Vitória de Biden colocará 'relação especial' Londres-Washington à prova

O Reino Unido vai-se separar da União Europeia (UE) no final do ano e, para compensar a perda de seu principal parceiro comercial, busca fechar acordos de livre-comércio com outros países
AFP
Publicado em 27/10/2020 às 10:06
Candidato a Presidência dos EUA, Joe Biden Foto: BRENDAN SMIALOWSKI/AFP


Em caso de vitória do democrata Joe Biden nas eleições americanas, a "relação especial" estabelecida entre o britânico Boris Johnson e Donald Trump poderá sofrer alterações - em um momento em que Londres precisa de mais amigos do que nunca.

O Reino Unido vai-se separar da União Europeia (UE) no final do ano e, para compensar a perda de seu principal parceiro comercial, busca fechar acordos de livre-comércio com outros países. O principal deles são os Estados Unidos, com quem vem negociando há algum tempo.

Os democratas já avisaram, porém, que tal tratado ficará sob risco, se a aplicação do Brexit por parte dos britânicos enfraquecer a paz na Irlanda do Norte. O acordo de paz foi firmado em 1998 ao final de três décadas de um sangrento confronto, com mediação dos Estados Unidos e de outros países.

"Não acho que Joe Biden se sinta particularmente efusivo com este governo britânico, e eles vão ter que trabalhar muito para mudar isso", disse no domingo à rede CNN o ex-ministro britânico das Finanças conservador George Osborne.

Em dezembro passado, quando Johnson se dirigia para uma vitória legislativa esmagadora, Biden o descreveu como um "clone físico e emocional" de Trump. Até o presidente americano elogiou o premiê britânico como "o Trump da Grã-Bretanha".

E a longa lista de comentários provocativos do popularmente conhecido como "BoJo" voltou a cobrar seu preço: Biden era vice-presidente quando Johnson escreveu em 2016 que Barack Obama era antibritânico por causa de sua herança "parcialmente queniana" e por sua "antipatia ancestral pelo Império Britânico".

Se Biden vencer a eleição presidencial, é provável que muitos ex-membros do governo Obama voltem à Casa Branca, com uma imagem negativa de Johnson.

Um deles, Ben Rhodes, ex-conselheiro de segurança nacional, comparou o britânico, recentemente no Twitter, a um Trump com "cabelo melhor" e QI mais alto.

Na opinião de Heather Conley, especialista do Center for Strategic and International Studies (CSIS), um "think tank" de Washington, se Biden for eleito, o primeiro-ministro britânico pode se adaptar rapidamente.

"Me consola que os populistas são camaleões: adotam a cor do momento político. Acredito que, se Biden ganhar, o tom de Johnson mudará drasticamente", disse à AFP.

Trump recebeu com satisfação a chegada a Downing Street, no ano passado, do "duro" e "inteligente" inglês nascido em Nova York. Johnson, por sua vez, elogiou as "muito boas qualidades" de Trump, em contraste com a desconfiança de outros líderes, como a chanceler alemã, Angela Merkel.

Em questões como mudança climática, Irã, Rússia, ou OTAN, o Reino Unido continua mais alinhado com seus parceiros europeus. E com o próprio Biden.

De acordo com Conley, "as questões relacionadas ao Brexit seriam tratadas de maneira muito diferente em um governo Biden, no que se refere ao entusiasmo pró-Brexit da administração Trump".

A negociação comercial entre os dois países atraiu a atenção dos democratas desde que Johnson apresentou uma legislação, em setembro, que revogaria unilateralmente o que foi acertado no Brexit sobre o futuro comércio entre a província britânica da Irlanda do Norte e a vizinha República da Irlanda, um membro da UE.

Biden, que fala apaixonadamente sobre suas raízes irlandesas, advertiu que o acordo comercial não veria a luz do dia, se Londres minasse o acordo de paz da Sexta-feira Santa de 1998. O pacto encerrou o confronto entre católicos republicanos e sindicalistas protestantes.

O governo britânico não quer tomar partido público nas eleições americanas de 3 de novembro, mas alguns conservadores não mostram tal reserva.

Sajid Javid, ex-ministro das finanças de Johnson, escreveu no jornal Daily Telegraph na semana passada sobre o discurso final de Ronald Reagan na convenção republicana de 1992, ano em que o britânico trabalhou como banqueiro em Nova York.

Segundo Javid, Reagan apelou para "as melhores esperanças, não os piores medos". Agora, "apenas um dos candidatos pode dizer o mesmo de forma confiável. O Reino Unido estará melhor com Biden", concluiu.

 

 

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