Legislativo

Mais um capítulo na polêmica da mudança do nome de ruas e avenidas do Recife

Uma audiência pública foi realizada em meio à discussão sobre propostas de mudanças em nomes de ruas tradicionais feitas por vereadores da Casa José Mariano

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Luisa Farias

Publicado em 11/06/2021 às 11:38 | Atualizado em 14/06/2021 às 7:03
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A Câmara Municipal do Recife promoveu na quinta-feira (10) uma audiência pública para discutir sobre a denominação de logradouros públicos na capital pernambucana, em meio à discussão sobre propostas de mudanças em nomes de ruas tradicionais feitas por vereadores da Casa José Mariano. 

A audiência foi proposta pelo vereador Tadeu Calheiros (Podemos) e contou com a participação de representantes de entidades como o Instituto Arqueológico, Histórico e Geográfico Pernambucano (IAHGP), a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Secretaria de Cultura do Recife, Instituto Histórico, Arqueológico e Geográfico de Goiana, arquitetos e jornalistas. 

Um dos projetos relacionados ao tema que tramita na Câmara é o Projeto de Lei Ordinária nº 43/2021, de autoria de Cida Pedrosa (PCdoB), que propõe a mudança da Rua Sete de Setembro, no bairro da Boa Vista, área central do Recife, para Rua Livreiro Tarcísio Pereira, dono da famosa livraria Livro 7, localizada naquela via, que faleceu em janeiro de 2021. Ele aguarda parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). 

O vereador Fabiano Ferraz (Avante) quis homenagear para o cantor Augusto César, falecido aos 61 no dia 20 de abril de 2021, por complicações da covid-19. Ele propôs a mudança da Rua Nova, no bairro de Santo Antônio, área central do Recife, que liga a Praça da Independência à Ponte da Boa Vista, para a "Rua Nova Cantor Augusto César".

A denominação está prevista no PLO nº 141/2021. O parlamentar escolheu o local pelo fato do cantor ter vendido por muitos anos os seus CDs nas ruas do Centro do Recife, sempre acompanhado de um microfone e uma caixa de som cantando os seus sucessos. 

Já o PLO nº 142/2021 que acabou sendo retirado de pauta pelo autor Marco Aurélio Filho (PRTB), pedia a mudança da Rua Engenheiro Moacyr Parahyba, na Iputinga, Zona Oeste do Recife, para a "Rua Cantor Augusto César". Ele está no prazo para apresentação de emendas. 

O PLO nº 135/2020, de autoria do líder do governo João Campos (PSB), Samuel Salazar (MDB), alterou para "Avenida Beira Rio Governador Eduardo Campos" o trecho da Avenida Beira Rio entre o final da Rua Heitor Maia Filho e o cruzamento com a Rua Conde de Irajá, no bairro da Torre, Zona Oeste do Recife. 

Discussão

Na abertura da audiência, Tadeu Calheiros reforçou que era a favor da preservação da nomenclatura das ruas. "O meu posicionamento quanto à manutenção dos nomes das ruas tradicionais é conservador. Elas trazem consigo uma grande história. Tem toda uma parte cultural nos nomes das nossas ruas. Depois de ter levantado esse tema e conseguir me aprofundar sobre outras histórias que nem conhecia, fiquei mais encantado ainda", disse. 

O presidente da Comissão de História do IAHGP, Carlos Bezerra citou a Lei Municipal nº 1223 de 1951, que determina "os nomes de avenidas, praças, ruas, travessas e demais logradouros públicos, já consagrados pelo uso do povo devem ser mantidos", e se possível, até restaurados, a partir de consultta ao IAHGP. 

"As ruas tinham um nome pitoresco: rua da Alegria, rua da União. Começaram a mudar os nomes de rua, mas a tendência é conservar. Tudo tem um sentido e quebrar isso é quebrar o elo historiográfico, a tradição", disse Carlos Bezerra. 

O professor da UFPE, George Cabral, defendeu a preservação dos nomes das ruas como um elemento da identidade cultural. Ele e Carlos Bezerra representaram a presidente do IAHGP, Margarida Cantarelli. 

“É muito importante que a gente tenha atenção ao fato de que a identidade de uma cidade passa por esses marcos memoriais. Passa por essa relação que a população tem com as suas ruas. Quem vive ou transita pelo Recife sempre tem uma história de uma rua para contar. Esse grande conjunto de memória coletiva é o que faz de uma denominação algo tradicional", explicou. 

O historiador Dirceu Marroquim, que representou a Secretaria de Cultura do Recife, mostrou-se disponível para ajudar na preservação da cultura da capital pernambucana. 

"A Secretaria de Cultura não tem prerrogativas sobre o patrimônio cultural da cidade do Recife. Isso está a cargo de outra secretaria, mas estamos atentos a todos os debates que são realizados em torno da história e da memória. O debate sobre as ruas do Recife congrega, em nomes, grande parte dos ícones que representam o passado e a cultura da nossa cidade", afirmou. 

O sócio do Instituto Histórico, Arqueológico e Geográfico de Goiana, Giogio Paulo Pereira alertou para a ameaça histórica ao se abrir mão dos nomes tradicionais das vias. "Precisamos ter cuidado para não perdermos nossas raízes, nossas histórias. Rua Nova, rua do Sol, rua da Aurora, rua das Ninfas – são ruas que têm uma tradição ligada à história de Pernambuco. E pessoas viveram e deram suas vidas por essa história", disse. 

Giogio se diz contra inclusive a modificações que não alteram totalmente os nomes das vias, mas acrescentam o nome de alguma personalidade. "Quem acrescenta, muda, sim, alguma coisa. E que custos a cidade vai ter com essa mudança de endereçamento postal, por exemplo? E com a perda da identidade? O novo precisa estar presente, mas não podemos perder essa identidade. Se a homenagem precisa ser feita, que seja feita com coisas novas", considerou. 

A arquiteta e urbanista Priscila Neri, foi na mesma linha de Giogo ao recomendar as homenagens apenas nos nomes de logradouros ainda sem nome. "Fico preocupada com o futuro de uma sociedade que não respeita a tradição, a história e a identidade. Mudar um nome de um lugar tem tanto para dar certo quanto mudar o nome de uma pessoa que se chamava João e agora se chama Paulo. Ninguém adere, só serve para embaralhar e causar encargos para a sociedade, tudo por conveniência política, pela perpetuação de uma classe política ou família”, exemplificou. “E não vejo como homenagem fazer acréscimos a nomes de ruas que são consagradas. O Recife tem mais de mil vias sem denominações", disse. 

Encaminhamentos

Os participantes da audiência fizeram sugestões sobre o tema, como a notificação ao IAHGP quando um projeto de lei sobre mudança de nomes de vias do município forem protocolados na Câmara do Recife, para que o instituto dê um parecer sobre o pedido por meio de ofício. 

Tadeu Calheiros informou que pretende apresentar um projeto de lei que proteja os nomes de ruas tradicionais, ao proibir, por exemplo, que nomes com mais de 50 anos sejam mudados. A minuta do projeto foi enviada para a análise do IAGHP. 

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