Anielle Franco sobre importunação sexual: "Fiquei sem dormir várias noites"

Ministra Anielle detalhou pela primeira vez, em entrevista à Veja, o caso de importunação envolvendo o ex-ministro Silvio Almeida

Publicado em 04/10/2024 às 10:26

Após o caso se tornar público, a ministra de Igualdade Racial do Brasil, Anielle Franco, falou com mais detalhes pela primeira vez sobre o assédio que sofreu pelo ex-ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida.

Anielle disse que por cerca de 2 anos foi vítima de importunação sexual e assédio. Comentários sexistas, toques não consentidos e frases fora de contexto, com segundas intenções, marcaram algumas das situações vividas pela ministra.

Horas após prestar seu depoimento à Polícia Federal, que investiga o caso, Anielle concedeu uma entrevista à Revista Veja, na qual detalhou os momentos de incerteza e angústia na convivência com o ex-ministro.

O que Anielle disse?

Perguntada sobre seu sentimento de falar abertamente sobre o caso de assédio, Anielle diz que vai ser sempre difícil falar abertamente e com detalhes sobre. "É muito difícil falar sobre isso… Ninguém se sente à vontade pra relatar uma violência. E, nesse caso, a gente está falando de um conjunto de atos inadequados e violentos que aconteceram sem consentimento e reciprocidade e que, infelizmente, mulheres do mundo inteiro vivenciam diariamente. Mas é importante deixar claro que o que houve foi um crime de importunação sexual. Fui vítima de importunação sexual", afirmou. 

A ministra afirmou não querer entrar em detalhes do que aconteceu, prefere preservar as investigações. "Apesar da dor, da violência e da decepção, falei todo o necessário nas instâncias devidas, conforme me comprometi a fazer. Publicamente não quero entrar em detalhes, para preservar as investigações em curso e também porque não quero repetir, repetir e repetir a violência. Traumas não são entretenimento", frisou. 

Relação com Silvio Almeida 

Questionada sobre sua relação com Sílvio Almeida, afirmou à VEJA que só o conhecia pela trajetória acadêmica e que não tinha nenhuma relação profissional antes da transição do governo Lula, em dezembro de 2022. 

"Ali começaram as atitudes inconvenientes, que foram aumentando ao longo dos meses até chegar à importunação sexual. Por um tempo, quis acreditar que estava enganada, que não era real, até entender e cair a ficha sobre o que estava acontecendo", disse. 

"Fiquei sem dormir várias noites. Eu só queria trabalhar, focar na missão, no propósito e em toda a responsabilidade que se tem quando se assume um cargo como o meu. Mas não conseguia.", completou Anielle. 

Entenda o caso 

No início de setembro, o ministro dos Direitos Humanos do governo Lula, Silvio Almeida foi denunciado à organização Me Too Brasil por suposta prática de assédio contra várias mulheres, inclusive a ministra da Igualdade Racial Anielle Franco.

De acordo com o portal Metrópoles, que entrou em contato com a associação que atende mulheres vítimas de assédio, foram relatados vários casos pelas vítimas que procuraram apoio na Me Too.

A associação não revelou os nomes das mulheres que procuram atendimento, mas, segundo a coluna do jornalista Guilherme Amado, do Metrópoles, no caso da ministra Anielle Franco, mais de 14 pessoas próximas a ela foram ouvidas confirmando os episódios de assédio.

Nota do Governo Federal

Dias depois da denúncia vir a público, o presidente Lula demitiu o então ministro dos Direitos Humanos Silvio Almeida.

"Diante das graves denúncias contra o ministro Silvio Almeida e depois de convocá-lo para uma conversa no Palácio do Planalto, no início da noite desta sexta-feira (6), o presidente Lula decidiu pela demissão do titular da Pasta de Direitos Humanos e Cidadania."

"O presidente considera insustentável a manutenção do ministro no cargo considerando a natureza das acusações de assédio sexual. A Polícia Federal abriu de ofício um protocolo inicial de investigação sobre o caso. A Comissão de Ética Pública da Presidência da República também abriu procedimento preliminar para esclarecer os fatos."

'O Governo Federal reitera seu compromisso com os Direitos Humanos e reafirma que nenhuma forma de violência contra as mulheres será tolerada.", finaliza a nota.

O que disse Silvio Almeida?

"Repudio tais acusações com a força do amor e do respeito que tenho pela minha esposa e pela minha amada filha de 1 ano de idade, em meio à luta que travo, diariamente, em favor dos direitos humanos e da cidadania neste país. Toda e qualquer denúncia deve ter materialidade. Entretanto, o que percebo são ilações absurdas com o único intuito de me prejudicar, apagar nossas lutas e histórias, e bloquear o nosso futuro. Confesso que é muito triste viver tudo isso, dói na alma. Mais uma vez, há um grupo querendo apagar e diminuir as nossas existências, imputando a mim condutas que eles praticam."

"Com isso, perde o Brasil, perde a pauta de direitos humanos, perde a igualdade racial e perde o povo brasileiro. Toda e qualquer denúncia deve ser investigada com todo o rigor da Lei, mas para tanto é preciso que os fatos sejam expostos para serem apurados e processados. E não apenas baseados em mentiras, sem provas. Encaminharei ofícios para Controladoria-Geral da União, ao Ministério da Justiça e Segurança Pública e Procuradoria-Geral da República para que façam uma apuração cuidadosa do caso", disse.

Em complementação da nota, o ministro garantiu que "as falsas acusações, conforme definido no artigo 339 do Código Penal, configuram “denunciação caluniosa”. Tais difamações não encontrarão par com a realidade. De acordo com movimentos recentes, fica evidente que há uma campanha para afetar a minha imagem enquanto homem negro em posição de destaque no Poder Público, mas estas não terão sucesso. Isso comprova o caráter baixo e vil de setores sociais comprometidos com o atraso, a mentira e a tentativa de silenciar a voz do povo brasileiro, independentemente de visões partidárias. Quaisquer distorções da realidade serão descobertas e receberão a devida responsabilização. Sempre lutarei pela verdadeira emancipação da mulher, e vou continuar lutando pelo futuro delas. Falsos defensores do povo querem tirar aquele que o representa. Estão tentando apagar a minha história com o meu sacrifício".

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