Dois cigarros de maconhas levaram John Lennon a sair da letargia pós-Beatle e realizar sua apresentação nos Estados Unidos, em dezembro de 1971, em Ann Arbor, no campus da Universidade do Michigan. O ativista yippie, ala politizada dos hippies, Jerry Rubin conseguiu convencer Lennon a entrar na causa pela liberação de também ativista John Sinclair, condenado a dez anos de prisão, por oferecer dois baseados a uma polícia disfarçada (claro, a pena foi agravada por antecedentes). Começaria daí a fase de atuação política de John Lennon nos EUA, por conta de que passou a ser seguido, espionado e obrigado a lutar durante cinco anos para não ser deportado. Esta e outras passagens dos últimos dez anos da vida do ex-Beatle são contadas no livro John Lennon em Nova York - Os Anos da Revolução (no original The Walrus & The Elephants: John Lennon’s Years of Revolution), de James A. Mitchell (tradução de Pedro Jorgensen Jr.), lançamento da Valentina.
Passados 44 anos desde que John & Yoko mudaram-se para Nova York, e 35 desde seu assassinato na calçada do edifício Dakota, parece redundante escrever sobre uma dos personagens mais badalados do século 20. O autor, no entanto, conta sua história por outro ângulo, ironicamente ressaltado no título original. O Walrus (leão marinho, é John), e os Elephant’s Memory, a banda que o acompanha no álbum Sometime in New York (1971), um jornal sonoro, uma série de canções de temática política imediatista.
Em alguns momentos a história do ex-Beatle envereda pela Nova Esquerda americana, como o SDS (Students for a Democratic Society), de Jerry Rubin e Abbie Hoffman. A época era de confronto e radicalismos no mundo inteiro, que vivia a contrarrevolução que se seguiu à revolução frustrada de 1968. Se não cometia os mesmos crimes das ditaduras latino-americanas, o governo dos americanos do Norte tampouco seguia a risco a constituição.
As atividades de John Lennon passaram a ser monitoradas, inclusive com escuta telefônica, por agentes que não fariam feio diante do atrapalhado agente 86, do seriado televisivo dos anos 60, vivido por Mel Brooks: “Um memorando de 2 de fevereiro sobre a mudança de John e Yoko do Hotel St. Regis dizia: ‘Lennon mudou-se, desde então, para endereço ignorado.’ Ora, nessa data já fazia meses que Lennon se instalara no apartamento da Bank Street, 105; o agente fora incapaz de descobrir o que quase todo o Greenwich Village já sabia. E, para se certificar da identificação, o mesmo memorando solicitava informações adicionais, ‘incluindo uma foto do investigado’.” Ou seja, para conseguir uma fotografia de John Lennon em Nova York era necessária a ajuda do QG. A atuação de Lennon incluía luta pelos direitos da mulher, dos negros, das minorias em geral, mas a autoridades competentes temiam a influência sobre os jovens que iam às urnas.
Mas, incompetências à parte, foram cinco anos difíceis para Lennon e Yoko, que só conseguiu o visto definitivo em 1976, quando ele se tornou dono de casa, cuidando do filho Sean, enquanto Yoko cuidava dos negócios. Muito bem, como se sabe. Mas John Lennon não conseguiria evitar que o dinheiro continuasse a jorrar em sua conta bancária.
O mito dos Beatles só fez crescer com o tempo, Lennon jamais deixaria de um dos quatro. Não foi o cidadão John Lennon em quem Mark Chapman disparou a carga de sua pistola, em 8 de dezembro de1980. Foi no Beatle John Lennon. Este ano ele completaria 75 anos, difícil imaginar que tipo de música ou atuação teria num mundo que virou cabeça para baixo. Jerry Rubin, cujo apelido durante muito foi B.O (de bad olor, mau cheiroso), nos anos 80 tornou-se corretor da Bolsa em Wall Street, e nos anos 90, envolveu-se novamente com a polícia. Não mais por sua atuação política e sim por estar metido num esquema de pirâmide.