Grande Recife ou Zona da Mata? Entenda o dilema da cidade de Goiana

Há quase dois anos como Região Metropolitana, população quer voltar às origens
Luisa Farias
Publicado em 01/12/2019 às 7:25
Há quase dois anos como Região Metropolitana, população quer voltar às origens Foto: Sérgio Bernardo/ JC


Prestes a completar dois anos, o ingresso do município de Goiana à Região Metropolitana do Recife (RMR) tem a possibilidade de ser revertido. Um Projeto de Lei que tramita na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), de autoria do líder do governo na Alepe, Isaltino Nascimento (PSB), propõe a volta da cidade para a Zona da Mata Norte. Mas, desta vez, a medida deverá ser confirmada por meio de um plebiscito, ao contrário do que ocorreu no fim de 2017 quando os deputados estaduais aprovaram a inclusão de Goiana na RMR em meio às queixas de falta de diálogo por parte da população goianense.

Os questionamentos permanecem até hoje sobre os benefícios concretos de Goiana ter passado a ser da RMR. “A intenção de se colocar goiana na RMR é por conta da leitura que a gente faz das funções públicas de interesse comum. Goiana estaria mais contemplado tendo a complementaridade para qualificação, empregabilidade, uso dos equipamentos regionais”, ressalta a presidente do Condepe/Fidem, Sheilla Pincovski.

Alguns prejuízos, porém, são elencados pelos favoráveis à reversão da medida. Um deles é em relação ao Prodepe, que oferece melhores condições de isenção fiscal para empresas instaladas em municípios da Zona da Mata. Lá, o crédito presumido sobre o ICMS é de 85%, enquanto que para a RMR é de 75%. “Nós temos hoje a Jeep que 32% do PIB de Pernambuco depende da exportação dela e há a perspectiva de se instalar mais de 20 empresas ainda, que terão dificuldade de se instalar na cidade de Goiana em função dela agora se incluir na RMR”, afirmou Isaltino Nascimento.

Outra queixa é em relação à isenção do Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) para motoristas de vans do transporte alternativo de Goiana. De acordo com a Lei nº 10.849/1992, a matrícula em município não-integrante da Região Metropolitana do Recife é um dos critérios para o Estado conceder a isenção. “Em janeiro de 2018, quando fomos dar entrada na isenção, fomos comunicados que ela tinha acabado. Eu mesmo tenho uma van, meu IPVA vem no valor de R$ 2.700. Nós estamos torcendo para que Goiana volte a ser interior para que nós possamos voltar a ter a isenção”, diz o motorista Edmilson, conhecido como Zé da Pedra, da diretora da Associação dos Transportes Alternativos do Município de Goiana (Atamug).

Um terceiro ponto é o transporte público. Até então os passageiros continuam utilizando o transporte intermunicipal, que não está integrado ao Sistema de Transporte da RMR (STPP). Segundo o Consórcio Grande Recife, 2 mil usuários fazem diariamente o trajeto Goiana/Recife. “Parte desses usuários é de comerciantes, pessoas que trazem suas mercadorias para serem comercializadas no Recife. Para isso, seria necessário veículo diferenciado”, diz nota. O Consórcio informa que tem estudado essas particularidades para buscar uma alternativa para atender a demanda dos usuários. “Contudo, como o trabalho envolve outros órgãos, ainda não existe um prazo definido”, finaliza nota.

Para Sheilla Pincovsky, a integração de Goiana com a RMR pode ser vista como positiva a partir da dinâmica urbana da região, uma vez que a cidade vem mudando seu perfil de atividade produtiva, da agropecuária para a indústria, com os polos automotivo e farmacoquímico. “Era para se pensar Goiana como um novo polo de desenvolvimento do Estado de Pernambuco. Se ela não se integra, ficam na Zona da Mata Norte, que é uma região predominantemente rural, onde a cana é muito forte. Ela perde um pouco a nova cara que a cidade tem”, diz Sheilla.

Mas, segundo ela, o sentimento de pertencimento da população com a Zona da Mata ficou evidente durante uma reunião promovida pelo Condepe para a elaboração do Plano de Desenvolvimento Urbano e Integrado da RMR. “Acho que é uma coisa a ser ponderada, muito mais do que a questão técnica ou política”, afirmou.

O presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) de Goiana, Luciano Ferreira, também ressalta que o município é visto como um polo comercial. “É uma cidade que descentraliza o comércio nas cidades vizinhas, como Condado, Itaquitinga. A gente hoje tem dentro do município 5 a 6 mil pessoas de cidades vizinhas, a gente considera que seria um polo e a gente estaria perdendo esse nome quando passa a ser da RMR. A gente deixa de ser esse centro de comércio para ser mais um”, diz Luciano.
Procurado, o prefeito em exercício de Goiana, Eduardo Carneiro (MDB), não respondeu ao JC até o fechamento da edição.

Decisão será via referendo

Um dos artigos do projeto diz que a eficácia das medidas propostas deverá ser objeto de referendo com prazo de 36 meses para ser realizado, a contar da data de publicação da lei.

A realização de referendos está prevista no artigo 14º da Constituição Federal e regulamentada pela Lei nº 9.709/1998. O referendo difere do plebiscito justamente por ser convocado após a criação de um ato executivo ou legislativo, para que o povo aprove ou não a proposta.

Líder do governo na Alepe, Isaltino Nascimento (PSB) esclarece que não seria possível convocar um referendo para as próximas eleições municipais, em outubro 2020, devido à proximidade da data. “Na eleição de 2022 é possível que o TRE inclua um item para a população se posicionar. Se porventura a população votar para manter Goiana, o projeto torna-se sem efeito”, conta o deputado.

O vereador de Goiana Flávio Fuba (PSC) reclama do fato de não ter sido convocado um referendo na época em que a inclusão foi aprovada. “Existem dois pesos e duas medidas, quando eles decidiram incluir, eles não ouviram a sociedade e agora vão fazer isso, mas eu acredito que com certeza o povo vai optar pela retirada”, afirmou.

Por fim, o projeto estabelece que qualquer possibilidade de inclusão futura de algum município na RMR está condicionada à aprovação por meio de plebiscito. “É fazer uma consulta às pessoas, porque isso não aconteceu anteriormente”, afirmou Isaltino.
O projeto já foi distribuído para as Comissões de Constituição, Legislação e Justiça, Finanças, Administração Pública e Negócios Municipais. Os relatores vão apresentar os pareceres na próxima semana, para que, em seguida, o projeto seja votado no plenário da Alepe. O prazo para aprovação de matérias neste semestre é até 19 de dezembro. 

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