O acordo do Brexit negociado arduamente pela primeira-ministra britânica, Theresa May, foi amplamente rejeitado, nesta terça-feira (15), pelo Parlamento britânico, lançando mais incerteza sobre a saída do Reino Unido da União Europeia (UE) e o futuro imediato da primeira-ministra.
O documento de 585 páginas, fruto de 17 meses de negociações duras entre Londres e Bruxelas, sofreu uma derrota histórica em um Parlamento amplamente hostil: foi rejeitado com os votos contrários de 432 deputados, frente a 202 a favor.
"Esta é uma derrota catastrófica para o governo, afirmou o líder da oposição trabalhista, Jeremy Corbyn, que imediatamente lançou uma moção de censura contra o governo conservador de May "para que a Câmara possa dar seu veredito sobre sua incompetência".
Caso aprovada, essa moção deve ser debatida nesta quarta-feira (16) e pode levar à formação de um novo Executivo ou a eleições legislativas antecipadas.
A derrota do acordo do Brexit no Parlamento era amplamente esperada, e os mercado financeiros viram inclusive a libra esterlina se valorizar após a votação ocorrer dentro do previsto.
Os esforços de May, que concluiu cinco dias de debates acalorados pedindo aos deputados para respeitar o resultado do referendo que decidiu pela saída do Reino Unido da UE, foram inúteis.
"Acho que temos o dever de cumprir com a decisão democrática do povo britânico", disse, alertando os legisladores de que a UE não vai oferecer nenhum "acordo alternativo" ao seu, caso este seja rejeitado.
Para os eurocéticos, o acordo faz concessões inaceitáveis à União Europeia. Já os pró-europeus veem piores condições do que se tem atualmente como país-membro do bloco.
O ponto mais polêmico do acordo é o chamado "backstop", ou rede de segurança, um mecanismo criado para evitar a reinstauração de uma fronteira dura na ilha da Irlanda por temor de enfraquecer o Acordo de Paz de 1998. Os partidários de uma saída clara temem que esse mecanismo mantenha o país permanentemente preso às redes europeias.
Assim, pouco mais de dois meses antes da data marcada para o Brexit, em 29 de março, o país mergulhou em um limbo.
May prometeu que o governo apresentará um plano alternativo nesta segunda-feira (21). Mas isso depende de sobreviver à moção de censura apresentada pelo Partido Trabalhista.
Essa moção, no entanto, não tem seu sucesso garantido: embora muitos rebeldes conservadores tenham votado contra o acordo de May, não é certo que apoiarão uma iniciativa que poderia expulsar seu partido do poder.
No entanto, o plano B de May pode ser emendado pelos parlamentares com suas próprias propostas, então todas as opções estão abertas: de um Brexit sem acordo, de consequências catastróficas, até um segundo referendo, com esperança de voltar atrás.
Prevendo o cenário catastrófico em Londres, o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, tinha voltado a Bruxelas nesta tarde, cancelando sua participação em um debate previsto com o chefe do governo espanhol, Pedro Sánchez, na quarta-feira em Estrasburgo.
"O risco de uma saída desordenada do Reino Unido aumentou com a votação desta tarde. (...) Peço que o Reino Unido esclareça suas intenções o quanto antes", afirmou Juncker minutos após a decisão do Parlamento britânico.
O presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, adotou um tom mais conciliador após a derrota de May.
"Se um acordo é impossível e ninguém quer uma saída sem acordo, então quem terá enfim a coragem de dizer qual é a única solução positiva?"
Com abordagem mais direta, o porta-voz de Tusk afirmou que "lamentamos o resultado da votação e pedimos para o governo do Reino Unido esclarecer suas intenção a respeito de seus próximos passos o quanto antes. Os 27 sócios da UE continuarão unidos e procurarão reduzir os danos provocados pelo Brexit", disse.
Consciente de que se encaminhava para uma derrota retumbante, May tinha cancelado a primeira sessão de ratificação, prevista para 11 de dezembro, na esperança de obter alguma garantia adicional da UE. Contudo, cinco semanas depois, pouco pareceu ter mudado.
Mostrando a profunda divisão que reina no país, ativistas dos dois lados se concentraram desde de manhã à frente do Parlamento para passar sua mensagem aos deputados.
"Votamos a favor do Brexit, queremos abandonar a União Europeia. E queremos que essa gente dentro da Câmara nos veja, nos escute e escute o que dizemos", disse Sally Smith, do ramo da construção.
"Pessoalmente, espero que o acordo seja rejeitado. Espero que todo o Brexit seja parado, que haja uma consulta popular, mas acho que os últimos dois anos política britânica demonstraram a loucura deste país", disse outra manifestante, Elena Useinovic, cercada de ativistas com bandeiras europeias.