Uma das principais mudanças instituídas pela reforma eleitoral promulgada pelo Congresso Nacional em outubro de 2017 (Proposta de Emenda à Constituição 33/2017) foi o fim das coligações nas eleições para vereadores e deputados, que entra em vigor em 2020. Agora, os partidos sairão sozinhos na disputa para as câmaras municipais de todo o País e, segundo analistas ouvidos pelo JC, uma das consequências que essa alteração na legislação pode trazer é um aumento no número de candidatos a prefeito, pois candidaturas majoritárias teriam o poder de puxar votos para as postulações proporcionais.
Os principais objetivos do Congresso ao aprovar o fim das coligações seriam desestimular a criação e manutenção das chamadas legendas de aluguel – partidos usados no passado por siglas maiores para turbinar seu quociente partidário – e acabar com o “efeito Tiririca”, quando a votação expressiva um candidato ajuda a eleger outros da mesma coligação. Eleito em 2014 com mais de 1 milhão de votos, o deputado federal Tiririca (PL) levou para a Câmara outros cinco candidatos.
“As pessoas, inclusive candidatos a vereador, não compreendem que a partir desse ano não haverá coligação proporcional nem o mecanismo da cláusula de barreira. Ele (o candidato) não poderá coligar e, dentro do partido, quem não fizer 10% do quociente eleitoral em sua cidade, mesmo que o partido alcance uma vaga, ele não entra. Não adianta colocar um candidato Tiririca, que vai ter um milhão de votos, para conquistar 4 ou 5 vagas, se dentro do partido só tiverem dois ou três que atingirem a cláusula de barreira”, explicou o diretor geral do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco (TRE-PE), Orson Lemos.
A novidade, porém, não é unanimidade. A cientista política Priscila Lapa diz considerar a mudança importante, mas frisa possíveis distorções que ela pode causar. “O movimento teórico, o princípio da mudança é para fortalecer partidos mais competitivos, então as pessoas que já têm mandato, que possuem uma carreira política já consolidada, nesse momento estão em vantagem. Uma pessoa que vai se candidatar pela primeira vez vai ter que calcular muito em qual partido efetivamente deverá entrar para ter chance de ser eleito. Para os estreantes e para os candidatos menores, isso será um desafio a mais. Nós não podemos desconsiderar, contudo, o contexto atual do País, em que a população tem demonstrado querer uma oxigenação dos quadros políticos. Nesse caso, o efeito inverso não pode ser desconsiderado”, detalhou.
Mas como todas essas alterações podem influenciar no número de prefeitos que concorrerão em 2020? De acordo com o cientista político Ricardo Ismael, da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), a tendência é que legendas de pequeno porte, que já teriam dificuldade para eleger prefeitos, lancem candidaturas majoritárias para fortalecer postulantes a vagas de vereador e evitar um enfraquecimento ainda maior da sigla no Legislativo. “Em algumas circunstâncias, lançar candidato a prefeito pode ser uma alternativa para tentar dar mais visibilidade aos vereadores. Os partidos grandes e médios participam mais do jogo majoritário e estimulam a votação para vereador, mas os pequenos estão numa situação mais difícil. Essa mudança afeta muito os pequenos partidos e alguns podem sumir das Câmaras de Vereadores”, comentou Ismael.
Presidente estadual do PP, o deputado federal Eduardo da Fonte disse acreditar que as novas regras eleitorais devem fortalecer legendas com maior desenvoltura política e afirmou que a estratégia progressista para o pleito de 2020 é lançar candidaturas apenas onde há chance real de eleição. “Temos intensificado o pré-lançamento de candidaturas consistentes, de prefeitos, ex-prefeitos, nomes importantes. Em Cupira, por exemplo, o candidato do PP será Sandoval Luna, que já foi prefeito duas vezes, elegeu seu sucessor e agora vai disputar com quem ele elegeu, então tem condições de voltar à prefeitura. Chapa de vereador se monta a partir do prefeito, não o contrário”, grifou o parlamentar.
Deputado estadual pelo PRTB, Marco Aurélio Medeiros acredita que o fim das coligações fortalece os partidos, mesmo os pequenos, pois força as legendas a montar chapas, se organizar e ter vida própria. “Os partidos precisam estar acima dos filiados, alguns ficam independentes, entram em partido só para se eleger, depois esquecem a sigla. Precisamos de partidos mais orgânicos e fortes. Na próxima eleição, se um partido não atingir o quociente, ele vai para a sobra e tem chance de eleger alguém. Então, acredito que todos os líderes partidários deveriam estar correndo para montar suas chapas, é salutar para a democracia”, afirmou o parlamentar.
Sobre a possibilidade de extinção de partidos “nanicos” após o pleito, Marco lembrou que o PRTB recebe um “ínfimo” fundo eleitoral e não recebe fundo partidário. “O fundo partidário não deveria existir, pois ele não é dividido corretamente, fica na mão dos presidentes dos partidos”, disse.
* A partir de 2020, os partidos não poderão mais formar coligações para concorrer às eleições proporcionais – neste caso, de vereadores
* Porém, os partidos ainda podem formar coligações para a disputa de cargos majoritários, como o de prefeito.
* Antes, os partidos podiam decidir concorrer sozinhos ou em coligações, ou seja, em blocos. Nesse último caso, a votação considerada é a soma dos votos obtidos por cada partido membro da coligação.
* Um candidato bem votado ainda pode puxar outro menos expressivo, mas eles precisam ser da mesma legenda. Contudo, uma regra em vigor desde 2018 define que só podem ser eleitos aqueles que tiverem votação igual ou superior a 10% do quociente eleitoral (divisão do total de votos válidos da eleição pelo número de vagas).
* A coligação era criticada, pois um candidato com votação muito expressiva inflava o quociente partidário e puxava outros da mesma coligação. Assim, se as legendas da coligação não tiveram alinhamento ideológico, o eleitor pode votar em um candidato conservador e acabar elegendo um outro de um partido progressista, e vice-versa.