A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, admitiu na última sexta-feira (7), pela primeira vez de forma explícita, estar no páreo para ficar mais dois anos no cargo. "Estou à disposição da minha instituição e do País para uma eventual recondução ao cargo, mas não sei se isso vai acontecer", disse ela, após participar de evento do Ministério Público em São Paulo.
O mandato de Raquel na Procuradoria-Geral da República (PGR) vai até setembro, quando o presidente Jair Bolsonaro deverá indicar o próximo ocupante do cargo. Desde 2003, mesmo sem previsão em lei, a escolha tradicionalmente recai sobre um dos três nomes mais votados em eleição organizada pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).
Ao todo, dez integrantes do Ministério Público Federal se inscreveram para concorrer à lista tríplice da associação neste ano. Além desses, o subprocurador Augusto Aras apresentou seu nome fora da lista. Alvo de críticas internas, Raquel optou por não entrar na disputa da categoria. A eleição ocorre no dia 18.
Bolsonaro, porém, já indicou que não pretende seguir a lista tríplice. Com isso, ministros próximos ao presidente passaram a ver Raquel como uma candidata natural à recondução.
Ela já havia sido questionada outras vezes sobre a sucessão, mas nunca havia sido tão clara sobre sua disposição de continuar. Mesmo assim, disse que tem se mantido "sem fazer nenhuma movimentação nessa linha". "Já passei pelo crivo da minha instituição duas vezes e tenho um mandato que fala por si. Se houver essa possibilidade, estou à disposição do País", declarou à GloboNews. Questionada se era um desejo, negou. "É uma disponibilidade. Eu não almejo, mas me coloco à disposição."
Conforme revelou o jornal O Estado de S. Paulo, parlamentares do Centrão, bloco informal de partidos que tem imposto as principais derrotas de Bolsonaro no Congresso, têm defendido, em conversas reservadas, a recondução de Raquel a mais um mandato. A avaliação do grupo é a de que a atual procuradora-geral tem uma postura mais "moderada" do que seu antecessor, Rodrigo Janot - criticado por apresentar denúncias contra políticos apenas com base em delações.
Temem, ainda, que Bolsonaro escolha um nome mais "linha dura", alinhado ao discurso de criminalização da política que permeou a campanha eleitoral. Para ser confirmado, o nome indicado pelo presidente da República precisa passar por sabatina e ter o aval do Senado.
Desde que assumiu o comando do Ministério Público Federal, em setembro de 2017, Raquel desacelerou os acordos de colaboração premiada. Das 110 delações na Operação Lava Jato homologadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) até hoje, apenas uma foi em sua gestão.
Enquanto isso, Raquel pediu para anular quatro dos acordos de delação assinados por Janot. O mais recente foi o do ex-diretor da Hypermarcas Nelson de Mello, que havia acusado políticos do MDB de receber R$ 30 milhões para fins eleitorais. Mello foi acusado de ter omitido informações e de não apresentar provas suficientes.
A disposição de Raquel de ser reconduzida ao cargo sem disputar uma vaga na lista tríplice da ANPR foi vista como uma afronta pelos demais candidatos. "Eu fico triste de ver a doutora Raquel maculando a própria biografia. Ela hoje está aparentemente se furtando de vir, conversar com os pares dela, de se mostrar viável como liderança da casa", disse o subprocurador-geral Nívio de Freitas.
Para a também subprocuradora Luiza Frischeisen, Raquel se contradiz ao não participar da lista. "Em 2017, ela assinou compromisso no sentido de só aceitar a indicação mediante a lista. Esquece seu compromisso com a classe para uma eventual permanência na função."
Um dos principais críticos da atual gestão da Procuradoria, o procurador regional José Robalinho Cavalcanti vê movimentação política de Raquel para continuar no cargo. Segundo ele, emissários dela estiveram na semana passada com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em busca de apoio. "Ela está claramente se colocando", afirmou.
O vice-procurador-geral da República, Luciano Mariz Maia, rebateu as críticas. Disse que Raquel sempre defendeu a lista tríplice, mas que a candidatura de procuradores regionais desvirtuou a disputa. Antes, apenas subprocuradores podiam concorrer. "Como o primeiro dever dela é respeitar a lei, ela não poderia ingressar em um processo cujo resultado possa ser uma indicação de violação à lei." As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.