Com efeito arrasador na política, os 74 inquéritos abertos pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e as 201 petições destinadas a outras instâncias judiciais a partir das delações escabrosas de executivos da Odebrecht, a maior empreiteira do País, não devem ser julgados no curto prazo. O mais provável é que os políticos com foro privilegiado (8 ministros, 3 governadores, 34 senadores e 39 deputados) cheguem às eleições de 2018 sem terem se tornado sequer réus.
A primeira lista com pedido de instauração de inquéritos pedida pelo procurador-Geral da República (PGR), Rodrigo Janot, no âmbito da Lava Jato saiu em março de 2015. Antes da Odebrecht, foram abertos 38 inquéritos para investigar 111 pessoas. Deles, a PGR apresentou 20 denúncias, mas apenas cinco políticos com mandatos se tornaram réus. A média de tempo entre a abertura dos inquéritos e a apresentação das denúncias foi de 14 meses.
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“O Supremo não tem estrutura para a instrução penal. O Tribunal pode ter pessoas qualificadas, mas não na área penal. Como as penas são altas, a chance de prescrição é pequena. Agora, você pode ter atuações políticas no sentido de anistia”, diz o ex-desembargador federal Francisco Queiroz, diretor da Faculdade de Direito do Recife. “Em média, um processo desses pode durar de 3 a 5 anos. Ninguém espere ter uma pronta resposta em seis meses ou um ano”, alerta.
Em 2016, o tempo médio de tramitação de uma ação penal no Supremo era de 1.377 dias; aponta relatório do projeto STF em Números da FGV. É muito, se comparado que, em 2002, a Suprema Corte levava em média 65 dias. O documento também mostra que apenas 1,04% das decisões nesses processos são por condenações. Em duas de cada três ações penais, o mérito da acusação não chega a ser avaliado pelo STF, em razão do declínio de competência ou da prescrição.
Além de não ter especialidade na área penal, o Supremo ainda sofre com o montante de processos. O relatório de atividades de 2016 afirma que 117.472 decisões foram proferidas no ano passado. Mas a Corte julgou apenas 45 ações penais - e só sete delas foram apreciadas pelo plenário.
“Todas as Cortes Constitucionais trabalham com número limitado de processos. A dos Estados Unidos julgou, no ano passado, 170 processos. A Corte da Inglaterra julgou 89. A da França, ainda menos: 79. O Fachin julgou no ano passado 8.820 casos. Só um ministro. É impossível”, critica o jurista José Paulo Cavalcanti, ex-ministro da Justiça. Para ele, a extensão do foro privilegiado é um escândalo que precisa ser revisto. “O foro privilegiado só existe nessa extensão no Brasil. Na maioria dos países isso é limitado a chefes de poderes. Aqui são mais de 800 autoridades.”
No caso mais parecido com a Lava Jato que o STF já enfrentou, o Mensalão, 24 dos 38 réus foram condenados. Delatado em 2005, o esquema só começou a ser julgado sete anos depois, em agosto de 2012, e só foi concluído 19 meses depois, em março de 2014, quando a Corte terminou de analisar os embargos infringentes. Oito dos onze atuais ministros participaram daquele julgamento.
Nas delações da Odebrecht, a expectativa é que os casos desmembrados para outros tribunais sejam mais rápidos. Eles podem ir para varas especializadas, lembra Queiroz. E também podem ganhar prioridade na tramitação como ocorre no Paraná com Sério Moro. Na primeira instância, a Lava Jato apresentou 59 acusações criminais contra 267 pessoas. Em 27 delas, houve sentença. São 131 condenações que totalizam 1,3 mil anos de penas.
“No Brasil, a Lei da Ficha Limpa só pega pessoas condenadas por instâncias colegiadas. O que significa que boa parte desses processados poderão ser candidatos no próximo ano. E serão reeleitos”, ressalta Cavalcanti.