Com os de fora, são umas leoas. Defendem suas crias do preconceito, da violência, da ignorância. Entre os seus, dão afeto, colo, abraço apertado, amor sem medida. Na tradução mais simples, são mães. Juntas, formam um coletivo que nasceu movido pelo sentimento natural de proteção. Em Pernambuco, somam 22, até agora. Mas há também as empatizantes e, quando contabiliza tudo, já chegam a quase 50. Mais do que uma militância política, elas distribuem afeto. Aos montes. Não só para seus filhos gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais, mas para outras mães e pais que, tanto quanto os filhos, estão descobrindo que o que importa mesmo é respeito e amor.
Movimento nacional, já atuante em 17 Estados, o coletivo Mães pela Diversidade deu os primeiros passos em Pernambuco no ano passado. O medo de ver os filhos vítimas de violência, pelo simples fato de assumirem sua identidade sexual, foi uma das principais ligas para, uma a uma, elas irem se juntando. “Minha filha havia sido agredida no interior do Rio Grande do Sul, onde cursava a universidade, por ser lésbica. Derrubaram o muro da casa dela e da companheira, elas tiveram que ir morar nos fundos da casa de um conhecido. Por pura intolerância. A polícia não fez nada. Os crimes de homotransfobia sequer são investigados com essa motivação. São camuflados. Percebi que precisaríamos nos unir para proteger nossos filhos”, conta Gi Carvalho, à frente do grupo no Estado.
Ainda sem sede própria, mas com muita disposição para dialogar e até brigar (se preciso for) pelos direitos dos LGBTs, o coletivo coleciona histórias de afeto e de acolhimento. Paula Ramos, uma das mães pela diversidade, foi levada pelo filho, Dylan Belo, 21 anos, que é transexual. Na busca de tentar entender as mudanças vividas por Dylan, Paula se aproximou não só do filho como encontrou uma causa por que lutar. “Eu pensei: ‘se eu não tiver perto dele, será pior’. Eu não quero ver meu filho morto. E acho que nós, mães, temos que ser as primeiras a exigir esse respeito. Que eles sejam livres para serem o que quiserem”, defende Paula. Ao lado, Dylan reforça: “A presença dela me deu mais confiança, mais segurança para ser quem eu sou.”
O filho de Regina Guimarães mora no Rio de Janeiro. Mas isso não a impede de abraçar tantos outros que estão perto e que precisam, às vezes, apenas de um colo. “O poder desse coletivo está no coração da gente. É amor demais para dar. E isso não diz respeito apenas às nossas crias, mas a todos que precisam de apoio. Já atendi ligações desesperadas de madrugada e o simples fato de ouví-los, acolhê-los, faz uma diferença enorme. Ajuda a quebrar o isolamento que, muitas vezes, se estabelece dentro de casa”, conta.
Bernardo Cruz, 21, sabe bem o que é isso. Ele faz parte do grupo, mas a mãe, não. “Entendo os limites dela e as dificuldades para aceitar a minha transexualidade. Por isso é tão importante esse espaço. A minha carência maternal é preenchida pelo amor de tantas mães”, afirma. O jovem já foi vítima de violência física e teve crises de pânico e ansiedade após a agressão. “Ele aqui é amado por todas, é um filho muito querido”, diz Gi.
Entre Margarete Luz, a mãe, e Gabriela Carla, a filha, 20, a convivência no grupo trouxe, além de segurança, autoconhecimento. “Quando minha mãe entrou no coletivo, eu percebi o quanto era importante resolver questões da minha bissexualidade que eu não queria enfrentar. Eu não me enxergava enquanto movimento político, ela me ajudou a ver outras questões e ter mais confiança”, diz a jovem.
Na próxima terça-feira (16), todas essas histórias de amor e luta estarão reunidas no documentário Mães pela Diversidade, que será lançado no Ministério Público, às 10h, na Avenida Visconde de Suassuna, na região central do Recife. Produzido por Dylan e Bernardo, com entrevistas de mães que se entregaram à causa, o documentário vai mostrar o que move essas mulheres e até onde elas querem e podem chegar. Nas palavras de Gi, um pouco desse voo: “Nossa arma é o amor. Estamos só começando a nossa luta. Queremos falar para todas as famílias LGBTs e dizer para elas: vocês não estão sozinhas.”