesse cenário só quem ganha é o banco. Não se trata aqui de desestimular a relação do cliente com os bancos mas é preciso ter a percepção de que banco é essencialmente serviço. Pra quem quer investimento o caminho são as corretoras, que só recentemente estão entrando neste mercado de previdência privada. Agora, geralmente, são as seguradoras que tem as melhores propostas”, diz o orientador financeiro.
Mas existem outros detalhes para o investidor iniciante ficar atento. Os planos de previdência privada são divididos em duas categorias. Os planos PGBL (Plano Gerador de Benefício Livre) e VGBL (Vida Gerador de Benefício Livre). A principal diferença entre as duas modalidades está na tributação e a escolha errada pode fazer com que a pessoa pague mais impostos do que deveria. No plano PGBL, o investidor pode deduzir suas contribuições do Imposto de Renda com limite de até 12% da renda obtida no ano. Esse modelo pode ser mais interessante para pessoas que fazem declaração de Imposto de Renda pelo formulário completo.
Já no segundo modelo, o VGBL, a alíquota do imposto de renda é cobrada somente sobre a rentabilidade. Esse é o modelo mais interessante para quem faz declaração de IR simplificada. Para Leandro Trajano, por ter tantos detalhes, a previdência privada tem que ser bem escolhida desde o começo. “É frequente chegarem pessoas até mim que tem uma previdência PGBL que não têm sentido nenhum para o seu perfil de investidor”. Leandro diz que, para simplificar, como a grande maioria faz declaração de IR simplificada então a previdência VGBL é mais indicada. O PGBL é indicado para quem tem rendas maiores.
Outro cuidado importante que o investidor de previdência privada deve ter é sobre a forma de remuneração. As previdências baseadas em renda fixa devem ter taxas de administração mais baixas, entre 0,3% e 0,7%. Agora, à medida que o fundo mescla com renda variável, e por isso dá mais trabalho ao gestor, essa taxa de administração sobe muito, se situando entre 1,5% e 2%. As taxas são cobradas anualmente. “Não que a taxa de 2% seja fator excludente, é preciso ver se o fundo tem uma boa performance, dá um bom retorno que compense”, diz Trajano.
Leandro Trajano lembra ainda que a previdência privada é um investimento que se faz a longo prazo, para pelo menos 10 anos, por isso, é bom fazer um plano que tenha um mix entre renda fixa e variável. “Por mais que a pessoa se diga conservadora ela pode ter um ganho melhor na renda variável. Agora, o mercado financeiro é instável, então é preciso uma análise periódica para ver se a volatilidade das taxas de renda fixa não estão minando seu investimento, se há tempo para suportar essa volatilidade em busca do melhor retorno”, ensina.