ARTIGO

Adolescentes em sistemas "socioeducativos"

Jovens e adolescentes privados de liberdade e cumprindo penas em sistemas 'socioeducativos' precisam que seus comportamentos "antissociais" sejam avaliados à luz das teorias críticas da sociedade, das teorias psicológicas que estudam a relação entre privação e delinquência e, ainda mais, que os projetos político-pedagógicos que orientam e fundam as suas ações institucionais possam ser também avaliados pelos níveis de desenvolvimento moral que proporcionam aos seus internos". Leia o artigo de Flávio Brayner

Cadastrado por

FLÁVIO BRAYNER

Publicado em 07/12/2021 às 6:06
. - MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL

Jovens e adolescentes privados de liberdade e cumprindo penas em sistemas "socioeducativos" precisam que seus comportamentos "antissociais" sejam avaliados à luz das teorias críticas da sociedade, das teorias psicológicas que estudam a relação entre privação e delinquência e, ainda mais, que os projetos político-pedagógicos que orientam e fundam as suas ações institucionais possam ser também avaliados pelos níveis de desenvolvimento moral que proporcionam aos seus internos. É isto o que o pequeno-grande livro do Professor Anderson Menezes (UFAL), "ENSAIOS SOBRE DILEMAS E SENTIMENTOS MORAIS NA CONTEMPORANEIDADE", faz!

"Pequeno" no formato e no número de páginas, mas "grande" em três aspectos: a artilharia teórica que mobiliza; a profundidade e a originalidade analítica; a sensibilidade e a grandeza para tratar um tema adverso, espinhoso e sobre o qual nós, de ordinário, desviamos o olhar para o outro lado! Em geral, quando tratamos destas instituições o fazemos à luz de duas injunções: a "social", quer dizer, se a punição -privação de liberdade- é suficiente para "purgar" o crime e proteger a sociedade e, segundo, se a "educação" prisional é capaz de "ressocializar" o apenado. Alguns estudos mostram que o crime socializa, ou seja, já que as instituições socializantes não foram capazes de cumprir seu papel, o crime ocupa este espaço oferecendo "integração", sentimento de pertença, recursos imediatos, "reconhecimento" entre os pares e acesso a bens de consumo (ver tese de Francisco Carlos F. Mendes. UFPE, 2011)

O trabalho do professor Anderson aborda o tema por um ângulo inusitado. Partindo do que ele mesmo autodenomina "uma sensibilidade salesiana" (o Dom Bosco solidário aos jovens e adolescentes abandonados), o professor da UFAL reúne a teoria crítica, sobretudo o grande ensaio de Axel Honneth sobre o Reconhecimento (respeito como experiência ética), o diálogo entre Habermas e Kohlberg sobre os dilemas e julgamentos morais e, numa das passagens mais tocantes deste livro, a reflexão de Winnicott sobre os jovens privados de liberdade (na verdade, privados de afeto, de dignidade e de reconhecimento desde a infância) e suas condutas "antissociais".

Como disse, Anderson é movido por uma sensibilidade "salesiana", em que reside uma cota inesgotável de crença de que as instituições que tratam com crianças e adolescentes possam cumprir um outro desiderato: uma vida digna, respeitada, reconhecida e estimada. Fica, ao fim da leitura, uma chama de esperançosa humanidade.

Flávio Brayner, é Professsor Titular da UFPE

 

*Os artigos são de responsabilidade do autor e não refletem necessariamente a opinião do JC

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