E a licitação das linhas de ônibus?

Publicado em 18/04/2017 às 12:48
Foto: O transporte público, assim como os pedestres e ciclistas, passariam a contar com um recurso para investimento na infraestrutura. Foto: Diego Nigro/JC Imagem


Foto: Diego Nigro/JC Imagem   Foram mais de dez anos de promessas, embora a lei determinasse a obrigatoriedade de licitação pública desde 1993. Eram os anos de 2012/2013, quando o governo de Pernambuco tomou coragem e enfrentou a complicada e polêmica licitação das linhas de ônibus da Região Metropolitana do Recife.  Mas quando a população pensou que as melhorias garantidas na concorrência pública de um serviço também público chegariam, apenas dois dos sete lotes da licitação entraram em operação, exatamente os que operam o sistema BRT pernambucano (Via Livre), composto pelos Corredores Norte-Sul e Leste-Oeste. Era 2014.  
Se o governo assinar os outros cinco lotes do jeito que foram licitados, com as mesmas exigências, ele quebra. O setor empresarial sofrerá, mas o impacto para o governo será ainda maior porque terá que ampliar o subsídio do sistema que eles estão tendo muita dificuldade de bancar. Isso é fato”, fonte em sigilo
  De lá para cá, nada mais. A licitação dos cinco lotes chegou a ser homologada e assinada, faltando apenas a assinatura da ordem de serviço. Mas foi engavetada pelo governo do Estado devido ao custo. Há um ano, técnicos do Grande Recife Consórcio de Transportes (GRCT) – gestor do sistema de transporte – e da Procuradoria Geral do Estado (PGE) quebram a cabeça para adequar o processo projetado no passado – avaliado, hoje em dia, como surreal – à realidade econômica atual do Estado e do País. E pelo jeito a tarefa tem sido extremamente difícil porque as análises vêm sendo feitas desde abril de 2016, sem que nada tenha sido concluído. O governo do Estado, aliás, tem se fechado em copas quando questionado sobre o assunto.     A leitura nos bastidores do setor é de que o Estado está resistindo à apresentar a reformulação dos contratos porque haveria um ônus político grande para a imagem do governo, personificada na figura do governador Paulo Câmara. O que seria péssimo atualmente por duas razões: a aprovação popular do governo, inclusive a do governador, estão em baixa; e poderia atrapalhar a quase certa candidatura à reeleição em 2018. LEIA MAIS Licitação das linhas de ônibus da RMR sob risco de ser anulada Nova licitação das linhas de ônibus do Grande Recife amplia prazos para tentar atrair interessados Prepare o bolso: passagens de ônibus da RMR sobem 14,26%. Anel A passa de R$ 2,80 para R$ 3,20 “Se o governo assinar os outros cinco lotes do jeito que foram licitados, com as mesmas exigências, ele quebra. O setor empresarial sofrerá, mas o impacto para o governo será ainda maior porque terá que ampliar o subsídio do sistema que eles estão tendo muita dificuldade de bancar. Isso é fato”, diz uma fonte em sigilo. “Projetaram um sistema não pagável e agora viram o erro cometido. Como escolheram estações de BRT que custam R$ 23 mil por mês de manutenção? Refrigeradas e com vidros temperados?”, indaga a mesma fonte. Lembrando que as estações do BRT pernambucano são as únicas refrigeradas do País e a segunda do mundo – Dubai, nos Emirados Árabes, também tem. É fato. Quando o governo do Estado concluir os estudos de reformulação dos contratos a redução de custos será certa. E, em transporte, não tem segredo: reduzir custos significa reduzir conforto. Ou seja, as melhorias prometidas com a licitação não aconteceriam ou, ao menos, se dariam num ritmo bem mais lento do que o previsto nos contratos. O custo da operação dos dois primeiros lotes licitados e que estão em operação há três anos (completados em junho para o Consórcio MobiBrasil e em julho para o Consórcio Conorte) já é muito alto. O governo tem enfrentado dificuldades para cobrir a parte que lhe cabe desde que o serviço de transporte dos Lotes 1 e 2 deixou de ser uma permissão e passou à concessão, ou seja, regido por regras jurídicas.
