Os R$ 130 milhões que o governo de Pernambuco está pagando em auxílio emergencial para socorrer as vítimas das chuvas seria suficiente para concluir quase três das quatro barragens previstas para conter as cheias na Mata Sul do Estado.
O que está em discussão não é o fato de destinar os recursos para quem perdeu suas casas debaixo d'água, porque isso é inegociável e urgente. O que se questiona é como o desperdício de dinheiro público, em obras que se arrastam por uma década sem conclusão, resulta em prejuízo dobrado. Necessidade de gastar com ações paliativas, como o Auxílio Pernambuco, e de finalizar as barragens a um custo maior, diante de outro cenário econômico-financeiro e das estruturas que deterioraram.
Na histórica enchente da Mata Sul, em 2010, o então governador Eduardo Campos e o presidente Lula prometeram construir cinco barragens para conter as cheias nas bacias dos rios Una e Sirinhaém, que têm influência sobre 12 municípios e uma população de 200 mil habitantes. Das barragens de Gatos, em Lagoa dos Gatos; Barra de Guabiraba, no município de mesmo nome; Serro Azul, em Palmares; Panelas II, em Cupira e Igarapeba, em São Benedito do Sul; apenas a de Serro Azul foi concluída, em 2017.
De acordo com a Secretaria de Infraestrutura de Pernambuco (Seinfra), em função das crises econômicas, da falta de repasses do governo Federal e da necessidade de refazer projetos, deu-se prioridade à barragem de Serro Azul, que tem uma capacidade maior de acumular água e protegeria uma população maior do impacto das enchentes nos municípios de Palmares, Barreiros e Água Preta. As demais ficaram como megaobras, no meio do nada, em pequenos municípios.
Com os R$ 130 milhões do Auxílio Pernambuco daria para concluir as barragens de Panelas II (R$ 44,2 milhões), Gatos (R$ 37 milhões) e Igarapeba (R$ 55,1 milhões), faltando pouco mais de R$ 6 milhões.
A Seinfra explica que em abril e maio foram lançados editais para contratação das empresas responsáveis pelas obras de conclusão de Panelas II e Gatos. Para Igarapeba e Barra de Guabiraba, o governo de Pernambuco ainda está em processo de captação de recursos para finalizar as barragens.
Nesta segunda-feira (4), o governador Paulo Câmara assinou contratos com o Banco de Brasília e com o Banco do Brasil para conseguir empréstimos de R$ 600 milhões, destinados a projetos de infraestrutura. O governo ainda não detalhou qual será a destinação dos recursos.
Mais uma vez, o pequeno município de São Benedito do Sul sentiu a força da enxurrada. O Rio Pirangi encheu, invadiu a cidade e deixou de fora apenas os telhados de muitas casas.
Segundo dados da Agência de Águas e Climas de Pernambuco (Apac), nos quatro primeiros dias de julho choveu 161,3 milímetros. Desde 2010, quando foi prometida a Barragem de Igarapeba para conter as cheias, os moradores já enfrentam a terceira enchente (2017, 2018, 2020). Na tragédia de 2010, nos dias 17, 18 e 19 de junho choveu 250,5 mm.
A Barragem de Igarapeba tinha investimento total previsto em R$ 99,1 milhões e foram gastos mais da metade (R$ 55,1 milhões) para executar apenas 38% da construção. Com as constates enchentes e a deterioração da obra, o valor para concluir deve ficar acima dos R$ 44,1 milhões previstos, configurando mais um prejuízo aos cofres públicos e à população.
Desta vez, de acordo com a Apac, o município foi o mais atingido pelas chuvas na Mata Sul pernambucana. O governador sobrevoou a cidade no último sábado (2) e acompanhou o prefeito Júnior Amorim (Avante) na tentativa de contabilizar os prejuízos na cidade.
Paulo Câmara conversou com os moradores e depois anunciou a decisão de ampliar o Auxílio Pernambuco aos 24 municípios da Mata Sul e Agreste atingidos pelas cheias, mas sequer comentou sobre a conclusão da barragem, uma obra estrutural capaz de evitar um impacto tão devastador das chuvas sobre as cidades.
A Secretaria Estadual de Infraestrutura costuma comentar que a Barragem de Serro Azul foi fundamental para proteger e minimizar o impacto das enchentes na Mata Sul em 2017 e 2020. "Vale destacar que as chuvas em 2017 tiveram a mesma proporção de 2010, no entanto, a população foi mais protegida tendo em vista que menos municípios foram impactados", afirma, por meio de nota.
A declaração deixa claro que soluções estruturadoras são mais eficientes e baratas que as paliativas. Assim como o valor do Auxílio Pernambuco seria suficiente para concluir a obra de três barragens, também ajudaria a aplicar em intervenções nas áreas de risco e morros da Região Metropolitana do Recife (RMR).