Faria sentido batizar um disco com um dos ritmos que melhor definem a região com o nome São João Nordestino? Antes que pareça redundância, a idealizadora do projeto explica: “Hoje, nas festas do São João, encontramos de quase tudo, e cada vez menos o forró mais tradicional. É uma preocupação a de perceber como a tradição mais forte da cultura nordestina pode perder força diante de outros ritmos”, diz a empresária Ione Costa, produtora executiva do CD São João Nordestino, lançado hoje, numa ação beneficente para as crianças da creche da comunidade de Entra a Pulso, na arena cultural do Shopping Recife.
Além de beneficente, com renda revertida integralmente, o CD é, por si, um libelo pelo que se consagrou como o forró clássico do Nordeste. Com direção artística dividida entre Daniel Gonzaga, num estúdio do Rio de Janeiro, e Terezinha do Acordeon, noutro do Recife, as vinte faixas têm a contundência de um documento. Das mais recentes às mais antigas, as faixas, atemporais, condensam esse cancioneiro que começou a se tornar clássico ainda na primeira metade do século passado, quando Luiz Gonzaga, com sua música, ajudou não apenas a divulgar, mas a construir os elementos do que seria conhecido como a identidade nordestina.
Neto de Gonzagão e produtor no disco, o próprio Daniel solta a voz na faixa dedicada à Açucena Cheirosa. Os outros artistas convidados desfilam esse rosário de pérolas. Entre eles, o novato grupo Fulô de Mandacaru (Olha pro Céu / Na Emenda / São João de Outrora); o cearense Fagner (São João de Carneirinho), Alceu Valença e o filho Ceceu Valença (Xote das Meninas); Flávio José (Noites Brasileiras), Almir Rouche (Meu Pitiguari / É Madrugada), Trio Nordestino (Vem Morena). A pesquisa de repertório é de Lula do Acordeon.
Na bolachinha, estão ainda Genival Lacerda e João Lacerda (Esse Coco é Meu / Côco de 56), Alcymar Monteiro (Pedro, Antônio e João), Jorge de Altinho (Boneca de Feira), Cezzinha (São João Bonito / Fogueira no Quintal), Irah Caldeira (Festa do Interior), Santanna, (Asa Branca), Edilza Aires (O Fole Roncou), Terezinha do Acordeon (Sanfoneiro de Pé de Serra), Gennaro (Sanfona Sentida), Joquinha Gonzaga (A Dança da Moda), Flávio Leandro (Na Casa do Rei), a ex-parceira de Dominguinhos, Guadalupe (Naquele São João) e o cantor-revelação Almério, que imprime uma pegada sultilmente rocker ao clássico Carcará, a composição deJoão do Vale que revelou Maria Bethânia.
“Embora haja alguns arranjos diferenciados, procuramos a essência, fazer o mais clássico e sem firulas possível”, diz a diretora artística Terezinha do Acordeom. Ela toca e canta na faixa Sanfoneiro de Pé de Serra.“Como esse CD fala de São João e sanfoneiro, essa música exalta o sanfoneiro. Que diz que o sanfoneiro deve mandar brasa quando o São João chega”, ela diz, sobre a composição de Dominguinhos e Anastácia. Com inovações sutis, os arranjos se equilibram, naturalmente, na estrutura fundamental do forró: zabumba, sanfona e triângulo.
Com tantos participantes, músicos como Marcelo Janeci ficaram de fora desta e estão escalados para a próxima edição. “Sou carioca, mas estou radicada no Recife. Sou filha de mãe nordestina e sempre fui apaixonada por festas de São João. É uma felicidade que o Nordeste alimenta todos os anos em minhas recordações. A música desse projeto preza pela autenticidade, em um momento em que o forró assume outros significados para além da tradição”, defende Ione Costa, que é presidente do Instituto Shopping Recife. “Outra edições virão”, ela diz.
Hoje, no lançamento, o público pode adquirir o CD (com contribuição a partir de R$ 25) e conferir apresentações dos músicos participantes. Fagner, que está ensaiando no Recife desde o começo da semana, por exemplo, pode brindar a noite com mais alguns clássicos de seu repertório.
São João Nordestino - lançamento do CD, hoje, a partir das 19h30, no Terraço de Eventos do Shopping Recife.