Há décadas um tema vai e vem no debate político nacional: a reforma tributária, que finalmente pode sair do papel nos próximos meses a depender da disposição do Congresso Nacional. É evidente que o Brasil precisa modernizar seu sistema de cobrança de impostos e arrecadação, fundamental para balizar investimentos e melhorar a prestação do serviço público. O saneamento, como setor fundamental para o desenvolvimento econômico e melhoria da qualidade de vida da população, não poderia ficar de fora das discussões.
No texto original da PEC 45/2019 que propõe a reforma, o saneamento teria a tributação aumentada. Atualmente o setor paga apenas o PIS/Cofins, com alíquota de 9,25% e é isento de ICMS. Com a adoção do IBS (Imposto sobre Bens e Serviços, que unifica ICMS, ISS e extingue IPI, PIS/Cofins), a alíquota saltaria para um índice entre 25% e 27% e poderia representar um reajuste de até 18% nas contas de água e esgoto que chegam mensalmente nas casas dos consumidores de todo o país.
O ajuste proposto inicialmente tornaria ainda mais difícil alcançarmos a universalização do serviço no Brasil. Com impostos mais elevados, o custo do saneamento aumenta ao passo que diminui a capacidade de investimento das empresas concessionárias do setor e incide na conta final que é repassada para o consumidor. Pagaríamos mais por um serviço mais caro e para companhias enfrentando mais dificuldades. Há, ainda, o risco de o país ir na contramão da agenda ambiental ao estimular a proliferação de depósitos clandestinos de resíduos sólidos.
A emenda apresentada senador Eduardo Gomes (PL/TO) e acolhida pelo relator senador Eduardo Braga (MDB/AM) inclui o setor no regime diferenciado, equiparando-o aos serviços de saúde e neutralizando reajustes. Um passo importante que posiciona o setor no rol dos serviços essenciais, mas que ainda precisa ser defendido em votação do Senado e mantido após revisão na Câmara dos Deputados.
Em um país onde 44% da sua população não tem acesso a saneamento e 15% não contam com acesso a água tratada, não se pode conceber a construção de qualquer barreira que possa dificultar o trabalho em busca da universalização destes direitos básicos. O prazo colocado pela ONU dentro dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estabelece 2030 como data crucial para alcançarmos a meta e não podemos dar margem para retrocessos.
A saúde do Brasil depende de mais investimentos em saneamento. Visto como ação preventiva, o estímulo ao setor é crucial para que nossa população usufrua de um meio ambiente mais saudável e tenha melhores condições de habitabilidade, o que se reflete em curto prazo em desafogo do sistema de atenção básica, economia de recursos públicos e traz como consequência posterior mais desenvolvimento e qualidade de vida.
Lideranças do nosso país devem reforçar o pacto pelo saneamento e buscar soluções que estimulem mais investimentos e melhorem a qualidade do serviço prestado. A aprovação da reforma tributária com a emenda proposta é crucial para permitir que o trabalho continue avançando e seja ampliado. Não podemos pensar em onerar o serviço. Não há tempo para qualquer retrocesso.
Tomé Franca, mestre em Gestão Pública pela UFPE e Secretário de Saneamento do Recife