O ano de 2020 será, sem dúvida, um dos três mais quentes desde que há registros já que, desde janeiro, a temperatura média da Terra foi cerca de 1,2ºC superior ao período de referência 1850-1900 - alertou a Organização das Nações Unidas (ONU) nesta quarta-feira (2).
Com temperaturas batendo recordes todos os anos, a década de 2011-2020 será a mais quente já vista e, os últimos seis anos, desde 2015, os mais quentes já registrados, de acordo com o relatório climático anual da Organização Meteorológica Mundial (OMM).
"2020 foi, infelizmente, outro ano preocupante para o clima", disse o secretário-geral da OMM, Petteri Taalas.
A avaliação da OMM é baseada em cinco tipos de dados que atualmente classificam 2020 como o segundo ano com as temperaturas mais altas, atrás de 2016 e à frente de 2019. As diferenças de temperatura entre esses três anos são, no entanto, mínimas e a classificação pode mudar assim que os dados completos para 2020 estiverem disponíveis.
"Os recordes de calor tendem a coincidir com anos de fortes episódios de El Niño, como ocorreu em 2016. Já La Niña tende a esfriar as temperaturas globais, mas o significativo fenômeno La Niña deste ano não serviu para desacelerar o aquecimento", comentou Taalas. E, acrescentou, "apesar do La Niña, este ano aponta para um recorde, como em 2016".
Além disso, há uma probabilidade em cinco de que entre agora e 2024 o aumento da temperatura se situe temporariamente acima da barreira fatal de 1,5ºC em comparação com a era pré-industrial definida pelo Acordo de Paris.
Calor extremo, incêndios, inundações, acidificação dos oceanos, ou a temporada recorde de furacões no Atlântico são sinais de que as mudanças climáticas continuam inexoravelmente neste ano, "aumentando a instabilidade que a pandemia da covid-19 causa sobre a economia, saúde e segurança global", alerta a OMM.
O aumento de temperatura mais severo ocorreu no Norte da Ásia, especificamente no Ártico Siberiano, onde as temperaturas foram 5ºC mais altas do que a média.
Assim, em 20 de junho, um recorde de 38ºC foi registrado em Verkhoyansk, o que o situa provisoriamente na maior alta registrada ao norte do círculo polar ártico.
A temporada de incêndios, que afetou grandes áreas de Austrália, Sibéria, costa Sul e Oeste dos Estados Unidos e América do Sul, foi a mais violenta dos últimos 18 anos.
"As inundações em algumas regiões da África e do Sudeste Asiático causaram deslocamentos massivos de populações e aumentaram o risco de fome para milhões de pessoas", disse Taalas.
Somando-se às más notícias, o manto de gelo do mar Ártico atingiu seu nível mais baixo em setembro, o segundo menos extenso em 42 anos de observações por satélite.
A extensão do gelo marinho da Antártica em 2020 foi semelhante, ou um pouco maior do que a média dos últimos 42 anos, enquanto a Groenlândia continuou a perder massa, mas a uma taxa mais lenta do que em 2019.
Quanto aos oceanos, que armazenam 90% do excedente de energia acumulado no sistema climático, devido ao aumento da concentração de gases causadores do efeito estufa, o relatório aponta que, nos últimos anos, o calor tem sido absorvido cada vez mais rápido.
Um terço dos 252 espaços naturais incluídos na lista do patrimônio mundial da Unesco está ameaçado pelas mudanças climáticas - alerta um novo relatório da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN).
No total, 94 monumentos naturais, 32 a mais que no último relatório apresentado pela UICN em 2017, estão em risco significativo, ou crítico, devido a fatores como turismo, caça, incêndios, ou poluição das águas.
Segundo a UICN, órgão que reúne mais de 1.400 organizações e governos, as espécies invasoras e exógenas não são mais a maior ameaça a esses sítios naturais excepcionais, mas as mudanças climáticas.
Um dos locais que acaba de entrar na lista é a Grande Barreira de Corais da Austrália, a maior estrutura do planeta criada por organismos vivos, que está em risco de acidificação e aquecimento dos oceanos.
O relatório também inclui várias áreas protegidas do Golfo da Califórnia, no México.
Cerca de 7% desses espaços estão em situação crítica, ou seja, "requerem medidas adicionais urgentes e de conservação em larga escala" para serem preservados, e um terço do total está em risco significativo.
As mudanças climáticas representam uma ameaça elevada, ou muito elevada, para 83 desses monumentos naturais.
Segundo o diretor-geral da UICN, Bruno Oberlé, o relatório "revela as transformações causadas pelas mudanças climáticas nessas áreas naturais protegidas, desde o degelo de geleiras, ou branqueamento de corais, a incêndios e secas que estão-se tornando mais frequentes e sérios".
Por exemplo, as chamas que atualmente devastam a Ilha Fraser, na Austrália, inscrita no Patrimônio Mundial.
O relatório também lamenta que o Pantanal brasileiro tenha sido severamente afetado por incêndios sem precedentes entre 2019 e 2020.
"O documento enfatiza o quão urgente é encontrar uma solução conjunta e abrangente para os desafios ambientais do planeta", acrescenta Oberlé.
O relatório também aborda o exemplo dado pela pandemia da covid-19, que mostrou a necessidade de a comunidade internacional "permanecer unida e trabalhar para o bem comum".
As investigações do relatório da UICN começaram antes da pandemia da covid-19 (que afeta todo planeta de forma mais ou menos intensa), mas a organização incluiu uma análise sistemática do efeito da crise sanitária em áreas naturais protegidas pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
A UICN considera que a pandemia e as restrições que a acompanham tiveram um impacto positivo, ou negativo, em 50 deles.
Entre os aspectos positivos, "o mais notável é a diminuição da pressão dos turistas sobre esses ecossistemas naturais", explica a entidade. Mas "os aspectos negativos são inúmeros", ressalta a UICN.
As restrições de viagens ocasionaram uma queda significativa na receita desses locais, e as medidas de prevenção de contágio afetaram o pessoal encarregado de fiscalizá-los, o que deixou a porta aberta para o desenvolvimento de atividades ilegais.
"Esses fatores aumentam o risco de caça ilegal de espécies silvestres e o uso ilegal de recursos naturais", explica o relatório.
Apesar de todas as ameaças enfrentadas por esses monumentos naturais, a UICN também destaca que oito desses locais melhoraram seu estado de conservação desde seu relatório de 2017.