O adeus ontem a Maria Alice Seabra foi pontuado por um silêncio ensurdecedor. Durante as três horas em que o corpo da jovem foi velado num caixão branco, numa sala pequena, próxima ao Cemitério de Santo Amaro, não se ouviram gritos nem choros desesperados. Como se perplexos ou anestesiados com o horror que abreviou uma vida ainda no começo, amigos e familiares pareciam chorar para dentro. Havia lágrimas. Muitas. As amigas da escola, as professoras, os tios, os vizinhos, a dor era coletiva. Mas tão profunda, tão doída, que precisava ser vivida no particular. Havia naquela pequena sala um respeito tão grande pelo sofrimento imposto à Alice e a sua família, que dezenas de pessoas entraram e saíram sem que quase nada fosse dito. Dizer o que, diante do absurdo?
Ao lado do caixão, Maria José Arruda, a mãe de Alice, fazia a tristeza ficar ainda maior. Ela ficou em pé as três horas. O tempo todo falava baixinho com Alice, para só a filha escutar. Em cima do caixão, uma foto com a menina sorrindo, “ela sorria com os olhos”, lembrou a professora de educação física. Junto à fotografia, a camisa de fera/3º ano da Escola Nilo Coelho, onde Alice se formou em 2013. Muitos colegas de turma vestiram a mesma camisa como forma de homenageá-la. Entre os amigos, Alice era amada por tantos predicados – simpática, doce, alegre, inteligente, dedicada – que a toda hora um ou outro lembrava de citar mais um. “Era a nossa princesa, nossa lady”, decretava a amiga Lilian Araújo, 19 anos.
Entre um abraço e outro, Maria José, a mãe, acariciava a camisa e a foto sobre o caixão, como se aquele carinho lhe deixasse mais perto de Alice. Desde que o corpo da filha foi encontrado num canavial em Itapissuma, ela deixou a casa onde morava com o marido, Gildo Xavier, o padrasto e assassino confesso da jovem, no bairro da Estância, no Recife. Familiares disseram que ela pretende se mudar, com a filha de 11 anos, fruto do relacionamento com Gildo, para São Lourenço da Mata, onde já mora a filha mais velha, Angélica. Era para lá, para a casa da irmã, que Alice corria para fugir do ciúme obsessivo do padrasto.
A criança de 11 anos era o xodó de Alice. Gostava de colocá-la para dormir, vivia grudada com ela. A menina não foi ao sepultamento da irmã. “Ela está transtornada. Evitamos falar sobre o assunto na frente dela. Mas ela sente tudo. Disse que, para ela, o pai está morto. Nunca mais quer saber dele”, cochichou um parente.
Só a revolta diante da brutalidade do crime fazia, vez ou outra, alguém se exaltar e falar mais alto. Nas conversas de pé de ouvido, cada um decretava sua sentença para o padrasto, que premeditou o estupro dois meses antes. Quando o caixão de Alice foi colocado numa gaveta no Cemitério de Santo Amaro, ao lado do pai José Messias, morto há cinco anos, a menina ganhou aplausos, rosas e música. A família foi embora em silêncio.