A decisão do PT de manter a candidatura de Lula após o julgamento do TRF-4 reacendeu o debate sobre a Lei da Ficha Limpa. A norma determina que políticos condenados por decisões colegiadas, como a de ontem, fiquem impedidos de disputar eleições por oito anos. Em nota divulgada ontem, o PT classifica a decisão do TRF-4 como uma “farsa judicial” e diz que a candidatura de Lula será confirmada na convenção partidária e registrada no dia 15 de agosto, fim do prazo para apresentação de candidaturas.
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“A situação dele se encaixou na Lei da Ficha Limpa. Ela diz que é inelegível para qualquer cargo aquele condenado por órgão colegiado por uma lista de crimes entre os quais estão os contra a administração pública, como a corrupção passiva e a lavagem de dinheiro. O Lula está inelegível. O que pode acontecer é ele ser absolvido em um recurso a tribunais superiores. A chance diminuiu drasticamente, mas pode acontecer. Agora, se for mantida a decisão de hoje, ele está inelegível”, avalia Daniel Falcão, advogado eleitoral e professor da Universidade de São Paulo (USP) e do Instituto de Direito Público (IDP).
Resultado de uma iniciativa popular que obteve 1,6 milhão de assinaturas, a Ficha Limpa foi sancionada sem vetos pelo próprio Lula em junho de 2010, com apoio de vários parlamentares petistas. Na época, a constitucionalidade da nova norma foi questionada no Supremo Tribunal Federal (STF), que atestou sua validade. Isso não impede, porém, que o PT volte a questionar se a legislação está de acordo com a Constituição em um STF com nova composição.
Na prática, porém, embora Lula já tenha uma condenação por um órgão colegiado, ele só ficará inelegível depois que registrar a candidatura e um eventual pedido de impugnação for avaliado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A nota do PT de ontem deixou reforça que o partido pretende usar o prazo a favor. Até ter o registro julgado em definitivo, o ex-presidente permanece candidato sub judice. Se chegar à eleição nessas condições, o petista terá os votos computados em separado, criando insegurança jurídica sobre o resultado da disputa.
Para Ivar Hartmann, professor de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), é muito provável que a defesa do petista faça um questionamento sobre a validade da Ficha Limpa ao STF. “Tempo hábil para analisar o pedido existe. A questão é que o STF recebe para julgar milhares de processos. Não tem como saber se a ministra Carmen Lucia vai decidir pautar isso. Ou, caso isso chegue como um habeas corpus em alguma Turma, se ela vai decidir pautar isso”, lembra.
A Ficha Limpa já foi descrita como uma “vitória da cidadania, da democracia participativa” pelo ministro do STF Ricardo Lewandowski. E como uma “lei que foi tão mal feita que parece que foi feita por bêbados” pelo também integrante da Suprema Corte brasileira Gilmar Mendes.
Idealizador da Ficha Limpa, o ex-juiz federal Márlon Reis defendeu a legislação. “A lei eleitoral não determina uma sanção, uma punição, mas sim uma condição. Ou seja, exigem-se alguns requisitos para alcançar o direito da candidatura. Isso não tem nada a ver com punição. Por isso a Ficha Limpa não se submete ao princípio da presunção de inocência”, argumentou.
Em entrevista à Rádio Jornal nessa quarta-feira (25), o ex-ministro da Justiça José Paulo Cavalcanti lembrou que esta é apenas a primeira ação contra Lula que está sendo julgada. “A questão mais relevante da condenação, neste momento, é que há uma lei da Ficha Limpa que leva à inelegibilidade. O destino do ex-presidente Lula está sendo sacramentado. Ele é réu ainda em outras três ações e é indiciado em outras duas”, ressaltou.