A disputa retórica entre o Banco Central (BC), cujo presidente vem da gestão anterior, e o presidente Lula e sua equipe econômica, liderada pelo ministro Fernando Haddad, é mais uma queda-de-braço política do que confronto de argumentos técnicos. Ambos os lados sabem que a queda dos juros não se dá por obra e graça da direção do BC, muito menos pela vontade ou generosidade de um presidente da República. É a realidade, com suas complexidades influenciadas por fatores globais e nacionais, que configura o patamar funcional dos juros em um país.
A redução foi maior do que se esperava no mercado, que já dava como certo um corte mínimo para conter, ou amenizar, as críticas que vêm do Planalto desde que Lula assumiu. No entanto, para efeito prático, sair de 13,75% para 13,25% depois de um ano mantida no mesmo patamar, pouca diferença faz para a economia real. Se não deixa de ser uma amostra de baixa, as consequências de médio e longo prazos somente serão perceptíveis caso o corte de agora represente o primeiro de uma tendência sustentada por novas reduções, ao longo dos próximos meses e anos. Desde que a conjuntura colabore, claro, pois não é do voluntarismo de Roberto Campos Neto, nem do desejo de Lula, que se trata.
A reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC na última quarta-feira sinalizou para cortes sucessivos nas próximas reuniões. O que pode significar um avanço no sentido que vem sendo pregado pela equipe econômica, na busca de um ambiente de negócios mais favorável ao crescimento econômico, desafogando o laço dos juros. Por outro lado, a intenção declarada continua tendo que atravessar o horizonte da realidade, num cenário global de incerteza dominante. Para Campos Neto e o BC, a afirmação de uma disposição de redução poderá ser facilmente revertida, caso os fundamentos econômicos demonstrem fragilidade para essa rota na política monetária.
É importante que os juros caiam, tanto para estimular a economia, quanto para aliviar o nível de endividamento enorme dos brasileiros. Mantido o panorama favorável, de acordo com o anúncio prévio dos cortes a seguir, a Selic pode chegar ao fim deste ano abaixo de 12% - o que ainda está alto, mas o viés de queda tende a recompor fatos e expectativas do mercado. Para o ano que vem, de foco político nas eleições municipais, a observação da inflação será crucial para a definição do ritmo na baixa dos juros, cuja velocidade, repita-se, não deve ser o bastante para repercutir de maneira imediata nas relações econômicas da maioria da população brasileira.
Do ponto de vista da exploração política dos juros altos como fonte de todos os problemas da economia, o governo Lula dispõe de pouco tempo para insistir nessa tecla. Os cortes seguidos atendem ao governo, sem significarem a solução mágica para os males do país.