Revista 'A Geometria da Cidade' reúne fotos e versos sobre o Recife

Com imagens feitas por Linda Nogueira e poemas de Fred Caju, a publicação revela as estruturas da cidade
Diogo Guedes
Publicado em 23/03/2018 às 8:24
Com imagens feitas por Linda Nogueira e poemas de Fred Caju, a publicação revela as estruturas da cidade Foto: Linda Nogueira/Divulgação


Uma cidade, na sua sequência quase sempre caótica de ruas e construções, costuma esconder desenhos e estruturas. Além disso, também oculta a própria história, “esconde ossos debaixo do tapete”. Esses dois aspectos são revelados em texto e imagem na revista A Geometria da Cidade, lançada hoje, às 19h30, no Espaço Pasárgada, com o encontro entre as linhas arquitetônicas do Recife, fotografadas por Linda Nogueira, e os poemas críticos de Fred Caju.

São duas formas – harmônicas e dissonantes – de revelar as estruturas da capital pernambucana. A revista mostra, com o olhar azulado e chuvoso de Linda, locais fundamentais do Recife, como o edifício Holiday, o metrô, a Praça do Sebo, a Ponte de Ferro e o Estádio do Arruda, entre muitos outros. A ideia para o projeto, que conta com incentivo do Funcultura, veio depois que a fotógrafa observou a geometria de outras cidades em uma viagem pela Europa.

Na volta, enxergou os mesmos elementos na sua cidade. “Alguns lugares eu já pensava que seria interessante fotografar. Vários foram escolhidos por uma relação afetiva – o Museu do Trem, por exemplo, é marcante para mim porque eu sempre ia lá com meu pai. Existem as questões históricas e sociais, os pontos mais conhecidos. E o principal elemento, claro, foi o estético: a geometria”, conta Linda.

A fotógrafa chamou o poeta Fred Caju para criar poemas com o mesmo roteiro da cidade. Além disso, o projeto contou com a pesquisa de Cêlini Albuquerque, que fez um levantamento histórica sobre a arquitetura dos locais escolhidos. “Vimos, com isso, que muitos dos lugares tinham um peso do sangue derramado ali, das injustiças sociais”, conta Linda. “A partir da minha vivência e da vivência de Caju na cidade, esse trabalho tenta arrancar a beleza das edificações e dos lugares, mas se interessa mais em expor as mazelas e violências que estão entranhadas em cada rua da metrópole. Não nos interessa maquiar a cidade e pintá-la bonita e leve. Há um peso, uma densidade, que não se pode, nem se consegue ignorar”.

POESIA

Esse passado histórico é realçado na poesia de Caju, que fala, no Teatro de Santa Isabel, sobre “quando se abrirem/ as tuas cortinas/ & tuas cabines/ para os herdeiros/ dos que subiram/ os teu tijolos”. “Linda me procurou por conhecer meus textos, por saber que eu tenho uma pegada anti-status quo, vamos dizer assim. E como as fotografias estão muito ligadas à forma geométrica, ela percebeu um controle de métrica no meu poema”, comenta o autor.

“Não estava planejado fazer esse recorte que mostra mais a violência da cidade, que mostra o quanto essas casas e construções acabam protegendo mais uma elite do que a população”, conta Caju. O contexto político atual também influenciou. “A quantidade de ministros de Pernambuco que a gente teve durante o golpe que está em curso mostra o quando o envolvimento da política local é reacionário”, reforça.

Sobre o Marco Zero, o poeta escreve que “aqui não se começa nada”: “ninguém vai zerar o sangue/ dos pretos aqui derramado”. “O nosso roteiro foi em grande parte afetivo. E isso me fez colocar a pauta racial dentro da narrativa dos poemas. Como estamos falando de nossas histórias de vida também, eu, como sujeito negro, sempre fui interditado em vários lugares e situações nessa cidade. Eu não poderia deixar passar algumas coisas. O que preserva o Museu do Estado, quem acaba podendo entrar no Santa Isabel, quem se diverte no Estádio do Arruda”, comenta.
l Lançamento de A Geometria da Cidade – hoje, às 19h30, no Espaço Pasárgada (Rua da União, 263, Boa Vista). Preço da revista: R$ 10.

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