Capitalização exige planejamento pessoal; entenda a proposta

A reforma da Previdência proposta pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, passa a mensagem de que o brasileiro terá que contribuir para a sua aposentadoria por seus próprios meios
Ana Tereza Moraes
Publicado em 10/01/2019 às 7:45
A reforma da Previdência proposta pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, passa a mensagem de que o brasileiro terá que contribuir para a sua aposentadoria por seus próprios meios Foto: Foto: Agência Brasil


Ao afirmar que a proposta de reforma da Previdência a ser enviada ao Congresso em fevereiro vai incluir um regime de capitalização, o ministro da Economia, Paulo Guedes, passa a mensagem de que chegou a hora de o brasileiro contribuir para a sua aposentadoria por seus próprios meios, ou seja, pede planejamento e poupança de longo prazo às pessoas. Atualmente, mesmo a classe média que pode investir em planos de aposentadoria privada para ampliar seus ganhos durante a velhice ainda investe pouco. Segundo a consultoria Mercer Brasil, o total de reservas de Previdência no Brasil, juntando fundos de pensão e os planos individuais vendidos em bancos e seguradoras, é de cerca de R$ 1,8 trilhão, ou 20% do PIB. 

“Em países que já adotam o regime de capitalização essa relação chega a 150% do PIB, como na Holanda. Falar sobre Previdência certamente mexe com a opinião púbica e faz as pessoas refletirem sobre seu futuro”, diz Felipe Bruno, líder de Previdência da Mercer Brasil. Ele dá como exemplo o ano de 2017, que registrou um incremento “fora da curva” na procura por produtos de aposentadoria do mercado. Naquele ano, quando a discussão no governo Temer sobre a reforma tomou corpo, o total de reservas de planos de Previdência privada aberta (que inclui planos VGBL e PGBL) apresentaram uma evolução nominal de 17,6%, segundo a Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), entidade que representa 67 seguradoras e entidades abertas de previdência complementar no País.

Detalhes da proposta

A versão do novo texto será apresentada na próxima semana ao presidente Bolsonaro e deverá aproveitar parte do texto da reforma de Temer, que estabelece a idade mínima para a aposentadoria, uma discussão que pode prever 65 para homens e 62 para mulheres com período de transição. Com relação à capitalização, que será colocada à parte, ainda não se sabe como Guedes vai apresentar a proposta, mas existem pelo menos duas ideias oferecidas por economistas e entidades que podem dar um norte do que virá por aí. De antemão, está definido que o novo regime é voltado para as futuras gerações e requer um prazo de implementação. A princípio, a capitalização só deve valer para nascidos a partir de 2014, que entrariam no mercado de trabalho depois de 2030.

Na visão da Mercer, o sistema previdenciário ideal teria um benefício universal para todos os brasileiros que chegam a 65 anos, com uma remuneração de 70% do salário mínimo, financiada pelos impostos. Seguindo as práticas de outros países que já adotam o sistema, como Holanda e Dinamarca, haveria uma outra camada de proteção básica financiada pela contribuição obrigatória dos empregados e empresas que cobririam até US$ 700 ou R$ 2.600 de aposentadoria. A partir daí, quem pudesse contribuir com mais, não seria obrigado, mas poderia complementar sua aposentadoria em fundos de pensões e, para quem quisesse ainda mais, poderia ser estimulado por incentivos fiscais a criar poupanças de longo prazo.

Proposta apresentada pelo professor da FEA-USP, Hélio Zylberstajn, em nome de cinco entidades como a Fipe, estabelece quatro pilares, aos brasileiros nascidos a partir de 2005. Teriam uma renda básica de R$ 550 ao atingir a velhice, independente de contribuição, com complemento do INSS para chegar a um benefício de até R$ 2.200 para quem contribuiu com o sistema. “O terceiro pilar é a grande inovação, é baseado na capitalização, com o trabalhador comprando plano de aposentadoria no mercado, utilizando uma conta que já existe, que é o FGTS. A ideia é transformar o FGTS num fundo de aposentadoria capitalizada”, diz. No quarto pilar, entrariam os mais ricos, que, a exemplo dos dias atuais, comprariam planos de capitalização de mercado para poder manter o padrão de vida dos dias da ativa, numa contribuição voluntária. “O segundo e o terceiro pilar são compulsórios.”

Outro plano de capitalização foi desenhado pelo ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga e pelo economista Paulo Tafner. Assim como a proposta de Zylberstajn, o modelo seria um híbrido entre o regime de repartição (modelo atual) e capitalização, que poderia gerar uma economia de até R$ 1,3 trilhão em dez anos, segundo Tafner. “A diferença para a minha ideia”, diz o professor da FEA-USP, “é que na proposta de Armínio o dinheiro fica com INSS, que pagaria os juros nessas contas. Outra diferença é que, nesse modelo, a taxação sobre a folha ainda continua alta. Na minha ideia, com a capitalização pelo FGTS, é possível passar para uma contribuição de 5% do empregado e outros 5% da empresa”, afirma. Atualmente, o trabalhador contribui com 11% para o INSS e a empresa com mais 20%. “Isso é uma das razões para a informalidade, a alta taxação.”

A informalidade, aliás, é uma das causas para o sistema de capitalização do Chile, implementado durante a ditadura de Pinochet nos anos 80, apresentar dificuldades. “A informalidade retira contribuições. Além disso, há a alíquota ideal para se atingir os benefícios almejados, que no caso do Chile se mostrou inadequada”, diz Felipe Bruno. 

Embora apontada como uma saída para o déficit da Previdência, a mudança do atual regime de repartição para o de capitalização tem custo alto. Especialistas estimam que esse valor pode chegar a R$ 6,6 trilhões ou 100% do PIB brasileiro, ainda que diluído ao longo dos anos de transição. “À medida que você abre para a capitalização, você perde contribuições no sistema antigo. A grande questão hoje é em quanto tempo fazer essa migração. A partir de quando é a grande resposta que o mercado está esperando”, diz Felipe Bruno.

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