Hilton Lacerda fala sobre Tatuagem, que representa Pernambuco no Festival de Gramado

Filme é o primeiro de ficção assinado pelo roteirista e cineasta
Ernesto Barros
Publicado em 11/08/2013 às 10:40
Filme é o primeiro de ficção assinado pelo roteirista e cineasta Foto: Divulgação


Uma das vozes mais originais do cinema nacional, o cineasta pernambucano Hilton Lacerda, 48 anos, apresenta neste domingo, na Mostra Competitiva de Longas-metragens Brasileiros do Festival de Gramado, seu primeiro filme de ficção, o muito aguardado Tatuagem. Com a história situada no final dos anos 1970, o filme mostra a atuação de um anárquico grupo teatral que mantém um espaço na divisa entre o Recife e Olinda. Entre as encenações, surge um caso de amor entre o agitador cultural Clécio (Irandhir Santos) e o soldado Fininha (Jesuíta Barbosa). Roteirista de Baile perfumado (de Lirio Ferreira e Paulo Caldas), Amarelo manga, Baixio das bestas e A febre do rato (os três de Cláudio Assis), entre vários outros filmes, Hilton há muito que se prepara realizar um longa-metragem. Nesta entrevista, o cineasta expões ideias que levaram à realização de Tatuagem, o significado que o ano de 1978 tem para ele, o clima de conservadorismo que ronda o Brasil de 2013, entre outros assuntos.


JORNAL DO COMMERCIO - A ação de Tatuagem se passa em 1978, quando o Brasil passava por um momento de exceção, mas já bem próximo da abertura política. Apesar disso, havia uma certa liberdade pessoal para quem estava à margem do engajamento político tradicional. Hoje, 35 anos distante dessa época, quais as conexões que você faz com o Brasil atual?

HILTON LACERDA -
Primeiro que, apesar de se passar em 1978, a ideia de fazer Tatuagem não tem a ver com um filme de época. Saudosista, nesse sentido. Na minha cabeça, a ideia era fazer uma reflexão sobre o presente, a construção de futuro que você faz, como se projetamos nele quando estamos parado no presente. Eu tenho uma teoria. Acho que em várias épocas o Brasil estava pronto para dar certo, como um gigante que se levantou várias vezes, mas cujos passos não levaram a lugar nenhum. Acho que em 1978 teve um pouco disso: vínhamos de um milagre econômico e as perspectivas eram boas, com a queda da ditadura, que já estava esgotada. Além disso, a discussão sobre a liberdade e sobre o corpo estavam presentes, como uma contracultura retardada em relação a outras partes do mundo. E ainda tínhamos, também, no meio daquilo tudo, uma tradição tropicalista muito forte. Enfim, o que tentei colocar no filme é o que a gente projeta quando pensa em mudança, quais as perspectivas que haviam naquele momento. Entre elas, algumas que estamos discutindo ainda hoje. Preocupo-me com o conservadorismo moral como forma de pensamento. E como se o Brasil se preparou para certas coisas e acabou fazendo um grande conchavo, seja na economia ou no comportamento. Parece que estamos dando passos para trás.

JC - Um dos casos recentes foi o projeto abortado de "cura gay", proposto pelo deputado federal Marco Feliciano (PSC-SP), que preside a Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Após tantos anos de luta e de avanços, essa proposta não lhe pareceu muito esdrúxula?

LACERDA -
O que eu acho mais louco é que por conta de uma construção de Estado se compromete qualquer ideia avanço. A gente apostou muito na construção desse Estado para agora nos depararmos com uma pessoa, na Comissão de Direitos Humanos, que é notoriamente contra essas conquistas. Eu vejo mais a questão conservadora dele do que a questão religiosa. Eu conheço católicos tão reacionários quanto Feliciano. O que é um absurdo é que esse discurso conservador e reacionário se apresenta num lugar onde você precisa ter um diálogo de minorias - essa é a função da Comissão de Direitos Humanos. A gente não precisa de gente efetivando, por exemplo, opinião sobre a pena de morte. A gente precisa de gente que equacione essas tensões. Algumas dessas discussões eram improváveis nos anos 1980. Sempre pensamos que o futuro é evolutivo, mas parece que a história da humanidade prova que ela circula para trás, seja pela barbárie ou pela moral.

Leia a entrevista completa na edição deste domingo (11/08) no Caderno C, do Jornal do Commercio.

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