Quando avistou a equipe de reportagem do JC, na manhã desta terça-feira (31), Izete Bandeira da Silva, de 52 anos, não segurou o choro. Moradora de Muribeca, em Jaboatão dos Guararapes, só salvou sua vida, a do marido doente e uma televisão que não começou a pagar ainda. Ela é uma das 91.900 pessoas desalojadas no município, o que mais sofreu com as chuvas nos últimos dias em Pernambuco. Só em Jaboatão, choveu 260 milímetros entre a sexta-feira (27) e o sábado (28), o maior índice pluviométrico em 30 anos na cidade.
O número de desalojados é um dado inédito desde que as chuvas se intensificaram em Pernambuco a partir da sexta-feira. A Defesa Civil do Estado (Codecipe) só vinha contabilizando o número de pessoas desabrigadas, que chegaram a um total de 6.198 até a manhã desta terça-feira. Os desalojados são aquelas pessoas que foram atingidas pelas chuvas, perderam pertences, mas podem retornar a suas moradias depois que a crise passar. Em Jaboatão, o número de pessoas desalojadas é de 13% da população da cidade.
"A única coisa que eu não perdi foi a televisão. Eu e meu esposo ficamos dormindo em um colchão molhado, porque minha irmã arranjou um saco para poder botar os lençóis. A gente não tem água, a única que temos é que estão dando para beber. A gente nunca viu essa enchente invadir isso aqui não", contou Izete à reportagem.
Ela está há dois sem trabalhar, porque ainda não tem água em casa. Nesta terça-feira, ao meio-dia, ela tinha retornado de uma fila do cadastro da Prefeitura. "A água que a gente está ganhando é isso, esperando de noite uma janta para a gente jantar. Um cuscuz com salsichinha. A gente construiu tanto, com tanto trabalho, porque eu trabalho desde os 10 anos de idade. Nunca tive coisa fácil e vem uma coisa dessas e derruba a gente. Aparece cobra, aparece jacaré", explica.
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A estudante de educação física Alba Arantes acabou de fazer 45 anos. Mora em Muribeca há um menos de um, justamente no período em que se separou do marido, com o filho de 16 anos. Por conta do desemprego na pandemia, estava morando em uma casa cedida por uma amiga. "Nessas coisas de pandemia, eu fiquei desempregada. Mas vendendo uma coisa ou outra, dava para comprar as coisas. No mesmo tempo que me desempreguei, eu me separei. Aí vim para cá por causa da separação. Mas com fé em deus a gente consegue de volta", explica.
O filho dela está na casa da avó, em Cajueiro Seco, por causa da escola. "Isso a gente tem que manter", diz a estudante. Mas ela continua continua dormindo na residência, em meio aos entulhos, por causa de um estágio. Alba só falta finalizar o TCC para se formar em educação física e estagia numa academia próxima. Durante os dias de estágio, larga às 22h, e fica distante para ela dormir na casa da mãe. Improvisa a dormida numa rede.
"Aí eu largo às 22h. Pronto, quando eu trabalho, eu durmo na rede. Só entregar o TCC, só isso, e me formo. Eu vou comprar umas telhas e pedir para um amigo me ajudar com o telhado. Eu destelhei essa casa há pouco tempo. Mas eu acredito que é só uma fase. Eu fiz o cadastro na Igreja Batista, pela prefeitura, para receber coisas emergenciais", conta Alba.
Marcos Freire
O desemprego também atinge outras mulheres que sustentam suas casas. Uma delas é Lindinalva Valdomiro, de 45 anos, que mora om três filhos e tira o sustento a partir do auxílio Brasil. É uma das primeiras da vizinhança a voltar para casa. "Eu moro aqui há 18 anos. Nunca tinha passado por essa situação. Eu perdi colchão, geladeira... meu filho, estou voltando porque a gente sabe que tem que voltar, né? Morava com meus três filhos dentro de casa, vieram para cá (na igreja) no sábado de manhã", disse ela, que teve doações de roupas e alimentos.
No meio da entrevista, ela não segura as lágrimas. Um filme passa pela sua cabeça quando tem que retornar à casa depois de três dias. "A sensação que eu tenho é de medo. Quando eu vejo minha casa fico com medo quando a chuva vier. Não sei como vou recuperar as coisas. A pessoa já está desempregada, vive do auxílio do governo, que você já sabe quanto é. R$ 400. Precisamos comprar comida, pagar luz, comprar bojão. O que importa é que estamos com saúde", afirma Lindinalva.