O que faz um político 'rebelde' continuar no partido?

Vistos como "rebeldes", por terem pensamentos e opiniões divergentes de seus partidos, nem todos os parlamentares chegam ao ponto de saírem das legendas em busca de outros espaços, mas o tensionamento das relações são inevitáveis
Mirella Araújo
Luisa Farias
Publicado em 22/01/2021 às 20:33
O deputado federal pernambucano Túlio Gadêlha (PDT) Foto: VINICIUS LOURES/CÂMARA DOS DEPUTADOS


“Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”, dizia o escritor e jornalista Nelson Rodrigues. No cenário político brasileiro, onde somos representados por 33 partidos, conforme registros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), certamente não deve existir o mesmo número de correntes ideológicas e pragmáticas distintas, muito menos uma unanimidade na defesa dos ideais por aqueles que os representam.

Vistos como “rebeldes”, por terem pensamentos e opiniões divergentes de seus partidos, nem todos os parlamentares chegam ao ponto de saírem das legendas em busca de outros espaços, mas o tensionamento das relações são inevitáveis. Há casos recentes como o do deputado federal Túlio Gadêlha (PDT), rifado pelo seu partido na disputa pela Prefeitura do Recife e que acabou destituído do comando municipal, por manter sua candidatura. Há também o deputado federal Felipe Carreras (PSB) que mesmo após sofrer punição por ter votado contra uma decisão do partido sobre a Reforma da Previdência, continua expondo posicionamentos que julga serem incoerentes por parte da legenda.

O cientista político e professor da Faculdade Damas, Elton Gomes, explica que é preciso entender que, no Brasil, há o “fenômeno de personalismo na vida pública, entre os eleitores e seus incumbentes”. “Eles votam nos sujeitos e não nas legendas e nas coligações. É um voto personalista”, afirmou.

O que de certa forma abre a margem para que os que possuem mandato possam ter mais autonomia diante dos direcionamentos partidários. Para Elton, em toda briga política, o resultado será político. “Nessa disputa constante, os políticos fazem para testarem seu nível de força. Ou eles tomam a direção do partido ou eles ficam fortes na legenda. Mesmo que não fiquem como dirigentes de direito, mas de fato”, exemplifica o docente.

A cientista política e professora da Faculdade de Ciências Humanas de Olinda (Facho) Priscila Lapa vislumbra uma série de elementos que entram no cálculo dos atores políticos para escolher um partido. O objetivo é otimizar os ganhos e minimiza as perdas para obter os melhores resultados políticos, não apenas eleitorais, mas de formação de base, relação com a sociedade e até mesmo status.

Priscila aponta como o primeiro recorte dado para definir a entrada em uma legenda o fator ideológico. Mas essa necessidade de convergência de agendas esbarra no cenário de identidade difuso dos partidos brasileiros, causado em boa parte pelo número alto de legendas. "É um sintoma característico de uma identidade muito tênue de que os partidos não não priorizam a questão ideológica, de definir uma visão de mundo que possa alicerçar a agenda partidária", diz. "O nosso modelo de sistema político gera uma competição intrapartidária que faz com que as pessoas, para terem mais espaço, elas buscam outras legendas ou buscam ter a sua própria legenda", completa. 

Há momentos em que o tensionamento chega a um limite que impõe ao filiado fazer o cálculo de que não é mais possível permanecer no partido. Foi o que aconteceu com o ex-senador Armando Monteiro Neto, que anunciou sua desfiliação do PTB em novembro de 2020, depois de 17 anos no partido. 

Ele já tinha ido de encontro a posicionamentos do partido no passado. Sob a presidência do deputado federal Roberto Jeferson, o PTB votou a favor do impeachment de Dilma Roussef em 2016. Ex-ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior de Dilma, Armando votou contra a abertura do processo contra a presidente. Na eleição de 2018, o PTB apoiou o então candidato a Presidência da República Jair Bolsonaro (sem partido) e, depois que ele foi eleito, tornou-se um dos partidos de sustentação do seu governo.

>> ''Eu não terei alinhamento com nenhum partido bolsonarista", diz Armando Monteiro sobre futuro partidário 

"Durante 17 anos, o nosso grupo político esteve a frente do partido, houve momentos em que exerci a presidência, e nos últimos anos ela era exercida pelo companheiro Zé Humberto, quando percebemos nos últimos anos que o partido estava tomando um rumo diferente a nível nacional", afirmou. 

O estopim para a saída, contudo, foi o apoio de Armando à candidatura de Marília Arraes (PT) no segundo turno da eleição do Recife de 2020. Em resposta, Jeferson destituiu o então presidente estadual do PTB, José Humberto Cavalcanti, aliado de primeira hora de Armando, e nomeou em seu lugar o Coronel Meira. O motivo foi uma resolução aprovada pelo PTB proibindo alianças com PT, PSOL, PDT, PCdoB, REDE, PSB, PCB, PSTU e PCO. Atritos semelhantes ocorreram entre Jeferson e os dirigentes do partido em outros estados, como São Paulo e Paraná. 

"Na vida pública e pessoal existem divergências e momentos de convergência, isso é natural de que aconteça. Desconfie de quem não diverge, porque os partidos não são rebanhos que se pode tanger em uma direção. Agora, há momentos em que você já não tem ambiente e portanto tem que tomar o seu caminho", resumiu Armado sobre a sua decisão de sair do PTB. 

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