Entrevista

Apontado por Bolsonaro como vilão da gasolina, ICMS estadual não é responsável pelo aumento, diz secretário da Fazenda de Pernambuco

Décio Padilha também criticou a proposta que tramita na Câmara e pode alterar regras do Imposto de Renda

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Cássio Oliveira

Publicado em 19/08/2021 às 10:46 | Atualizado em 19/08/2021 às 13:42
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Secretário da Fazenda de Pernambuco, Décio Padilha voltou a discordar de Jair Bolsonaro sobre a alta nos combustíveis no País. Nessa quarta-feira (18), em Manaus (AM), Bolsonaro classificou os preços como absurdos e destacou o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) dos estados como o vilão.

Para Décio Padilha, o problema está na política de preços adotada pela Petrobras. "O problema de combustível no Brasil é a falta de concorrência. A Petrobras quinzenalmente estabelece um preço, dolarizou toda a sua produção, alinhou o preço praticado no País à variação do barril de petróleo internacional e à variação do câmbio, sabendo que 40% é importado e 60% é produzido. As multinacionais fazem composição, parte é dolarizado, parte não é, não entendo porque a Petrobras não faz isso Desde que ela mudou essa política, ela está com altíssima rentabilidade, enquanto o país está em dificuldade grande e não tem concorrência. Se tivesse concorrência, não tinha reajuste quinzenal", afirmou o secretário em entrevista à Rádio Jornal, nesta quinta-feira (19).

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Sobre o ICMS, Décio lembrou que a alíquota em Pernambuco é a mesma desde 2016, assim, o imposto não seria o responsável pelo aumento nos combustíveis. "Se a carga tributária do Brasil é alta, temos uma proposta no Congresso, vote ela. Acabando ICMS, ISS, Pis/Cofins, criando uma única alíquota nacional, mas não se vota isso, vão votar uma proposta para perder receita Estado e município", afirmou. 

Décio se referiu à reforma que trata das alterações no Imposto de Renda de pessoas físicas e jurídicas e da cobrança de dividendos. A proposta foi retirada da pauta na última semana por falta de acordo e retornou ao Plenário da Câmara dos Deputados.

O projeto muda a legislação tributária com medidas como o reajuste da faixa de isenção para fins de Imposto de Renda, a cobrança do tributo sobre lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a acionistas, a diminuição do Imposto de Renda das empresas e o cancelamento de alguns benefícios fiscais. Todas as medidas têm efeito a partir de 1º de janeiro de 2022, em respeito ao princípio da anterioridade, segundo o qual as mudanças em tributos devem valer apenas para o ano seguinte.

"Vínhamos há dois anos em tratativas com governo federal e Congresso para implantar a reforma tributária ampla, que reduziria carga tributária pelo aumento de produtividade anual, padronização e menos risco fiscal. Mas o governo federal decidiu fazer reforma fatiada, primeiro enviou PIS/Cofins que não foi bem sucedida, está parada. E agora na segunda fase mexe no Imposto de Renda, com perdas a Estados e municípios, então não diria que o governo fez estratégia, o governo tentou duas vezes e faltou voto para aprovar. Os deputados entenderam que não dá para votar isso de forma açodada", afirmou Décio, que é coordenador nacional do Grupo da Reforma Tributária, formado por secretários de Fazenda dos Estados.

Décio Padilha afirma que a aprovação dessa reforma trará prejuízo de cerca R$ 806 milhões em arrecadação em Pernambuco. Cerca de R$ 546 milhões deixaria de ser arrecadado pelo governo estadual, enquanto o restante seria dividido entre os municípios pernambucanos.

O projeto pode alterar a arrecadação dos estados no que diz respeito ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE). Em Pernambuco, a queda nessa receita seria de R$ 320 milhões. Deve haver outra diminuição no imposto de renda do servidor público, com prejuízo de R$ 226 milhões. Já no âmbito municipal, o projeto de lei deverá diminuir em R$ 260 milhões o que é arrecadado pelos municípios por meio do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). 

Décio reclama que em todas as versões de reforma há grandes prejuízos. "Nunca vi fazer reforma desse jeito, todo dia muda e, quando muda, cálculos precisam ser feitos, pois isso rebate no FPE, nos Estados, nos municípios, no próprio governo federal. Nessa última versão, Pernambuco continua perdendo R$ 320 milhões, os municípios, R$ 260 milhões e, fora isso, Pernambuco perde do Imposto de Renda incidente de servidores públicos de R$ 226 milhões, isso dá R$ 806 milhões para o Estado. Não tem condição da União fazer reforma com Estado e município perdendo. Porque ela não baixa a contribuição sobre lucro líquido que não é compartilhada? Poderia baixar, desonerava os empresários e fazia seus cortes de gastos que ela não está sabendo fazer", afirmou o secretário estadual.

Reforma

Os deputados adiaram a análise das mudanças no Imposto de Renda. O texto, que faz parte do pacote da reforma tributária, trata da cobrança do tributo sobre lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a acionistas, diminuição do Imposto de Renda das empresas e cancelamento de alguns benefícios fiscais. É a segunda vez que a votação é adiada – o projeto já estava na pauta da última quinta-feira (12). Quem pediu o novo adiamento foi o líder da Minoria, deputado Marcelo Freixo (PSB-RJ). “Está atravancado este debate no Plenário, por isso faço um apelo. A gente pode avançar ainda sobre o texto”, disse.

O líder do governo, deputado Ricardo Barros (PP-PR), defendeu a medida. “O deputado Freixo propôs que ganhássemos um tempo para chegar ao entendimento. Temos divergências com esse texto, em especial em relação a eventuais perdas que estados e municípios tenham. Há muitos destaques que podem desvirtuar o equilíbrio do que foi garantido”, disse.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), voltou a falar que não haverá consenso sobre a reforma tributária por se tratar de um tema muito complexo. “Esse não é um assunto fácil: mexe com finanças, com tributos, com o sistema de taxação de grandes dividendos”, disse. Ele destacou pontos do projeto que considera centrais, como o sistema de taxação de grandes fortunas, dividendos e grandes empresas. “Vamos conseguir taxar dividendos, coisa que o Brasil nunca conseguiu. Nós estamos taxando fundos fechados, nós estamos fazendo um alinhamento de taxação de imóveis”, disse.

O relator do projeto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), também defendeu a proposta que, segundo ele, vai favorecer os mais pobres. “Para a ampla maioria dos brasileiros, haverá uma forte redução de carga para os pequenos, uma inversão. Então é o momento de nós refletirmos. Esse relator está 100% à disposição de cada um dos 513 deputados desta Casa, de todas as bancadas partidárias”, disse.

Ele reafirmou que não haverá consenso, mas maioria. “Sigo firme acreditando que estou construindo um texto que vai mudar a realidade tributária do País, reduzindo a carga tributária, e mudando a sua direção beneficiando aqueles que têm menor renda e taxando as altas rendas”, ressaltou. “Vamos continuar o nosso trabalho para aprimorar o texto. O consenso será muito difícil, há muitos lobbies trabalhando, mas vamos buscar a maioria”, disse Celso Sabino.

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