De fato, a licitação foi realizada em um outro momento econômico, que hoje se tornou inviável. Entendemos que é necessário rever os contratos. Acreditamos que entre julho e agosto o governo do Estado deve ter uma posição”, Fernando Bandeira, presidente da Urbana-PE
  Desde 2014, o governo vem injetando uma média de R$ 200 milhões por ano em subsídios. Imagine, diante da crise econômica atual, assumir outros cinco lotes com uma estimativa de subsídio no valor de R$ 150 milhões?. Seria loucura? E como dizer à população que ela continuará sem o tão esperado conforto do transporte porque o governo projetou um sistema utópico e, agora, terá que baixar o custo da operação. Para quem não sabe, perda de conforto significa menos ônibus refrigerados, com suspensão a ar e motor traseiro (hoje estimados em R$ 1 milhão) nas ruas e um prazo maior para renovação da frota. Prova de que a situação financeira do sistema não está boa são as dívidas que já existem nas duas primeiras concessões em operação. Explicando: essa dívida é o valor que o Estado deve aos operadores. O ano de 2017 tem sido pago em dia por enquanto e 2016 terminou de ser quitado pelo governo em março último. Mas há um débito de 2015 no valor aproximado de R$ 15 milhões, que pode, inclusive, ser maior. Isso porque o setor empresarial diz que são R$ 19 milhões e o governo argumenta que a diferença é referente a multas por descumprimento das regras operacionais. Na visão empresarial, a maioria das multas não têm fundamento legal porque o governo está cobrando uma eficiência de operação que não aconteceu porque faltou a infraestrutura exigida nos contratos. E assim a vida segue.     Vale ressaltar, ainda, duas informações para a população: 1º) Que boa parte do subsídio que o governo está dando ao transporte público na verdade sai do bolso dos passageiros, seja pelo resíduo dos créditos do VEM que expiram em 180 dias e ficam retidos, ou pelo valor da passagem paga diariamente. Somente quando essa quantia não cobre os custos da operação dos concessionados é que o governo tira dinheiro de outras áreas. 2º) Que, no meio dessa briga velada de lobos, quem paga o preço é a população porque deixa de usufruir das garantias previstas numa licitação pública, como estímulo a resultados e à eficiência dos operadores. Por isso, os dois milhões de passageiros diários do transporte público da RMR têm que ficar de olho e cobrar uma resposta rápida do governo de Pernambuco. Lembrando que o lucro das concessionárias é limitado a 8,95% da arrecadação financeira da operação realizada. Quando a receita do sistema não é suficiente, a licitação obriga o governo a cobrir. Os empresários que venceram a licitação dos cinco lotes estão tranquilos e compreensivos. Pelo menos oficialmente. Fernando Bandeira, presidente do Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE) disse que o momento é de compreensão. “De fato, a licitação foi realizada em um outro momento econômico, que hoje se tornou inviável. Entendemos que é necessário rever os contratos. Acreditamos que entre julho e agosto o governo do Estado deve ter uma posição”, disse Bandeira. Há, inclusive, uma expectativa de que o governo reveja os contratos licitados dos Lotes 1 e 2 porque o custo também está alto. Abaixo, a resposta do Estado, enviada pelo GRCT, sobre a revisão da licitação das linhas de ônibus. Secretaria das Cidades e PGE também não quiseram falar. Coube ao GRCT enviar uma nota por todos: com apenas duas linhas e que nada dizia. “O Grande Recife informa que a licitação do segundo lote das linhas do Sistema de Transporte Público de Passageiros encontra-se em análise na Procuradoria Geral do Estado (PGE)”.   Confira alguns detalhes da licitação das linhas:
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