O endereço já foi invadido, assaltado e deixado ao léu por vários anos. Esta semana, o Movimento Casarão de Mulheres resolveu ocupar a casa que já foi residência de um dos maiores nomes da cultura pernambucana, o compositor Capiba, localizada no bairro do Espinheiro. Através da Companhia Estadual de Habitação e Obras (Cehab), o governo de Pernambuco conseguiu chegar a um acordo para a desocupação pacífica. Como o imóvel pertence ao governo e se encontra há muito tempo sem uso, o movimento aproveitou o longa de ixa para realizar suas legítimas demandas por um lugar de moradia. E lançou luz, mais uma vez, para o abandono que reflete o descaso do poder público – de todas as esferas – com o patrimônio cultural simbolizado naquele endereço.
Para além do déficit habitacional, que representa outro problema histórico acumulado por décadas de resposta inadequada dos governos, o cenário da ocupação mostrou, mais uma vez, para a população pernambucana, o valor conferido a um dos maiores ícones de nossa música popular, recordado todos os anos, especialmente durante o Carnaval. A casa foi desapropriada em 2017, e desde então se espera sua utilização digna como um museu que resgate a vida e a obra de Capiba. A exemplos de outras casas-museus em funcionamento no mundo, e mesmo no Brasil. Nem a preservação, nem a conservação do imóvel, e muito menos da memó ria artística, conforme se afirma no decreto de desapropriação, são observados, sete anos depois.
A deterioração é vista por todo o terreno, que se transformou em depósito de lixo. Tamanho descaso em bairro nobre chamou a atenção do movimento integrado por famílias desabrigadas, cuja liderança, Ivani Oliveira, declarou: “Não existe nenhum planejamento para este terreno”. Planos devem existir, desde a desapropriação. O que falta é ação consequente para a valorização da cultura pernambucana. A desvalorização flagrante envergonha os cidadãos, e agride a memória de Capiba. Na nota imediatamente divulgada pela Cehab, ao tomar conhecimento da ocupação, a referência oficial é ; a um imóvel que “não tem direcionamento para destinação habitacional”. E ponto. O fato de estar abandonado e não cumprir qualquer outra destinação não foi objeto de consideração.
Como o JC já relatou em ocasiões anteriores, inclusive esta semana, após a ocupação, a casa foi anunciada para uso turístico em 2021, com a promessa de projetos de reforma para tanto. Mas o número 369 da Rua Barão de Itamaracá, construída pelo compositor em 1948, não viu esses planos – nem outros, posteriores – saírem do papel. Enquanto estava alugado para uma empresa de consultoria, antes da desapropriação, o imóvel servia de memorial, com recordações de Capiba espalhadas pelos cômodos. Era de se esperar que o governo do Estado, uma vez assumindo o espaço, não demoraria a cumprir a promessa, aprove itando a oportunidade para exaltar o frevo e um de seus grandes nomes no coração da capital. Infelizmente não foi o que aconteceu – até hoje.