Idealizador da marca “textos cruéis demais”, que surgiu no Facebook e no Instagram – onde conta com mais de 1 milhão de seguidores – Igor Pires chega ao Recife, neste sábado, para a turnê de lançamento de seu novo livro, “Textos para tocar cicatrizes” (Globo Livros). O autor nacional mais vendido em 2020 fica hoje e amanhã na capital pernambucana, para autógrafos na Livraria Leitura do Riomar Shopping.
Em entrevista ao JC, Igor Pires afirma que a literatura precisa encontrar novos formatos, e seu ensino nas escolas precisa horizontalizar a perspectiva, para proporcionar o engajamento dos alunos. “Não me recordo de algum momento ter sido encorajado a ser escritor”, diz ele. Sobre o novo livro, fala que é seu projeto mais honesto, com reflexões sobre os tempos pandêmicos. “Aqui eu me abro para escrever sobre assuntos que até então não me debruçava muito, como por exemplo relações familiares e suas particularidades”, conta.
Sobre a leitura no Brasil, o escritor é enfático: os jovens estão lendo mais, e consumindo mais conteúdo literário na internet. “É um ambiente de muitas oportunidades, estamos a todo instante lendo ou produzindo algum tipo de literatura”.
As sessões de autógrafos de “Textos para tocar cicatrizes” começam às 4 da tarde, hoje e amanhã, na Leitura do Riomar.
JC - As novas gerações leem bastante, se levarmos em conta o tempo de leitura de mensagens nas redes sociais. A literatura para esse público deve levar em conta essa forma rápida de leitura?
Igor Pires - Sim, mas nem sempre. É tolo julgar que por serem leitores formados pelas redes sociais são incapazes de se aprofundar em leituras mais complexas, substanciais. Eu acredito que a literatura precisa pensar em novos formatos até para compreender e engajar essa comunidade que está sedenta e possui comportamentos de compra bastante interessantes; mas não apenas isto: penso que a literatura também pode e deve pensar no conteúdo, que às vezes pode ser maior, mais intenso e profundo. Acho que é preciso um meio-termo, e de forma orgânica vai se construindo um meio do caminho que seja interessante para todos os lados.
JC - Quais os principais temas e reflexões que podem atrair o leitor mais jovem para os livros? Ao mesmo tempo, são temas que interessam ao leitor de qualquer idade?
Igor Pires - Acredito que falar sobre relacionamentos afetivos e românticos sempre conversa com qualquer público, à medida que todos nós passamos ou iremos passar por algum. Eu observo que o leitor mais jovem se relaciona mais com temas que dizem respeito a estes momentos muito particulares que são o primeiro amor e a primeira decepção. Nos encontros com leitores costumo ouvir histórias de como meus livros apareceram para eles em situações como estas. Vejo que términos e recomeços são seus temas favoritos.
JC - Na sua opinião, como o ensino de literatura nas escolas pode melhorar, para não despertar apenas o interesse relacionado ao cumprimento da obrigação curricular?
Igor Pires - Acredito que horizontalizando a perspectiva. Na escola, não somos engajados a participar da arena do conhecimento de forma ativa. Explico: não me recordo de algum momento ter sido encorajado a ser escritor. Não me lembro de ter sequer tido vontade ou pensado sobre. Principalmente porque o ensino ainda caminha para uma perspectiva masculina, branca, cisgênera, heterossexual. Estuda-se quem? Homens brancos. Não há espaço, ou quando há é muito pequeno, para outras vozes, novas vozes. Creio que quando você mostra outras perspectivas, de pessoas mais reais que fazem literatura, os jovens passam a se conectar em um lugar mais íntimo, de modo que pensem a respeito e queiram, inclusive, trilhar o mesmo caminho.
JC - Como insere o seu quinto livro, "Textos para tocar cicatrizes", no conjunto de sua obra? O que o seu leitor pode encontrar de semelhante? E de diferente?
Igor Pires - Acho que o “Textos para tocar cicatrizes” é meu projeto mais honesto. Ele nasce de reflexões sobre os tempos pandêmicos que vivenciamos e com ele suas questões: românticas, afetivas, espirituais, sociais, sexuais. Aqui eu me abro para escrever sobre assuntos que até então não me debruçava muito, como por exemplo relações familiares e suas particularidades. Acho que é um livro com linguagem fácil e acessível tais quais os outros, mas que se diferencia porque é produto e meio de uma crise sanitária que alarmou o mundo por três anos.
JC - No meio de uma cultura digital marcada pelo consumo veloz das informações, o que significa a dedicação do tempo para a leitura?
Igor Pires - Significa tempo para refletir sobre si e sobre o mundo. Tempo para sair do automático e olhar para si, para o que provoca, o que existe dentro e é preciso resgatar vez ou outra. Este é o lance da arte: quanto mais a acessarmos, melhor e mais profundo conseguiremos ir nas questões do mundo, da sociedade, de nós mesmos.
JC - A leitura de um livro como o seu também abre a perspectiva de leitura do que somos, e das relações que vivenciamos. A literatura é uma conexão essencial para a compreensão do indivíduo e dos laços que fazemos?
Igor Pires - Com certeza. A literatura é lugar de invenção. Como transformar a realidade ao nosso redor num fechar (ou melhor, abrir?) de olhos? Imaginando personagens, desestruturando certas posições, reencontrando alegria e prazer em histórias que nos movem, nos provocam. Recentemente li “Tudo é rio”, da Carla Madeira, e posso te dizer que este livro mexeu comigo em lugares que eu não sabia ser possível. Fiquei semanas engasgado, querendo falar dele para todos os meus amigos, escrevendo reflexões, lendo entrevistas, tentando mantê-lo aceso e vivo em mim. A literatura tem exatamente este poder: continuar em nós histórias que aparentemente se findam na última página de um livro. A literatura é a continuação dos nossos desejos, o alicerce para que a gente consiga imaginar outros porquês.
JC - Como escritor best-seller e um público leitor crescente, como observa a potencialidade do mercado editorial no Brasil?
Igor Pires - Os jovens brasileiros estão lendo cada vez mais! Isso é um fato. E para além disso, também estão consumindo mais conteúdo literário na internet. Acredito que a perspectiva é de crescimento, depois de anos nebulosos por conta da COVID. É um ambiente de muitas oportunidades, estamos a todo instante lendo ou produzindo algum tipo de literatura, sinto bons ventos a caminho.
JC - O que diria para um jovem que gosta de escrever e tem vontade de ingressar na literatura, publicando livros?
Igor Pires - Escreva! Vá fundo! Tenha um projeto. Lance nas redes sociais. Peça a amigos que compartilhem, bata de porta em porta, no começo é assim mesmo. Um trabalho de formiguinha. Depois tudo se ajeita. Se é seu sonho, não desista dele. Ser escritor é uma profissão muito nobre e para os nobres ela se reserva encantadora. Escreva! Escreva! Escreva!