Maduro assume segundo mandato sob a sombra da ilegitimidade

Maduro foi reeleito em eleições boicotadas pela oposição, que denunciou a ocorrência de fraude. O mandato não é reconhecido pelo Grupo de Lima, integrado por 14 países
AFP
Publicado em 08/01/2019 às 9:56
Maduro foi reeleito em eleições boicotadas pela oposição, que denunciou a ocorrência de fraude. O mandato não é reconhecido pelo Grupo de Lima, integrado por 14 países Foto: Foto: Juan Barreto/ AFP


O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, assumirá na quinta-feira (10) um segundo mandato de seis anos sob uma sombra de ilegitimidade que pode implicar mais isolamento internacional e uma crise econômica ainda pior.

Maduro, de 56 anos, vai prestar juramento ante o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) - e não diante o Congresso, único poder não governista. Ele foi reeleito em 20 de maio em eleições boicotadas pela oposição, que denunciou a ocorrência de fraude.

Além disso, o pleito não foi reconhecido pelos Estados Unidos, Canadá, União Europeia e 12 países latino-americanos.

Com exceção do México e apoiado pelos Estados Unidos, o Grupo de Lima, integrado por 14 países americanos, pediu na semana passada que o presidente socialista não tome posse. Para Caracas, tratou-se de incitação a um golpe de Estado.

"Não acho que haja um colapso maciço das relações, mas uma degradação significativa do nível desses laços", afirmou o analista político Mariano de Alba, concordando com Peter Hakim, do Inter-American Dialogue, que espera mais "discursos", e não ações de "impacto sério". 

Mesmo assim, os especialistas preveem uma pressão internacional maior, em função da qual Caracas resolveu se aproximar de seus aliados: Rússia, China, Irã, Turquia e Coreia do Norte.

A Organização dos Estados Americanos (OEA) fará uma sessão extraordinária na Venezuela para analisar a situação.

"Quem não reconhecer a legitimidade das instituições venezuelanas dará a elas sua resposta recíproca e oportuna. Vamos agir com grande firmeza", afirmou Maduro, cujo mandato será reconhecido na quinta-feira pelas Forças Armadas e, na sexta-feira, pela Assembleia Constituinte.

Sem mudanças

Ao clima internacional adverso, soma-se o desespero e o desconforto daqueles que culpam o presidente pela ruína do outrora próspero país.

De acordo com o FMI, a economia, que foi reduzida pela metade durante o governo de Maduro, vai contrair 5% em 2019, e a hiperinflação chegará a 10.000.000%.

"Alguns acham que estamos no auge. Mas haverá níveis muito mais críticos", alertou o diretor da Ecoanalítica, Asdrúbal Oliveros, que acredita que o governo pode ser forçado a tomar "medidas pragmáticas", sem mudar o modelo de intervenção da economia.

"A Venezuela não vai mudar com Maduro na presidência, os medicamentos não estão disponíveis, as pessoas estarão passando fome", disse Gleidimir Peña, 23 anos, falando à AFP. 

Diante da situação de seu país, ela optou por emigrar para o Peru.

No que quis respeito à pior migração da história recente da América Latina, a ONU acredita que 2,3 milhões de venezuelanos tenham abandonado o país desde 2015. Ainda segundo a ONU, esse número deve subir para 5,3 milhões em 2019.

Com o colapso da produção vital de petróleo - de 3,2 milhões de barris por dia para 1,13 milhão na última década -, Maduro convidou seus aliados a investirem na exploração de ouro, diamante e coltan.

Oposição impotente

Com controle institucional e militar e uma oposição fraturada, Maduro diz que ele é mais forte e mais legítimo do que nunca. Agora, segue por conta própria, depois de herdar o poder de Hugo Chávez (1999-2013), que há 20 anos fundou a "Revolução Bolivariana".

Seus adversários fizeram quase tudo para desalojá-lo do poder: protestos que deixaram cerca de 200 mortos, uma tentativa de referendo, promoção de diálogos e pedidos de sanções internacionais.

Mas hoje eles estão engajados em lutas por liderança e com seus principais líderes presos, incapacitados, ou no exílio.

Além disso, o Parlamento foi substituído na prática pela Assembleia Constituinte - com poderes absolutos -, uma vez que o TSJ o declarou em desacatado e anulou suas decisões.

Apesar disso, no sábado passado, a legislatura declarou Maduro "usurpador", proclamou-se o único poder legítimo e anunciou que promoverá um "governo de transição" para convocar eleições.

"Nada sairá do Parlamento que possa ter o menor impacto sobre as políticas, práticas, ou membros do governo, porque não tem poder, ou autoridade", afirma Hakim.

Para o cientista político Luis Salamanca, a oposição a Maduro - acusada de tentar matá-lo em 4 de agosto - deve começar com uma "reconstrução", aprender a lutar no palco "sem GPS constitucional" e evitar medidas que geram "frustração" irrelevante.

Um diálogo por enquanto parece distante. Mas, se iniciado, Hakim acredita que a oposição deva buscar objetivos viáveis para aliviar a crise.

"Nenhum governo autoritário e repressivo cai porque seus oponentes - fracos e desorganizados - exigem isso", apontou.

Para defender a "revolução", o partido no poder mobilizará seus partidários nesta quinta. Ontem, uma caravana, que incluiu homens encapuzados e armados com rifles, jurou defender Maduro pelo fogo e pelo sangue.

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