Apesar de certa instabilidade e troca de sinais ao longo da sessão, o dólar à vista caiu pelo sétimo pregão consecutivo nesta quinta-feira (24) dia marcado por relatos de fluxos estrangeiros para ativos domésticos e por nova rodada de valorização de divisas emergentes e de países exportadores de commodities ante a moeda americana.
Pela manhã, o dólar chegou até a romper o piso de R$ 4,80 e tocou no patamar de R$ 4,76, ao registrar mínima a R$ 4,7650 (-1,63%), com zeragem de posições no mercado futuro e possíveis aportes para a renda fixa local. O Tesouro Nacional vendeu no fim da manhã lote integral de NTN-F (R$ 415,8 milhões), o papel público preferido dos estrangeiros. Também foi colocada oferta integral de LTN (R$ 8,4 bilhões), títulos mais absorvidos por investidores domésticos, mas que podem também ter atraído capital externo.
Em meio a ajustes e movimentos de realização de lucros, a divisa operou pontualmente em terreno positivo no início da tarde, tendo alcançado máxima a R$ 4,8575 (+0,27%). Logo em seguida, contudo, voltou a cair e, após passar o restante do pregão orbitando R$ 4,82, fechou a R$ 4,8320, em baixa de 0,25% - o que levou as perdas acumuladas em março a 6,28%. A queda do dólar nesta quinta-feira foi em menor magnitude do que a observada nos pregões anteriores: -1,44% (dia 23), -0,59% (22) e -1,42% (dia 21).
O ritmo de apreciação do real teria sido limitado pela queda das cotações do petróleo, com o barril tipo brent abaixo de US$ 120. Houve também a sinalização do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em apresentação do Relatório Trimestral de Inflação (RTI), de que o ciclo de aperto monetário provavelmente se encerrará em maio, com alta da taxa Selic em 1 ponto porcentual, para 12,75% ao ano.
Tendo acumulado uma depreciação de 6,10% entre o fechamento do pregão do dia 15 e na quarta-feira, 23, era natural também que o movimento de baixa da moeda americana perdesse um pouco de fôlego, dizem analistas. O pano de fundo favorável ao real, contudo, ainda permanece: manutenção de commodities em patamares elevados, com o prolongamento da guerra na Ucrânia e as sanções do Ocidente à Rússia, e amplo diferencial entre juros internos e externos. Isso apesar da alta dos retornos dos Treasuries, diante da crescente expectativa de que o Federal Reserve vá acelerar o passo no processo de alta dos juros.
"Juro real forward de 2 anos nos EUA é negativo em 2,77%, e no Brasil é positivo em 5,80%. Deu para entender o tamanho do nosso carry?", pergunta o head da Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, em post no Twitter.
Há também relatos de migração de recursos de outros emergentes, inclusive a China, para o Brasil. Dados da B3 mostram que os investidores estrangeiros ingressaram com R$ 2,592 bilhões na bolsa na véspera, o que leva os aportes em maio a R$ 20,972 bilhões. No acumulado do ano, a entrada de capital externo soma R$ 83,593 bilhões.
"Os ativos no Brasil, em especial o câmbio e bolsa, continuam a se favorecer de um cenário de preço de commodities mais elevados e fuga de capitais dos emergentes do Leste Europeu, assim como do rebalanceamento das carteiras saindo de 'growth' para 'cíclicos'", afirma, em nota, o CIO da TAG Investimentos, Dan Kawa. "O Brasil está recebendo mais investimentos com essa quebra de negócios de países desenvolvidos com a Rússia. E com a Selic elevada, o investidor estrangeiro também busca ganhos reais com a renda fixa brasileira", diz Davi Lelis, sócio e especialista da Valor Investimentos.
Monitoramento diário de alta frequência do Instituto Internacional de Finanças (IIF) mostra que desde a invasão da Ucrânia, há um mês, a China tem registrado um nível "sem precedentes" de fuga de capitais, enquanto outros emergentes apresentam fluxo positivo. Em relatório, a instituição afirma que ainda é cedo para concluir se a guerra é responsável por esse movimento, mas que a dimensão das saídas é grande o suficiente para pelo menos levantar a possibilidade de que o conflito esteja levando investidores a encararem o mercado chinês "sob um novo olhar".
Reunidos em Bruxelas, líderes do G7 e da União Europeia anunciaram nesta quinta-feira iniciativa para coordenar ações conjuntas de sanções à Rússia. Comunicado do G7 divulgou à tarde acusou os russos de crimes de guerra na Ucrânia. Houve também ao alerta de que o grupo ficará atento à ajuda de outros países a Moscou. Em entrevista coletiva apões reuniões com líderes aliados, o presidente dos EUA, Joe Biden, defendeu a expulsão da Rússia do Grupo dos 20 (G20).
Em relatório, o banco Credit Suisse afirma que, a despeito do rali recente, o real ainda está subvalorizado e pode continuar a se apreciar. "O real apresentou a maior apreciação em relação ao dólar neste ano em um conjunto de 33 moedas. Esse desempenho, contudo, é apenas uma reversão da forte depreciação corrida nos últimos anos", afirma a economista-chefe do Credit Suisse, Solange Srour. "Alguns dos nossos modelos, baseado em diferencial de juros, de inflação, prêmio de risco e termos de troca, suportam a avaliação de que a moeda ainda tem espaço para se apreciar".
A mediana das projeções dos modelos do banco aponta para uma taxa de câmbio de R$ 4,50, com uma banda entre R$ 4,10 e R$ 4,80 Entre pontos favoráveis ao real, o Credit Suisse ressalta o fato de o diferencial entre as taxas de juros reais brasileira e americana estar perto de seu pico. Outro ponto relevante é a melhoria dos termos de troca, em razão dos preços elevados das commodities, que representam 70% das exportações brasileiras.